Eles são a prova da importância da invenção de Louis Daguerre e William Talbot, no século XIX. Não há praticamente um turista no Porto – ou em qualquer lado no mundo – que não ande pela cidade com uma máquina fotográfica ou outro aparelho que faça as vezes dela, nem que seja um pouco prático tablet. E por isso não espanta que, na hora de procurar “O turista perfeito”, muitos dos quase 30 participantes nesta oficina do Instituto Português de Fotografia não tenham conseguido escapar a essa imagem do forasteiro a ver o mundo pelo filtro da tecnologia que, passados 175 anos, quase se tornou numa parte de nós.
Esta terça-feira era o dia mundial dela, a fotografia. Estima-se que, a cada dois minutos, a humanidade tire hoje tantas fotos quantas as que fizeram naquelas primeiras décadas, até 1900. A culpa foi da Kodak, que no arranque do século seguinte democratizou a câmara, e da mesma Kodak, que mais tarde inventou – e desaproveitou – a fotografia digital. A caminho dos dois séculos, a fotografia não apenas se universalizou, como se desfragmentou em zeros e uns, para caber em cartõezinhos de espaço infindável onde o desafio se tornou o de sermos capazes de fazer algo que não mereça a opção delete.
A vontade de fotografar melhor, de não ser mais um no meio da multidão, explica a adesão, cada vez maior, às actividades que o Instituto Português de Fotografia vem organizando neste dia mundial. E desta vez, para além do já tradicional exercício de fotografar o Porto ao amanhecer – onde surgem as inescapáveis imagens das pontes, do rio, mas também já as marcas de uma cidade pontuada pelos restos da movida nocturna, simbolizados pelos copos de plástico espalhados pelo chão – pediu-se a um grupo que aceitasse o desafio de procurar “O turista perfeito”.
Quase nem seria preciso sair das instalações do IPF, na Rua da Vitória, visitadas por um simpático casal francês poucos minutos depois de os inscritos serem mandados à sua sorte. Era mandá-los para o estúdio, aberto neste dia para retratos de família, pedir-lhes uma pose a condizer e, pimba, trabalho feito. Mas ninguém reparou. Lá fora, o fotojornalista fotografava pessoas que fotografavam outras de máquina fotográfica em punho. Confuso? É o mundo em que nos tornamos. Quem não tenha uma câmara que atire a primeira pedra.
Ruas abaixo, cangostas acima, os formandos lá regressaram com a sua visão do turista. Houve quem os olhasse assim mesmo, a partir dos olhos com que vêem o Porto. E pela cor destes, e da pele, se percebe como os vários cantos deste planeta redondo parecem ter descoberto o "melhor destino europeu" deste ano. O Porto está na moda e parece inspirar bons sentimentos, tal a forma com que a extrovertida Sara Rosas, de 22 anos, foi capaz de pôr vários casais em poses românticas, beijo aqui, abraço acolá, ultrapassando um dos defeitos que o formador Alexandre Almeida encontrou nos vários trabalhos: a dificuldade de nos aproximarmos de um desconhecido que queremos fotografar.
O outro defeito fica à atenção do executivo liderado por Rui Moreira. O Porto parece ter demasiados postes de iluminação e edifícios altos que acabam por aparecer por cima de muitas cabeças, estragando algumas imagens. E a coisa só lá vai retirando estes elementos do espaço público ou, na perspectiva de Alexandre Almeida, optando por outro enquadramento, o que fica mais barato para o erário público. “Fotografem, fotografem”, pedia o fotógrafo na esperança de que algumas boas ideias que lhe passaram pelos olhos se possam transformar em projectos. Que o turismo, ou os turistas, é um tema tão bom como outro qualquer e, numa cidade onde já é difícil ouvir-se falar português, não faltam motivos para treinar.
Para outros, o treino começa pela base. Durante a manhã, Augusto da Eira orientou no IPF uma oficina de Pinhole, a eterna técnica que faz de uma caixa de sapatos, revestida de negro por dentro e com um pequeno buraco, uma máquina fotográfica rudimentar. Com os telhados do centro histórico e Gaia como paisagem, os alunos esforçaram-se por ver a impressão causada por uns segundos de luz que lhes revelava um Porto feito de silhuetas. O Porto como terá sido visto um dia, nos primórdios da fotografia, em que eram bem menos os turistas passeando pelas ruas.
Exposição nos Aliados
Aproveitando o Dia Mundial da Fotografia, a Câmara do Porto abriu durante todo o dia o Edifício Axa, e as quatro exposições ali patentes até ao final do mês: L’Imaginaire D’Aprés Nature, de Henri Cartier-Bresson, Encenação do Quotidiano, Projeto Troika e A Non Independent Study on Women. Ao mesmo tempo, a autarquia, através da PortoLazer, inaugurou a mostra O Porto na Avenida, que resultou de um desafio aos habitantes da cidade. Que enviaram em duas semanas cerca quase mil fotografias sobre o Porto, actual ou antigo, a cores ou a preto e branco. Uma centena dessas imagens está exposta na placa central dos Aliados, fixada numa estrutura tubular em PVC desenhada pelo colectivo de artistas 4Pontos. Um júri vai escolher a melhor e o autor ganhará um curso de fotografia digital no IPF.