Fugas - Viagens

Parque Nacional de Torres del Paine§ Chile

Parque Nacional de Torres del Paine§ Chile Josh Stephenson/Reuters

Livro: As viagens que ainda não tínhamos pensado fazer

Por Patrícia Carvalho

A Fugas passou algumas noites a ler este livro - e a sonhar com vários destes lugares do globo. Pela mão da editora Civilização, o saber de 47 viajantes-escritores chegou a Portugal para nos mostrar os destinos para além do óbvio quando falamos de viagens inesquecíveis

A tarefa é hercúlea ou muito simples, depende do ponto de vista. Melhor dizendo, dos recursos que se têm à mão. Neste caso, a Dorling Kindersley, do grupo editorial Penguin, muniu-se de 47 viajantes-escritores e condensou o seu saber e experiência num livro que procura mostrar-lhe o que está para lá do óbvio, quando pensa em viagens inesquecíveis. "Viagens, os lugares menos visitados - 1000 lugares fascinantes fora das rotas turísticas" chegou a Portugal, com a chancela da Civilização. Lá dentro está todo o mundo à espera de ser explorado, dos pontos mais remotos à maravilha portuguesa, que fica já aqui ao lado.

O escritor de viagens norteamericano Bill Bryson sintetiza de forma perfeita o que significa folhear esta obra, no prefácio que escreveu para este Viagens. A má notícia, diz, "é que há mais coisas fantásticas para ver no mundo do que aquelas que alguma vez poderá aspirar a ver". A boa notícia, contudo, "é que há mais coisas para ver no mundo do que aquelas que alguma vez poderá aspirar a ver".

Porque o que nos revela, página após página, este guia alternativo é que não importa o quanto acha que conhece do mundo. Vai sentir que ainda não viu nada e que há uma infinidade de sítios que, simplesmente, não pode perder.

Se vai ter tempo para os ver a todos? Bill Bryson acha que não. Provavelmente, temos de concordar com ele. Servindo-nos da optimista teoria do copo meio-cheio, ao menos, com esta obra, pode descobrir sítios que nem imaginava que existiam e, se for mesmo muito sortudo, seleccionar um punhado deles e organizar os planos de viagem para a próxima década.

Para lhe facilitar a vida, de acordo com o que poderá ser mais apelativo para cada um, as visitas propostas estão divididas em nove capítulos Locais antigos e históricos; Festividades e festas; Viagens fabulosas; Maravilhas arquitectónicas; Maravilhas naturais; Praias; Desportos e Actividades; Arte e Cultura; e Cidades.

Não tarda, vamos explorar um pouco do que pode encontrar em cada um deles. Para já, um conselho: apesar de grande parte do livro estar organizado como uma proposta alternativa ao sítio turístico óbvio (tipo, vá conhecer as Pirâmides de Meroé, no Sudão, em vez das Pirâmides de Gizé, no Egipto), não se sinta demasiado tentado, à partida, em descartar uma visita às paragens mais conhecidas. Como o próprio livro refere, apesar de alguns pontos fracos associados, em grande parte, à excessiva procura turística, há um motivo para que estes locais se tenham tornado tão famosos. E, digam o que disserem, se puder, não perca uma visita à Isla del Sol, na Bolívia, mas não sinta, de maneira nenhuma, que por visitar esse local pode ou deve abdicar de ir a Machu Picchu, no Peru...

Locais antigos e históricos

Falar em ruínas históricas é, para muita gente, falar no Egipto, e é mesmo por aqui que começa a rota de Os lugares menos visitados. A proposta é: não pense no Egipto, pense no Sudão. É aí que, no meio do deserto, vai encontrar os cemitérios reais de Bagrawiya, mais conhecidos como pirâmides de Meroé, assim como as ruínas dos templos de Naqa e Musawwarat, memórias do Reino Kush, que adoptou o modelo da arte egípcia, quando o reino dos faraós já entrara em declínio.

Mas, se, ainda assim, o Egipto é mesmo o seu destino de eleição, este capítulo deixa-lhe outras sugestões de locais que vão bastante para além de Gizé e que não deve mesmo perder - como as pirâmides de Saqqara e Dahshur, a poucos quilómetros do Cairo, ou o Templo de Hatshepsut, um monumento único, harmoniosamente escavado nas rochas que circundam o Vale dos Reis, junto a Luxor, e que nenhuma viagem a esta parte do país deve deixar de lado.

