A viagem começou em Christchurch, onde passámos uma noite antes darmos início à nossa road trip. Ao sair da cidade com destino a Franz Josef, um misto de excitação e ansiedade tomou conta de mim: estreava-me na condução à esquerda e estava a cumprir o sonho de conhecer aquele país. Passados poucos quilómetros, começámos a ver o que se espera da Nova Zelândia: pastos verdes pintalgados de ovelhas brancas, montanhas com o cume cheio de neve e variadas árvores a comporem a beleza do postal.
A fome distraiu-nos do cenário. Tínhamos que parar num sítio para comer e não aparecia nada. Resolvemos parar assim que vimos uma placa onde se lia Sheffield Pie Shop. Era uma loja de tartes com um aspecto delicioso, mas nada nos fazia adivinhar que ali, em Sheffield, comeríamos as melhores tartes de sempre! E levámos umas para o caminho, que já prometia ser revelador.
O caminho até Franz Josef foi uma epifania. Montanhas com neve, pintadas do verde de fetos e outras plantas tropicais, são contrastes que jamais tinha visto. Os pastos surgiam cada vez mais verdes. Já tínhamos passado Arthur"s Pass e, apesar de a paisagem variar, o verde mantinha-se. Vacas com pêlo encaracolado, ovelhas alvas, pássaros exóticos (o kea). Estes e outros animais davam ainda mais vida àquelas paisagens idílicas, nascidas de um golpe de excepcional engenho da mãe natureza.
No dia seguinte explorámos Franz Josef. Não é barato voar de helicóptero para o glaciar e fazer uma caminhada com um guia, mas o elevado preço é compensado pelo privilégio de estar numa montanha rodeada de floresta tropical, rasgada por uma enorme massa de gelo azul, que desce imponente até ao mar. Glaciares já tinha visto, mas com este cenário envolvente só mesmo ali, na Nova Zelândia.
Retomámos a estrada, desta feita de Franz Josef para Wanaka, e mais uma vez nos deslumbrámos. Os percursos na ilha sul valem tanto ou mais que o destino. Cada quilómetro é um olhar espantado, é ficar boquiaberto, é um agradecimento por viver. Foi nesse percurso que encontrei um dos meus grandes amores neste mundo, uma praia que trato na primeira pessoa. Em Haast mora ela. E foi ali, na "minha" praia deserta, que lhe disse:
"Descobri que o lugar mais mágico do mundo és tu: aquele onde senti frio e onde o silêncio provocado pelo único som que se ouvia - o das ondas, me fez sentir insignificante. Em ti não se viam pegadas, nem sequer de animais. A fauna andava escondida na água gélida, por baixo das ondas furiosas e por entre a selva que rompia até ao areal. Perscrutei, ansiei por ver vida para além da nossa. Mas, seres vivos, apenas nós. Nós, sós, com o barulho das tuas ondas. Foi então que soube que já te tinhas agarrado a mim com toda a tua força, sugando avidamente a minha alma, para a levar contigo até ao mistério da vida. Até ti, praia a sul."