Fugas - dicas dos leitores

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Vemo-nos na Costa da Caparica

Antigamente eram mais coloridos, assim como todas as casas de praia que dantes aqui havia, romanticamente construídas em madeira e pintadas em tons pastel art deco, plantadas paralelamente ao mar. Serviam de casas de praia para as gentes da cidade. Na altura era muito chique ter uma casa de praia (acho que hoje ainda é).

Ao meu lado vejo postes de iluminação que vão ficando corroídos pelo salitre que circula no ar vindo do mar. Dizem que é o iodo do mar. Eu, apaixonadamente, apelido este ar de maresia. Poético? Talvez. Mas a maresia do mar da Caparica, meus amigos, é um poema para os nossos sentidos.

A meia dúzia de passos há barcos da arte de xávega deitados no areal, com a quilha para cima, tomando banhos de sol. Ao seu lado, dormitando na modorra, tractores com caixotes vazios de pescado, bocejam por entre os oleados coloridos que os cobrem. Têm nomes sentimentais, os barcos. A mar a Costa, Canope, Amor de mãe, Isilda Felisbela. Desperto deste torpor ao som de passadas vigorosas de atletas a sério, de cronómetros no braço e outros gadgets estranhos. Os seus óculos escuros, com design aerodinâmico, parecem daqueles esquiadores nórdicos saídos de uma competição de cross country em esqui. Acabo a escrita. Vou à vila beber um café. Lá longe, no mar, o troar das vagas de sudoeste traz-me ao presente. Volto a casa ou estarei em casa? Passo ainda pelos espartanos bancos de betão brancos, que se encontram no calçadão, onde Tarzans fazem flexões e abdominais. Passo de saída pelo lugar onde dantes se comiam as melhores farturas das e nas praias da Caparica: Delícias da Praia, um acolhedor estabelecimento que aqui havia a meio da praia. Já não existe.

As praias mudam e nós temos de mudar com elas. Às vezes, em viagem, procuramos coisas diferentes e encontramos coisas parecidas. Por vezes basta o passado como fio condutor de uma viagem. Às vezes parece uma boa desculpa para voltar a esse lugar inocente chamado passado. O passado é um bom lugar para se visitar. Mas não é um bom lugar para se lá ficar.

p.s. Como alguém uma vez disse: “A mim o que me acalma não é água com açúcar. É água com sal.” Deixo-vos, por agora e no areal, com as palavras de um grande escritor português. 

“A grande originalidade não é dizer coisas novas mas ser novo diante das coisas velhas.”

(Vergílio Ferreira, escritor português, 1916 – 1996)

Dedicado a todos os caparicanos, residentes e amigos da Costa da Caparica.

https://euaosabordovento.wordpress.com/

 

 

 

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