Presidente da Câmara de Santa Comba Dão considera "ridículos" os fundamentos para a recusa do registo da marca que pretendia usar para comercializar vinhos e outros produtos regionais.
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O Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) chumbou a marca Memórias de Salazar, alegando que a mesma continha “elementos susceptíveis de pôr em causa a ordem pública”.
“Toda a argumentação é ridícula e demonstrativa da falta de maturidade democrática”, reagiu esta quarta-feira o presidente da Câmara de Santa Comba Dão, João Lourenço, que tentou registar a marca para comercializar vinho e outros produtos regionais.
No ofício que torna definitiva a recusa do registo da marca, de 20 de Setembro deste ano, o INPI baseia toda a argumentação na alínea c) do n.º 4 do artigo 238.º do Código de Propriedade Industrial, que determina que “para que esteja apta a cumprir uma função distintiva, uma marca nacional não poderá ser composta por elementos contrários à moral ou à ordem pública ou ofensivos da legislação nacional e comunitária”.
Para demonstrar que aquele artigo se aplica à marca “constituída pela composição verbal Memórias de Salazar”, os responsáveis pela recusa produziram um texto que ocupa página e meia do ofício sobre António de Oliveira Salazar, que consideram “uma figura histórica bastante controversa no panorama nacional e, sobretudo, a nível político”.
“Como fundador do Estado Novo, foi Presidente do Conselho de Ministros, durante mais de 40 anos, período no qual é reconhecido grande autoritarismo exercido através da propaganda política e da repressão”, pode ler-se no ofício.
Como meios para exercer a repressão, os autores destacam “a censura e a polícia política”, frisando que, através destas, Salazar “almejava, por um lado, doutrinar obrigatoriamente a população portuguesa de acordo com a sua ideologia e, por outro, combater os seus opositores políticos”.
Câmara não desiste
A argumentação prossegue com a afirmação de que Salazar, “estadista muito contestado na opinião pública, é habitualmente associado ao movimento fascista, à ditadura e à repressão, características com as quais o cidadão comum — no momento actual — não se identifica”.
Neste contexto, os autores do texto consideram que “o normal cidadão dotado de sensibilidade e tolerância se sentiria ofendido quer com a exposição comercial, quer com a protecção legal do sinal registado”.
Na conclusão, mantém-se o registo: “Salazar é maioritariamente considerado um ditador que governou um período negro da História portuguesa” e “no estado democrático actual, a concessão do registo violaria, indubitavelmente, o conjunto de princípios fundamentais que norteiam o sistema jurídico”. “A bem da ordem pública e do interesse social”, determinam, aqueles princípios “devem prevalecer sobre o interesse particular”.
Em declarações ao PÚBLICO, o presidente da Câmara de Santa Comba Dão, que não chegou a intervir na fase em que a recusa se manteve como provisória, considerou “toda a situação ridícula”. “Com pessoas que ainda não perceberam que vivemos há quase 40 anos em democracia vou argumentar com quê?”, comentou.
Tenciona apresentar alternativas, mas sempre com a palavra Salazar. “Talvez tirando as ‘memórias’ o problema se resolva”, disse, admitindo a possibilidade de pedir o registo de Vinhas de Salazar.