Fugas - dicas dos leitores

Turquia, um país entre dois continentes

Por M. J. Castro - Lisboa

A antiga capital serve por agora de trampolim para a descoberta do país porque Istambul é tão excelsa capital que merece um relato à parte só para ela e portanto não cabe aqui. Saímos da cidade em direcção a Ancara, a Turquia do século XX, moderna e cosmopolita, que venera em cada esquina o seu ídolo, Atatürk.

O seu mausoléu, sobranceiro à cidade, é imponente, sólido, uno, sóbrio e apartado de qualquer outra construção. Evidencia-se solitário sobre a colina de onde se vê a cidade e se espraiam as montanhas de contornos pouco nítidos.

De Ancara parte-se em direcção à Capadócia. Através do vidro da camioneta, a paisagem muda desfila sem sobressaltos, ao mesmo tempo que a luz difusa do fim do dia se projecta em todo o horizonte. O Lago Salgado a caminho de Aksaray é o ponto onde descansaremos um pouco; caminho pelo chão rijo feito de sal onde o sol se reflecte intensamente e o branco é tão forte que quase fere a vista.

De Avanos em direcção às planícies e desfiladeiros áridos, qual paisagem lunar, com formas que desafiam a imaginação mais delirante.

Dirigimo-nos depois em direcção ao Vale de Göreme, terra de capelas subterrâneas decoradas com frescos impossíveis de contar.

No rame-rame dos dias e dos quilómetros segue-se a bela Konya, com o seu mosteiro dervixe sob uma cúpula de um azul-turquesa impossível. E depois Pamukkale, com os seus terraços cobertos de calcário a escorrer água límpida, que mais parecem algodão.

Éfeso é a próxima paragem. Aqui, cuido da secreta atracção do homem por ruínas: tem certamente a ver com a fragilidade da nossa natureza intrínseca, com uma conformidade secreta entre esses espaços constituídos por monumentos destruídos e a rapidez da nossa existência.

Segue-se Izmir, a cidade turca mais ocidentalizada da Turquia, depois Bursa com a sua mesquita nobre e elegante e onde o rendilhar das palavras turcas se mistura à ladainha da oração.

De Bursa percorre-se mais umas dúzias de quilómetros e apanha-se o ferry de Alova para Istambul.

Pensa-se encontrar um país tranquilo e reservado devido à influência do Islão e por isso a exuberância e vivacidade do carácter turco é uma surpresa agradável. Parte-se com o coração dividido, qual Istambul dividida entre a Ásia e a Europa.

Parto com a convicção profunda de ter deixado a Turquia, por breves instantes, até a um regresso desejado! Gautier achara que "as maravilhas deste lugar precisam de iluminação e perspectiva, pois quando nos aproximamos a sedução desfalece"; desta vez discordo dele: a sedução estará sempre lá, é só preciso abrir os olhos e apreendê-la.


[FUGAS nº 536 - 28 Agosto 2010]

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