Mas chega de pirâmides e de túmulos faraónicos. Se a sua predilecção vai para o misticismo dos círculos de pedra ao género de Stonehenge, na Inglaterra, a sugestão é que deixe Stonehenge, e a impossibilidade de tocar nas suas pedras, para outra ocasião e que vá visitar antes Avebury, no Sul do país, que procure conhecer a formação oval de Ales Stenar (Suécia), construída pelos vikings, ou o Círculo de Pedras de Wassu (Gâmbia), considerada a maior formação do género em todo mundo.

A designação de "locais antigos" também pode despertar uma vontade louca de ir, finalmente, conhecer a Acrópole de Atenas (Grécia), o Coliseu de Roma (Itália), as ruínas da cidade de Pompeia (Itália) ou as construções rosa esculpidas na rocha de Petra ( Jordânia). Pense duas vezes. A sugestão deste guia é que, em alternativa, visite as ruínas gregas de Agrigento e Selinunte, na Sicília; a Arena de Pula, na Croácia (ou o El Djem, na Tunísia, ou a Arena de Verona, em Itália); Herculaneum, a 16 quilómetros de Pompeia e também soterrada pela mesma erupção do Vesúvio; e os monumentos esculpidos na rocha em Lalibela (Etiópia), ainda hoje um centro religioso pujante.

As propostas não acabam por aqui - longe disso - e transportamno a Borobudur, na Indonésia, em vez de sugerir que se fique pelos templos budistas de Angkor, no Cambodja; carregam-no até ao sítio maia de Tikal, na Guatemala, em alternativa a Chichén Itzá, no México, e impelem-no a conhecer o Palácio de Potala, no Tibete, as ruínas celtas no meio do verde denso de Glendalough (Irlanda) ou as catedrais de cúpulas douradas de Sergiyev Posad, na Rússia.

Festas e festividades

Depois do peso de tanta História, nada como relaxar em alguma celebração feita à sua medida. E o que lhe vem à memória, de imediato, quando pensa nisto? O Carnaval do Rio de Janeiro? Vá antes à festa mais popular de Salvador da Baía, a Olinda e Recife, ou salte a fronteira brasileira e dirija-se às ilhas de Trinidad e Tobago para ver como a última sexta-feira antes da Quaresma se torna colorida por estes lados. Gosta mesmo é de eventos culturais e não dispensa o Fringe, de Edimburgo (Escócia), ou o Festival de Jazz de Montreux (Suíça)? E que tal se experimentasse antes o Festival de Artes de Melbourne (Austrália) e as suas 60 a 80 actividades anuais de dança, teatro, ópera ou artes visuais, e o Festival de Jazz de Montreal (Canadá), com os seus mais de 750 concertos?

Para aqueles que não dispensam uma boa celebração religiosa, com toda a encenação que lhe está associada, é muito provável que já tenha ido ou pretenda ir à Semana Santa de Sevilha. Não lhe dizemos para não ir. Mas contemple a possibilidade de experimentar a religiosidade de uma forma muito diferente, gozando a mistura entre as tradições católicas e a cultura andina, na Semana Santa da cidade peruana de Cuzco.

Festas há muitas e as sugestões deste Viagens transportam-no - literalmente - ao ambiente, latitude e colorido que mais o atrai. Se não acredita, experimente dar um salto ao Festival Internacional de Música Popular do Rajastão (Índia), à Batalha do Vinho de Haro (Espanha), à procissão religiosa de Esala Perahera (Sri Lanka), ao Mardis Gras gay e lésbico de Sidney (Austrália), ao festival equestre ancestral de Naadam (Mongólia) ou - porque a época até é propícia -, ao Mercado de Natal de Praga (República Checa).

Viagens fabulosas

Há locais que nem mesmo os autores deste livro se atrevem a pôr de lado, sugerindo um "não vá aqui, vá antes ali". A China e a Índia são exemplo disso mesmo - ambos são apontados como destinos fabulosos. Não era possível dizer, simplesmente, não vá a nenhum deles. Em alternativa, os autores deste roteiro sugerem uma viagem aos locais menos percorridos de cada um. É possível deixar de lado as rotas turísticas destes dois gigantes e, ainda assim, sentir-se maravilhado? Experimente. Na China, procure Hangzhou, antigo retiro de imperadores, e confirme se o velho epíteto de "paraíso na terra" ainda se aplica a Suzhou, com os seus jardins classifi cados pela UNESCO. Na Índia, perca-se no Parque Nacional de Kaziranga, com a sua variedade estonteante de vida selvagem, ou descubra a magnífica paisagem de onde brotam os rios Ganges e Yamuna, na região de Garhwal.

