Fugas - dicas dos leitores

Ushuaia a caminho de Casablanca

Por Maria Clara Costa

À medida que os anos passam e eu vou conhecendo mais um pedacinho do mundo, tenho a sensação de que ele está a ficar cada ano mais pequeno.

Acontece que no voo de Abu Dhabi, Emirados Árabes, para Casablanca, quando conversava com a minha prima, um comissário de bordo dirigiu-se-nos dizendo que percebia português. Perguntando-lhe se era brasileiro, disse-nos que era argentino, de Ushuaia (Patagónia), a terra do fim do mundo. Senti como se tivesse encontrado um amigo, como se o tivesse conhecido quando lá estive há uns anos. Senti uma inexplicável afinidade com o jovem que se deslocou do intenso frio glaciar para o tórrido calor do Golfo Arábico.

Visionei os dois mundos e exclamei como é fantástica a adaptação de um ser humano a climas tão opostos. A partir daí e até ao fim da viagem, a Patagónia não me saiu da lembrança. Rebobinei a "cassete" na minha cabeça e comecei a viagem em Ushuaia, no "comboio do fim do mundo" que, sempre a subir, nos leva ao Parque Nacional da Terra do Fogo para contemplarmos as águas cristalinas dos lagos, lagoas, rios e uma densa floresta que mais parece uma tela pintada numa mistura de tons dourados, alaranjados e verdes. Nas encostas ainda permanecem troncos de árvores, espalhados pelo chão, abandonados desde o tempo em que os presidiários usavam este comboio destinado a carregar lenha para cozinhar e aquecer as instalações que albergavam autores de graves delitos e de onde fugir, devido ao clima inóspito, era simplesmente impossível. Hoje, o "Presídio Nacional", começado a construir em 1902, é o Museu Marítimo, cuja visita é imperdível.

Voltei ao centro de Ushuaia para rever a igreja, as coloridas casas de madeira, sentir a frescura das ruas inclinadas, o cheiro das viçosas flores, o calor do interior das lojas e o aconchego dos cafés e restaurantes. Entrei na Secretaria de Turismo onde me foi dado o certificado de amizade e permanência na cidade mais austral do mundo. Uns quilómetros mais à frente voltei a ver as nuvens espelhadas na água azul celeste do "Lago Escondido". E, ainda mais longe, "voei" até ao Glaciar Upsala com os seus 7 quilómetros de gelo que se desmoronam perante os nossos olhos, num espectáculo único, intenso e deslumbrante! E são esses fragmentos (icebergues) que a natureza se encarrega de esculpir, nas formas mais improváveis, enquanto flutuam sem perderem de vista o glaciar que lhes deu vida e liberdade.

A Patagónia é muitíssimo mais, é um mundo de magia azul, mas chegámos a Casablanca, desliguei a "cassete", disse adeus ao argentino e… parti para outra.

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