Discutimos as probidades e desmerecimentos de cada vindima, os méritos e deméritos de cada vinho, elogiando e glorificando os vinhos mais virtuosos, endeusando, com a atenção que lhes dedicamos, muitos dos vinhos mais significativos de Portugal.
São as consequências naturais dos elogios fartos, das classificações elevadas e da consistência de colheitas. Felizmente que assim é porque o mérito merece ser reconhecido, a originalidade premiada e a qualidade enaltecida.
Tal como os piores vinhos devem ser penalizados e denunciados, sem a evasiva das falinhas mansas ou das deferências compassivas, sem receio pela denúncia, também os melhores vinhos merecem ser aplaudidos e louvados, separando a água entre a vulgaridade e a excelência... de forma clara e inteligível.
Sim, os vinhos de topo, de carácter vincado e qualidade irrepreensível, são importantes e decisivos, indispensáveis para a sustentação de um produtor, de uma marca, de uma região, para a afirmação internacional da imagem de Portugal. São os vinhos de topo que nos fazem sonhar, que exortamos e dissecamos até ao último pormenor, que se encarregam de preencher o nosso imaginário. São os mais cobiçados e suspirados, aqueles que todos gostariam de, pelo menos uma vez na vida, poder apreciar nas suas múltiplas cambiantes e nuances.
Infelizmente, são também, por regra, vinhos caros e de acesso difícil, edições limitadas a que raramente podemos aspirar. São vinhos de volúpia e meditação, vinhos para momentos raros e exclusivos, vinhos para partilhar com amigos especiais que compartilhem do mesmo entusiasmo e empenho pelo vinho.
São vinhos de sonho! Porém, para além da insipidez que seria ter de privar diariamente com obras-primas vínicas, com a grandeza e elevação dos melhores vinhos, transformando-os em meros objectos impessoais, a aventura revelar-se-ia inacessível e financeiramente insustentável.
Por isso são tão reclamados os vinhos que oferecem boas relações qualidade/preço, o santo graal de todos os consumidores, a equação mais pertinente de quem gosta de vinho.
Uma equação em que Portugal se evidencia, oferecendo um grupo alargado de vinhos que cumprem e excedem os requisitos, vendidos a um preço mais do que razoável.
As boas compras sobrevêm por todos os estilos, mesmo nos mais improváveis, naqueles onde o preço comedido raramente anda a par com a elevação. Exemplo perfeito desta virtude encontra-se no espumante Quinta dos Abibes Arinto & Baga Extra Bruto 2008, um espumante da Bairrada onde a complexidade e a seriedade são brindados a preços quase de saldo. Um espumante elegante e delicado, sóbrio e de enorme frescura, de equilíbrio perspicaz entre exuberância e moderação.
A sorte e o saber sorriram a este Abibes de nariz francamente feliz nas notas de fermento de padeiro, biscoito, levedura de cerveja e pêssego, capaz de acompanhar uma refeição da entrada à saída.
Igualmente desusado, por raramente associarmos os vinhos generosos aos predicados das boas relações qualidade/preço, apregoa-se o Barbeito Malvasia 2000 Single Cask 44A, um Vinho da Madeira de elegância extraordinária, segredando notas voluptuosas, manifestando uma tremenda complexidade e frescura, dando sinais contraditórios de impetuosidade e placidez. Um vinho onde se sente a intemporalidade e magia do Madeira a um preço mais do que acessível! Nos vinhos brancos sobressaem múltiplos exemplos da combinação entre qualidade e preço reduzido.