Fugas - dicas dos leitores

De bicicleta abaixo do nível do mar: de Amesterdão a Bruges

Por Augusto Lemos

Depois de uns dias para conhecermos melhor Amesterdão, o objectivo foi seguir até Bruges e fazer uma parte da Nordzee Route desde Maassluis, na Holanda, até Knokke, na Bélgica.

Para quem não sabe, a Nordzee Route, ou Ciclovia do Mar do Norte, é uma ciclovia que faz parte do Eurovelo. Fazendo todo o percurso, são 5932kms e até dá direito a um certificado. Percorre as costas da Holanda, Bélgica, Grã-Bretanha, Noruega e Alemanha, além de algumas travessias de barco.

A ideia inicial era levar as bicicletas de Portugal mas, fazendo bem as contas e contabilizando os custos do transporte de avião, pensámos em alugá-las em Amsterdão e entregá-las em Bruges, só que não encontrámos nenhuma empresa que o permitisse (só em viagens organizadas, que não era o caso). Foi então que tive conhecimento da Recycled Bicycles, uma empresa em Amesterdão que, além da reparação e aluguer, também vende bicicletas usadas. Propriedade de um português, fica na Spuistraat 84-A, bem perto da Centraal Station. E-mails para lá e e-mails para cá, comprei ao Victor cinco bicicletas.

Partimos de Amesterdão, inicialmente em direcção a Delft e depois até Massluis. Foi em Massluis que encontrámos a Nord Zee Route. A partir daqui não há que enganar, é só seguir as indicações. A paisagem interior da Holanda é caracterizada pelas planícies cheias de vacas e pelos moinhos. Além de querer conhecer a grandiosidade dos diques, era sobretudo esta ruralidade que eu queria sentir. Viajar de bicicleta na Holanda é fantástico. Além de ser tudo plano, há sempre uma ciclovia em direcção ao lugar para onde vamos. Sobre a sinalética nem vou falar. Acho que há mais informações para ciclistas do que para automobilistas.

A Holanda vai tendo governos que, considerando que a bicicleta é um meio de transporte sustentável, saudável, com zero emissões, silencioso, limpo e económico, criaram uma série de infra-estruturas para facilitar a vida aos utilizadores de bicicletas. Mas não é só no dia-a-dia que se veêm ciclistas, curiosamente são muitos os que pegam na bicicleta para passear e existem cerca de 6500 kms de ciclovias destinadas ao lazer. Andar de bicicleta é das maiores actividades recreativas dos holandeses. Com uma população de 16,5 milhões, a Holanda tem aproximadamente 18 milhões de bicicletas: é o único país do mundo que tem mais bicicletas do que pessoas.

Saindo de Amesterdão para Sul, foram cerca de 74kms até Delft, que se situa na província de Zuid-Holland, fica a 9kms de Haia e a 18 de Roterdão e é a pátria do pintor Jan Vermeer (1632-1675). Vermeer, um dos mais famosos pintores do século XVII, nasceu e viveu sempre em Delft e foi recentemente mediatizado com o filme Rapariga com brinco de pérola. Foram mais 16kms até Maassluis, e foi aqui que apanhámos o barco para Rezenburg, na Zeeland, uma província da Holanda situada no sudoeste do país e que consiste num conjunto de ilhas e uma tira de fronteira com a Bélgica. A sua capital é Middelburg.

Em termos geográficos, a Holanda é um país de baixa altitude, com uma grande percentagem do território situado abaixo do nível do mar, graças à mais avançada rede de diques do mundo. O principal desafio desta obra de engenharia é fazê-la resistir às tempestades marítimas ou às enchentes, no caso dos rios.

Por fim chegámos a Middelburg, com uma população de aproximadamente 47.000 habitantes. Durante a Idade Média, a cidade tornou-se num importante centro de trocas comerciais entre a Inglaterra e as cidades da Flandres. Mais tarde, no século XVII, foi um importante centro para a Companhia das Índias Orientais Holandesas.

Sempre com o mar por perto, e atravessando uma reserva natural de Het Zwin, chegámos a Knokke, já na Bélgica. Esta é a praia mais a norte na costa flamenga.

Knokke começou a ser frequentada por diversos pintores, que em 1880 fundaram o Círculo dos Artistas. Tem um dos dez casinos da Bélgica e nas suas paredes podem encontrar-se quadros de Keith Haring, René Magritte e Paul Delvaux.

A partir de Knokke são cerca de 20kms até Bruges. Já tínhamos ouvido falar da capital da Flandres Ocidental e ficámos deslumbrados com as suas ruas, canais e edifícios. Vale a pena percorrer os canais num barco turístico e as calçadas antigas de bicicleta. Já que estamos na Bélgica, há que provar uma cerveja e como estamos em Bruges é necessário experimentar os chocolates.

Chegar a Bruges foi o objectivo desta viagem de bicicleta. A seguir iríamos apanhar um comboio rápido para Bruxelas onde nos esperaria o avião de regresso ao Porto. As bicicletas tinham cumprido na perfeição as centenas de quilómetros que pedalámos entre Amesterdão e Bruges. Nem um furo nem uma avaria.

Tentámos, em vão, vendê-las, mas como tinham aspecto de velhas ninguém as quis. A solução foi fazer uma instalação com elas no meio da estação de comboios de Bruges com o seguinte letreiro: “This bike is for you. I came from Amsterdam on it. Now you can use it the time you want, and then let it somewhere to someone else. Nice travels!”

Esperámos que algum dos muitos curiosos que se iam aproximando pegasse numa bicicleta e seguisse viagem. Entretanto chegou o nosso comboio....

 

 

 

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