No Guia American Express sobre Portugal, Porto da Cruz não consta dos “locais a visitar” na ilha da Madeira. Pode acontecer dar-se a meia volta à ilha ou mesmo a volta inteira, sem se chegar a descer à vilazinha junto ao mar. Pode até dar-se o caso de passar despercebida, no constante entra-e-sai de túnel, a indicação de saída na via “expresso” entre Machico e Santana.
Lá muito em baixo, esconde-se assim uma simpática surpresa. Abrigada de um dos lados pela enorme Penha d’ Águia, a praia de areia preta contrastando com o casario branco, num conjunto harmonioso que nem mesmo as modernas infra-estruturas balneares conseguiram estragar, compensa as penosas curvas e os acentuados declives a quem veio descendo desde a Portela (a 700m de altitude), onde ainda há menos de uma hora era Inverno, a avaliar pelo frio e nevoeiro.
Voltemos ao Verão no Porto da Cruz. É fim de tarde e a temperatura ainda convida a um mergulho no Atlântico morno. As hordas de turistas em autocarro, se as houve, há muito que partiram, de regresso aos hotéis na costa sul da ilha. No passeio marítimo, só se ouvem falares madeirenses: são as senhoras da vila nas suas rotineiras caminhadas e os pescadores à linha que alegram as negras rochas sobre o mar. Ao longo deste passeio, escavado na encosta, a geologia faz também questão de evidenciar o que tem de singular, a relembrar que estamos numa ilha formada por lava e cinzas, saída das profundezas do oceano, condição muitas vezes esquecida por não se vislumbrarem vestígios muito óbvios de vulcões.
E porque a tarde vai avançando (e a noite caindo?) ou o passeio abriu o apetite, há já um cheiro a lapas grelhadas no ar. Deve escolher-se então um restaurante com paredes de pedra, com ar despretensioso e que não tenha escarrapachada à porta a ementa escrita em inglês. É certo que, na Madeira, como noutras regiões do país muito turísticas, “trabalha-se muito com estrangeiros”, mas não nos deixemos rebaixar: a língua local ainda é o português e, de preferência, com “stoque”. As lapas vão saber melhor assim.