Segui em jeito de rusga, como se uma noite de São João se tratasse, a partir do grande centro de vida nocturna, a Rua Galerias de Paris. Nessa rua repleta de bares nocturnos, naquele domingo, apenas se aproveitavam as esplanadas onde o sol ia espreitando e colorindo o velho casario caiado de azulejos doutros tempos.
Entrei, porventura, no restaurante-bar Galerias de Paris como entrasse numa máquina do tempo. O antigo armazém de retalhos encheu-se de montras com velharias, carros e bonecas, violas e trompetes, balanças e candeeiros, garrafões de vidro verde-musgo e almudes de bronze, um autêntico baú vivo da casa dos nossos avós.
Foi difícil sair dali mas, como em qualquer rusga a romaria é em plena rua em movimento. E é já no fim da rua Galerias de Paris que um novo, moderno e contemporâneo edifício ergueu a velha Praça de Lisboa. Ela é hoje um espaço de ligação entre duas referências patrimoniais da cidade, a Torre dos Clérigos e a Livraria Lelo. Ali, encontram-se lojas de referência internacional e nacional, restaurantes de alto gabarito e uma esplanada envolta de um jardim de oliveiras num “telhado” com vista privilegiada para a Torre dos Clérigos.
Caminhei, desfrutei do tempo e da vista magnífica sobre a torre que comemorou com renovações este ano, 250 anos. A rusga continuou mas nesta calçada cinzenta o tempo manteve-se inerte. Os miúdos jogavam à bola, as senhoras apanhavam sol animadas com conversas da vida alheia e os velhos descansavam no Jardim da Cordoaria.
Este descanso de domingo à tarde percorria todo o movimento dos passeios. Mais abaixo nas Virtudes, entre as árvores frondosas, via-se jovens casais em modo de piquenique com mantas coloridas, meninas em roupas dos anos setenta a lerem livros da actualidade, jovens de estilo gótico em discussões filosóficas ao sabor de umas cervejolas, e claro, o burburinho dos turistas a tirarem selfies com o rio douro e os socalcos do Jardim das Virtudes como fundo.
Na esquina contornei o cheirinho a pregos prontos a sair e o molho de uma francesinha a ser preparada para o jantar. Segui a rusga de turistas e entre ruas, ruelas, calçadas sujas e gastas, entre serpentinas amarelas, verdes, vermelhas e cascatas são joaninas, cheguei à Rua dos Bacalhoeiros na Ribeira.
Cheguei e ali estava a Ponte D. Luís I. Dois tabuleiros entre duas cidades, uma ferragem cinzenta em traços oblíquos e uma arcada redundante, onde o sol esbate de uma forma única como que reflectindo cor ao velho casario tão característico desta cidade.
A Rua do Bacalhoeiro é uma autêntico miradouro mas, para além dela, toda a Ribeira é um emaranhado de ruelas onde ecoam uns “bitaites” à moda do porto. Turistas de todas as raças, várias línguas e vários trajes. Com certeza, esta gente confunde os olhos destes tripeiros que por aqui vivem e se conhecem melhor que ninguém.
“Olha-me este!” “C’um caneco”, os turistas por ali e acolá sentam-se nas esplanadas, porque nas tascas os rostos fechados não fazem amigos. E assim como os turistas, sentei-me na esplanada da Casa das Iscas para saborear os pastéis de farinha de trigo com umas boas lascas de bacalhau, fritas na hora neste boteco de três irmãos de velha idade e de rosto cansado pela amargura da vida.