E sabemos igualmente que as variedades actualmente existentes, exceptuando as cruzadas artificialmente pelo homem, castas híbridas sem relevância assinalável, advieram de um cruzamento acidental, de uma mutação fortuita, de um simples acaso da natureza.
Curiosamente, algumas das castas hoje mais valorizadas, aceites universalmente como referências fundamentais, nasceram da combinação de castas menores.
O exemplo mais dramático é providenciado pelo Chardonnay, fruto do cruzamento natural de uma versão de Pinot com a Gouais Blanc, uma variedade vulgar... que já na idade média tolerava editais a banir a sua utilização no vinho! Nas vinhas, tal como nas pessoas, dificilmente se poderão avaliar os descendentes pela filiação dos progenitores.
Seria hoje possível assistir ao nascimento de novas espécies? Ou terá a evolução natural da vinha arribado a um estado de estagnação, ou, se quisermos ser ainda mais pessimistas, ao termo da evolução, tal como a conhecíamos no passado? Quando as variedades cresciam numa proximidade forçada, em vinhas de castas misturadas, as oportunidades para a recombinação sexual eram reais, palpáveis e seguras.
Hoje, porém, com o método moderno de plantação de castas por talhões separados por variedades, divididos em clones invariáveis, as oportunidades para a concertação e miscigenação sexual diminuíram drasticamente, dificultando, ou mesmo impedindo, a geração natural e espontânea de novas espécies. Uma razão mais, se ela fosse necessária, para acarinhar essa especificidade tão portuguesa de manter as vinhas misturadas, com múltiplas variedades a conviver alegremente, numa cercania que potencie a mestiçagem.
Contudo, e sustento-o com uma assinalável tristeza, mesmo no caso relativamente improvável de continuarem a surgir novas variedades indígenas em Portugal, será que alguém lhes dedicaria tempo ou sequer atenção? Será que alguém se iria interessar por mais uma maravilha da natureza, mais uma casta nacional? Ou será que prefeririam manter-se confortáveis no crédito e autoridade que assenta da utilização das escassas variedades já testadas e certificadas pelo tempo e pelo marketing... muitas das quais sem ascendência nacional.
Não, se a evolução natural da vinha ainda não terminou, ela estará hoje muito mais dificultada e embargada pela mão do homem.