Há um novo veleiro a revelar panorâmicas de Lisboa a partir do Tejo. Desde as colinas cobertas de casario colorido e pontilhadas de monumentos até à baixa de Belém, a capital desfila por nós ao sabor do vento e em três tonalidades possíveis: em plena luz do dia, pôr do sol ou luar. Um pequeno luxo proposto pela Tagus Cruises para grupos até onze pessoas e que se pode estender também por Cascais, para banhos de mar.
Um biombo do que parecem peças de Lego cinza e ocre inaugura a viagem numa das zonas mais industrializadas de Lisboa, ao largo de Alcântara. Por cima de nós, a compor a paisagem metálica, um enxame de carros atravessa a Ponte 25 Abril, num zumbir mais alto do que se poderia prever às 16h de um domingo. Ainda assim, passar por baixo do tabuleiro entrecortado da ponte seria uma das experiências mais marcantes, repetida três vezes ao longo da viagem e com direito a dezenas de fotografias. Depois, ultrapassada a parafernália de contentores, gruas e cargueiros, apresenta-se-nos a velha Lisboa em todo o seu esplendor.
Navegamos em direcção a Alfama, mas por agora apenas se adivinham ao longe os edifícios ministeriais do Terreiro do Paço, o minúsculo castelo no seu cume verde e, até lá, um manto de edifícios novos e antigos galgando as colinas. Ao leme vai José Gomes, dono do Whatever, um Beneteau Oceanis 43 de 13,15 metros de comprimento que agora balança ao ritmo das ondas, pequenas de mais para enjoos. Com o nascimento do filho, José ficou sem disponibilidade para as viagens que fazia e decidiu criar a Tagus Cruises com Nuno Martins, skipper na maioria dos passeios. A operar desde Maio, os dois sócios da empresa dizem que o sucesso é maior do que o esperado.
Enquanto José nos conta descontraidamente algumas das viagens que fez a bordo do Whatever, onde se inclui uma travessia solitária de 18 dias entre as Caraíbas e os Açores, velejamos em paralelo à Av. 24 de Julho, descobrindo alguns monumentos por entre a paisagem urbana. Museu Nacional de Arte Antiga, Igreja de Nossa Senhora de Jesus, um cacilheiro perto do Cais do Sodré.
Mas se as máquinas fotográficas ainda não tiveram descanso desde o início da viagem, agora, ao dobrar a baixa alfacinha, agrupam-se a bombordo para registar o Terreiro do Paço. Aqui será irresistível tentar alinhar a estátua de D. José ao centro do Arco Triunfal da Rua Augusta e das colunas do cais, para uma fotografia de enquadramento simétrico perfeito. Mas a zona mais antiga da cidade pulula de monumentos e, passada a imensidão da praça, os olhos logo fogem para o castelo, para a Sé de Lisboa, para a Igreja de São Vicente de Fora, para o Panteão Nacional. Elevado vários metros acima dos telhados de Alfama, o imponente edifício quase parece um farol, sinalizando-nos o local onde dar meia-volta e regressar.
Uma pontinha de inveja
Atenção ao sítio onde se põem os pés, cuidado com a cabeça. À batuta de José, as velas passam a toda a velocidade para o outro lado, troca-se o leme, prendem-se de novo os cabos. Uns breves momentos de intenso barulho com o esticão das telas e já estamos virados ao contrário. Se antes íamos no alto, agora a inclinação quase nos faz escorregar até à água. Não é preciso ter experiência de vela, o skipper faz tudo sozinho, mas quem quiser pode participar nas manobras.
Devido às pequenas dimensões do Whatever, com capacidade máxima de onze passageiros e um skipper, sentimo-nos a bordo de um barco (quase) privado. O interior, que fomos conhecer enquanto a paisagem se repetia, traz um toque extra de charme. Descemos as escadas directamente para o salão, misto de sala de estar, de refeições e cozinha. No lado direito, uma porta esconde uma casa de banho completa e outra uma pequena cabine; em frente fica a cabine principal, com WC. As paredes e mobiliário de madeira, aliadas a uma decoração em branco e azul, não falham o imaginário marítimo. Se a viagem fosse mais longa, talvez nos deitássemos um pouco na cama fresca e convidativa, mas queremos aproveitar tudo o que Lisboa tem para nos mostrar.
Quando regressamos ao poço - zona exterior de bancos corridos e mesa e de onde o skipper comanda o veleiro - já o Cristo Rei nos volta a abraçar de perto. Depois de petiscarmos uns snacks trazidos de casa (o passeio não inclui bebida ou comida), caminhamos até à proa, sempre com pelo menos uma mão apoiada, medida de segurança exigida à partida. O banco na frente do veleiro convida à fruição demorada da paisagem. Os cabelos ao vento, o sol a bater na cara, o corpo embalado na dormência das ondas. Sem darmos por isso estamos de volta ao ponto de partida, mas a viagem, feita em oito, ainda não terminou. O burburinho dos carros volta a passar-nos por cima e logo se começa a avistar mais uma fiada de monumentos emblemáticos de Lisboa. O Museu da Electricidade, o Padrão dos Descobrimentos, o CCB, a Torre de Belém. O Mosteiro dos Jerónimos surge quase escondido pelo jardim, o Palácio da Ajuda leva-nos a olhar para o alto.
Depressa se chega a Algés e se volta para trás. Mas podíamos ter continuado. A Tagus Cruises tem programas até Oeiras (quatro horas) e Cascais (oito horas). Nestes casos, não há passeio para lá da Ponte 25 de Abril, mas pode-se ir a banhos, uma vez que o barco fica fundeado junto à costa durante uma ou quatro horas, conforme o circuito escolhido. A partir de Outubro/Novembro, este tipo de viagem começa a dar lugar a outras, mais pontuais e longas. Experiências de mar, em viagens de pelo menos 24 horas, até Sesimbra, Sines ou outro destino proposto pelo cliente.
Estamos de volta à ponte e agora é de vez, já sob a luz esbatida do final de tarde. Os próximos clientes esperam junto ao cais para o mesmo percurso, mas ao pôr do sol. O alaranjado do lusco-fusco e o cintilar do luar são os tons mais requisitados para ver Lisboa do Tejo, segundo a empresa. E nós, com uma pontinha de inveja, acreditamos saber porquê.
Tagus Cruises
www.taguscruises.com
Facebook: Taguscruises
Reservas: 925 610 034 ou taguscruises@zonmail.pt
Local de embarque: Doca de Santo Amaro de Alcântara
Preços: passeio no Tejo (três horas, 38€ por pessoa), Lisboa ao pôr do sol ou ao luar (três horas, 72€ por pessoa), Lisboa-Oeiras (4 horas, entre 400 e 600€ por grupo), Lisboa-Cascais (8 horas, entre 700 e 825€ por grupo)
Número mínimo de passageiros: 4 (Lisboa), 6 (Oeiras e Cascais)
Número máximo de passageiros: onze
Número máximo de viagens por dia: quatro
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Lisboa desfila por nós ao sabor do vento