Fugas - vinhos

Paulo Ricca

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Um rol de vinhos louváveis

Ainda mais surpreendente, pelo inusitado do estilo, apresentou-se o Afros Vinhão 2009, um tinto da região do Vinho Verde, exemplo supremo do triunfo do improvável, algures entre a afirmação de um sonho e a bondade da natureza, numa jogada de alto risco que certifica que os mitos também se abatem. É um tinto da casta Vinhão em versão estreme, sem nenhuma das debilidades tradicionalmente associadas à casta, sem a rusticidade e o verdor tantas vezes agregados aos vinhos tintos da região. Neste Afros domina a fruta, temperada por ligeiro pendor vegetal e por uma acidez bem medida, oferecendo um conjunto fresco e complexo, vivo e misterioso, que, por mais que uma vez, invoca o perfil tão característico dos Cabernet Franc do Loire.

Proveniente da mesma região, fiquei igualmente atónito com a mineralidade levada ao extremo do Quinta de San Joanne Superior 2007. Afirmando-se num perfil absolutamente divergente do discurso tradicional na região, manifesta-se muito mais sério, maduro, estruturado, pesado e veemente que o costumeiro nos Vinhos Verdes. Levemente vegetal, tenso na acidez vibrante, enorme na boca, quase severo, mineral, regala um final de boca impressionantemente longo e intenso, prenunciando uma enorme capacidade de evolução em garrafa.

Outra das grandes surpresas do ano foi denunciada pela perfeição e elegância do espumante Murganheira Chardonnay Bruto 2002, um vinho de rara elegância, sedução pura, de nobreza e fidalguia num espumante que se afigura como pura poesia romântica. Delicado, fino, incrivelmente elegante, tudo nele revela nobreza e fidalguia, num registo discreto de quem não precisa de gritar para ser ouvido.

Suave e melodioso, termina num crescendo constante, caminhando para um final de suprema elegância.

Finalmente, o Fonseca Guimaraens Vintage 2008, tingido por pontos e contrapontos, urdido em veludo e temperado por estruturas rendilhadas, num misto de harmonia e sobressalto.

Raramente podemos assistir a momentos tão dramáticos de dureza e tenacidade, entremeados com momentos de suavidade e doçura, momentos de frescura e elegância, num nariz incrivelmente certinho e floral. E depois advém uma boca firme mas tão elegante, adubada por taninos finos e aveludados, sem esconder a potência latente que se esconde nas profundezas do copo.

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