Mesmo antes de alguém ter condensado em 336 páginas tantos destinos de cortar a respiração, não tínhamos dúvidas que existem demasiadas viagens fabulosas à espera de serem descobertas. Na América do Sul, parece haver uma maravilha em cada esquina. Seja o incrível Parque Nacional de Torres del Paine (Chile), com os seus lagos de cores impossíveis, seja a Cordilheira Branca do Peru ou o Salar de Uyuni, na Bolívia.

A Norte, a mítica Route 66 (Estados Unidos da América) ainda pode cativar centenas, mas o que é ela, quando comparada com a Pan-Americana, que se estende do Alasca à Terra do Fogo?

O mundo, estão sempre a lembrar-nos aos autores, página após página, está cheio de destinos que ninguém devia perder, seja visitando a Antárctida num quebragelos, participando numa caravana de camelos no Sara (Marrocos) ou fazendo um safari de canoa no rio Zambeze, em África.

Maravilhas arquitectónicas e Arte e Cultura

É provável que algum dos destinos menos visitados que aqui são sugeridos até já constem da sua lista de viagens futuras. E se tem algum interesse específico - como a arquitectura, arte ou a cultura em geral -, maior é a probabilidade de já ter decidido, por exemplo, que não basta conhecer a Basílica de São Marcos (Itália), e que é obrigatório visitar também a Hagia Sophia (Turquia) ou o Museu Britânico (Inglaterra). De igual modo, se calhar já concluiu que tem absolutamente de ir a Chicago (EUA), para descobrir se os seus encantos suplantam Nova Iorque (EUA), e que precisa de percorrer a Avenida 9 de Julho, em Buenos Aires (Argentina), porque os Campos Elísios parisienses (França) simplesmente já não são suficientes.

Ainda assim, talvez ainda não lhe tenha ocorrido que o Festival de Cinema de San Sebastian (Espanha) pode ser tão ou mais interessante que o de Cannes (França) e que uma visita à Andaluzia (Espanha) ou a Puglia (Itália) poderá ser tão gratificante como percorrer os campos da sempre idolatrada Toscana (Itália).

Maravilhas naturais

As paisagens naturais são capazes de arrastar milhões de viajantes para os cantos mais remotos do planeta. Este livro mostra-lhe que há mais maravilhas na Natureza do que aquelas que possivelmente imaginara. Desde as formações rochosas - já pode ter ouvido falar de Ayers Rock ou Uluru (Austrália), mas conhece a Torre do Diabo (EUA) ou a Pedra Azul (Brasil)? -, aos rios, com destaque para o pouco percorrido Orinoco (Venezuela), ou aos lagos chilenos, passando por reservas naturais como a do Uganda Ocidental, com a sua população única de gorilas (e que é sugerida em alternativa ao bem mais famoso Parque Nacional Kruger, na África do Sul), há de tudo um pouco para os sonhos de cada um. Qual o amante da natureza que não sonhou ainda visitar Madagáscar, a selva do Bornéu (Indonésia), ver as cerejeiras em flor no Japão ou ficar de boca aberta perante a força indescritível das águas nas Cataratas do Iguaçu (Brasil e Argentina)? Viagens diz-lhe que não anda a sonhar com destinos impossíveis e que o melhor mesmo é ir. Seja para o Pantanal (Brasil), para a Península de Beara (Irlanda), o desfiladeiro de Colca (Peru) ou assistir ao espectáculo dos pirilampos nas Grutas de Waitomo (Nova Zelândia), a garantia é que não se vai arrepender.

Praias

Atrever-se a sugerir que uma determinada praia é melhor do que outra não é brincadeira - a praia de cada um é uma coisa muito séria e ninguém gosta de admitir que a praia do vizinho é melhor do que a sua. Ainda assim, o livro sugere 84 praias que talvez não conheça e assume claramente preferências. A saber, por exemplo: Copacabana (Brasil) já não é o que era, dirija-se antes a Punta del Este (Uruguai) e vai ver o que é uma praia cheia de actividades.

