Fugas - dicas dos leitores

País de Gales: a estrada menos percorrida

Por Ana Torres

Reza o lindo poema de Robert Frost: “Duas estradas num bosque se bifurcavam, e eu/ A menos percorrida trilhei,/ E isto fez toda a diferença.”. Ao longo dos anos tenho procurado o ombro conselheiro destes versos quando necessito de tomar decisões no âmbito da minha vida profissional, ou quando preciso de incentivo para sair da minha zona de conforto. Contudo, ao percorrer o País de Gales, comprovo que a sabedoria do poema é mais abrangente do que julgo.

Recuemos um par de meses. Quando decidi visitar um casal amigo, emigrado no Reino Unido, fui confrontada com uma escolha: dividir a viagem entre a conhecida cidade de Liverpool (ponto de chegada) e as redondezas da vila de Y Felinheli, onde residem os meus anfitriões no País de Gales, ou dedicar a minha inteira atenção às verdejantes paisagens galesas e deixar para uma outra oportunidade o conhecimento da terra dos Beatles. “Gales pode ser um destino menos conhecido mas tem muita beleza natural”, diz-me a minha amiga. Decidi então trilhar a estrada menos percorrida, o que me levou ao ponto onde me encontro agora: tripulante num barco lusitano de quatro rodas, por lugares pouco navegados. Uma embarcação em que apenas se fala português, mas cujos comandantes possuem quatro anos de experiência em terras galesas.

Assim, longe do bulício das grandes cidades, inauguramos o passeio percorrendo as estradas tranquilas da Snowdonia na zona de Glyderau, onde a montanha é protegida por um manto de vegetação abundante, acarinhada por ovelhas e alimentada pela água que abre espaço entre as suas curvas. A serenidade do lugar invade-me e não estranho que este tenha sido o lugar escolhido para albergar a chama da paz mundial, que aqui dança num monumento erguido em honra da unidade, em frente a um retiro de yoga e meditação.

Continuamos viagem até Bewts-y-coed, onde recebemos uma prova da gentileza gaélica: um senhor cede a sua vaga e o tempo restante do seu bilhete de estacionamento, de modo a que possamos visitar este local encantado. Não sei se por efeito da proximidade de uma vila retirada dos filmes da Disney, se pelo contacto das gargalhadas de uma menina fada que passa por nós a correr, passeamos pela floresta, e imunes ao frio, mergulhamos as mãos na água límpida dos ribeiros.

Contudo, como nenhum lugar encantado está completo sem um castelo seguimos até à cidade medieval de Conwy (na foto), e ficamos sem fôlego ao ver o gigante gótico que se ergue perante nós: oito majestosas torres nascidas de um maciço rochoso, e muralhas imponentes que aninham a cidade nos seus braços, fazem-nos entender o motivo pelo qual a fortaleza construída durante o século XIII, para o rei Eduardo I de Inglaterra, só foi tomada pelo povo galês dois séculos mais tarde. 

Subimos a uma das torres e abraçamos a vista gloriosa: a ponte suspensa que se estira pelo estuário pontilhado de barcos, a cidade medieval esquecida pelo tempo e os dragões escarlates que dançam com as bandeiras ao sabor do vento.

Curiosos para explorar as ruas que se estendem aos nossos pés, partimos em direcção ao povoado. Esbarramos com cavaleiros de armaduras brilhantes, passeamos pelo porto de águas calmas e visitamos a residência mais pequena do Reino Unido que me reserva um facto inesperado: o aspecto frágil de casa de bonecas pintada de vermelho esconde que o seu último morador tinha afinal, 1,91 m de altura.

Quem parece não ficar admirado com a ironia da situação, é um casal de idosos que aprecia o fim de tarde no cais, ternamente de mãos dadas. Na sabedoria da idade, talvez pressintam que os próximos dias ainda me irão reservar muitas surpresas. Talvez adivinhem que irei entrar no Castelo de Penrhyn e sentir que estou na série de televisão britânica Downton Abbey, que irei encontrar a maçonaria ao passear em Caernarfon, ou que irei aprender mais sobre a história e bravura dos homens da região, no Museu Nacional do Xisto.

Talvez a vida lhes tenha ensinado aquilo que só estou a aprender agora: seguir o caminho menos transitado faz toda a diferença. Porque no final, o trilho menos percorrido é o que nos reserva os momentos mais surpreendentes.


 

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