Fugas - dicas dos leitores

Veneza

Por Ana Cristina Ladeiras

Entras na cidade e deixas-te ir. Primeiro porque ela toma o rumo de ti, depois porque te deixas ir com o burburinho da multidão que segue o trilho que lhes foi marcado, sem discordar, mecanicamente rumo ao "altare".

Depois queres perder-te porque ela te deixou, soltou-te dos laços e largou-te ao sabor dos teus ventos. Logo te deixas levar pelos emaranhados líquidos das teias tecidas ao longo dos tempos. Aos poucos, e com o caminhar, diluem-se também os sons, tornando-se vagos. Enquanto ela já tomou quase conta de ti, tu sentes-lhe o pulsar,leve. Paras numa praça e habitas a cidade e leve fica também a tua respiração, suspensa em fósseis do tempo.

Ouves as gentes que repetem melodiosamente as palavras que quase entendes. Depois tentas escapar-lhe e serpenteias de praça em praça, cada passo, cada poço, cada ramada perdida no pátio. E a multidão chama-te querendo quebrar o encantamento, mas tu não a queres encontrar. Quando estás quase perdido, desembocas no mar e é o verde ondulante que te enleia. Súbita tontura que não adivinhas ser do sol ou da magia que a cidade criou em teu redor. Envolves-te cada vez mais com as apertadas ruas e ris, e barcos e gôndolas e marinheiros e "cortomalteses".

Então voltas a encontrar-te, cedendo finalmente aos rumores. É o teatro, o museu, os quadros, a ópera; e o trilho volta a ser seguido, registas os azuis, os palácios, as pontes, até te perderes outra vez...

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