"Quatro paredes caiadas, um cheirinho a alecrim, um cacho de uvas doiradas, duas rosas num jardim....". É uma casa de férias portuguesa, com certeza, mas já não tão singela como na sua origem (e como no fado citado). Mas pertenceu, de facto, à diva do fado Amália Rodrigues, que a usou como refúgio durante décadas. Sanados os receios de ruína ou decadência, a casa da falecida fadista, localizada na costa alentejana, no Brejão (Odemira, quase na fronteira com Algarve), erigida sobre a falésia da praia celebrizada, precisamente, como Praia da Amália, prepara-se para começar a receber turistas.
Após uma remodelação global, a casa da Herdade Amália Rodrigues é inaugurada oficialmente este sábado, dia 20 de Outubro. A partir de então, está apta a receber hóspedes como alojamento turístico de luxo: pode ser arrendada - apenas no seu todo - de 375 a 450 euros por noite para grupos até seis pessoas.
Com três suítes, fica a apenas uma escadaria de dezenas de degraus da praia, incluindo salas de estar e jantar, piscina panorâmica ou frondoso jardim, antigamente uma das paixões de Amália, que plantou boa parte das flores que hoje se vêem (e também pintou flores em diversos pontos). Tudo com vistas largas para o mar. Não era em vão que Amália dizia que a casa lhe dava "a sensação de estar num barco".
"Vai ser impossível entrar naquela casa e esquecer a quem pertenceu", disse, à Lusa, João Aguiar, presidente da Fundação Amália Rodrigues , sublinhando que "a decoração e toda a envolvência emanam a 100 por cento da sua proprietária".
O projecto de reabilitação da casa e da sua transformação em espaço turístico foi inteiramente da fundação, constituída por vontade testamentária da fadista, e "todas as obras e investimentos foram feitos a expensas" da mesma, sem quaisquer financiamentos públicos, referiu Aguiar. O responsável defendeu ainda que "as autarquias e outras entidades públicas" deveriam apoiar o projecto, pelo menos através da melhoria do caminho de acesso à herdade, da remoção do lixo deixado pelos veraneantes que passam pela propriedade para aceder à praia da Amália ou com a colocação de iluminação nos caminhos.
Segundo Aguiar, o projecto foi orientado para "toda a gente que goste, respeite e considere Amália Rodrigues", procurando, ao mesmo tempo, a "auto-sustentabilidade financeira" da propriedade. Questionado sobre os preços praticados pela herdade, Aguiar disse que o valor foi fixado "atendendo à situação" do país, sem ter em consideração o facto de a casa ser da fadista, um factor que, sublinha, faria o preço "ser muito mais alto".
A reinvenção da herdade (que, no total, detém 10 hectares) ocorre após, há cerca de dois anos, um grupo de cidadãos preocupados com a memória de Amália e com a reabilitação da casa, ter criado a Associação Diva Brejão, entretanto extinta. Na génese da associação esteve o jornalista Mário Rui Pereira, que afirmou à Lusa estar "contente" com a reabertura do espaço, assegurando que o seu aspecto está "completamente modificado" e "muito digno". Afirmando que não lhe interessa "tentar perceber quem é que conseguiu o quê", o jornalista considerou que o objectivo de que "a casa não desaparecesse ou caísse em outras mãos"foi cumprido e reconheceu o "esforço" financeiro "muito grande" por parte da fundação.