A obra mantém-se perto de algumas zonas famosas pelas suas praias, mas, como não podia deixar de ser, sugere as menos conhecidas. No Havai, por exemplo, Waikíkí é preterida a favor de Hulopo'e e, na Tailândia, Ko Phi Phi fica para depois, sendo melhor pousar a toalha em Ko Tarutao.

Se gosta mesmo de sol e mar e está farto dos destinos do costume, experimente a costa leste de Zanzibar, Anse Source d'Argent, em La Digue, nas ilhas Seychelles, Ihuru, nas Maldivas, Turtle Bay, no Quénia, ou Muizenberg, na África do Sul.

Desportos e actividades

Seja a correr uma maratona, a escalar uma montanha, a esquiar, a praticar mergulho ou a jogar golfe, há muitos turistas para quem viajar tem de estar associado a algum tipo de desporto. Também para eles há lugares cuja fama já cresceu de tal maneira que se tornaram verdadeiros chamarizes. E, também aqui, há alternativas menos divulgadas à espera de se tornarem o próximo local a descobrir - e repetir.

A Grande Barreira de Coral (Austrália) é o recife que todos os mergulhadores sonham explorar, mas na mesma zona do planeta, entre a Austrália e a Indonésia, um mergulho nas águas em redor da Ilha de Natal pode revelar-se igualmente deslumbrante - sobretudo porque há uma boa hipótese de o seu grupo ser o único na água.

As sugestões são demasiadas para as percorrer a todas, mas ficamos com vontade de percorrer de bicicleta a Capadócia (Turquia), caminhar no Butão, fazer espeleologia em Porto Rico, participar num jogo de pólo de elefantes, no Nepal, andar a cavalo no Quirguistão e nadar, de ilha em ilha, na Grécia.

Cidades

O capítulo dedicado às cidades é o mais distinto de todos os que povoam este trabalho da Civilização. Porque há cidades que, simplesmente, não podem ser deixadas de lado. A sugestão é que folheie as páginas deste Viagens e descubra os caminhos menos explorados de Londres (Inglaterra), Nova Iorque (EUA), Hong Kong (China), Veneza (Itália), São Francisco (EUA), Paris (França) e Sidney (Austrália).

Visitados estes espaços essenciais, há muitas outras cidades que pode marcar já no mapa para uma visita futura como Delft (Holanda), Fez (Marrocos), Riga (Letónia), Carcassonne (França), Udaipur (Índia), Viantiane (Laos), Gyeongju (Coreia do Sul), Addis-Abeba (Etiópia), Toledo (Espanha), Santiago (Cuba) ou Split (Croácia).

Portugal
Maravilhas nossas

Por esta altura, se calhar já pensou que muitas destas sugestões ficam demasiado longe, são demasiado caras e exigem demasiado tempo para serem conhecidas. Respire fundo. O livro tem uma boa surpresa entre as suas páginas: algumas das maravilhas que os autores consideram imperdíveis são portuguesas.

Por duas vezes, a região do Douro é destacada na obra. A primeira, no capítulo Viagens fabulosas, no qual é sugerido um cruzeiro ao longo do rio nortenho como uma aventura a experimentar. A outra, no espaço dedicado à Arte e Cultura, em que o vale do Douro é apontado como "uma das seis regiões de cultura que rivaliza com a Toscana (Itália)".

Ainda a norte, a Casa da Música, no Porto, surge destacada como uma das Maravilhas Arquitectónicas do mundo, e, no mesmo capítulo, caminhando para sul, o Aqueduto das Águas Livres, em Lisboa, comp "o maior arco em ogiva do mundo" (sabia?) é outro dos locais que qualquer viajante que se preze não deve deixar de conhecer.

Sintra, paixão de muitos estrangeiros há bem mais de um século, é identifi cada como uma das Cidades Fantásticas da obra e o Museu do Fado, em Lisboa, como mais um destino a não perder.

Para terminar, as ilhas, claro. A costa da Madeira é sugerida como uma das Viagens Fabulosas a experimentar, pelo menos uma vez na vida. E os Açores como um dos "quatro arquipélagos que rivalizam com as ilhas gregas", no capítulo das Maravilhas Naturais do mundo.

"Viagens, os lugares menos visitados"
Vários autores
Tradução de Luís Gonçalves
Civilização Editora
34,99€

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