Fugas - Viagens

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    Thomas Grosserichter
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  • Thomas e Pedro, a celebrarem o início da odisseia, em Setembro em Berlim
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  •  A noite cai sobre a carrinha de apoio
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  • A rota da aventura
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  • A bicicleta foi fabricada à medida da odisseia
    A bicicleta foi fabricada à medida da odisseia

Thomas pedalou o mundo em 105 dias rumo ao Guinness. Com ajuda portuguesa

Por Mara Gonçalves

Thomas Grosserichter pedalou o mundo em 105 dias, 1 hora e 44 minutos. Falta ainda a confirmação do Guinness mas terá mesmo batido o recorde mundial, tornando-se o homem mais rápido de sempre a percorrer o planeta em bicicleta. Já no carro de apoio, o português Pedro Carvalho garantia que tudo corria sobre rodas.

Entre a Berlim de 17 de Setembro e a Berlim de 31 de Dezembro, Thomas e companhia atravessaram 19 países de quatro continentes e sentiram temperaturas dos 0 aos 40ºC. Cruzaram desertos e rectas a perder de vista, subiram a 3.500 metros de altitude nos Andes, carregaram o peso da chuva e do vento ao longo da costa norte-americana, avariaram o carro de apoio a quilómetros da Polónia, correram pela vida no México, passaram o Natal na estrada. Foram da certeza de que iam bater o recorde anterior (127 dias) a estarem certos de que já não iam conseguir fazê-lo. Mas o mundo dá muitas voltas.

O que esta odisseia não teve, garantem, foi turismo. Resumiu-se antes a uma corrida contra o tempo tornada viagem de desporto de aventura. “É basicamente desporto”, dizia o alemão Thomas à Fugas na passagem por Lisboa, em Dezembro, na companhia do português Pedro Carvalho que apoiou no terreno toda a jornada. Mas “passámos por diferentes países e diferentes culturas e é isso que faz com que esta viagem seja uma aventura, como por exemplo ficar 'preso' numa fronteira”, relembra Thomas.

Foi o que aconteceu entre a Ucrânia e a Moldávia. As burocracias não deixaram o carro de apoio passar e nem a ajuda de um ucraniano que falava português no posto fronteiriço, nem a persuasão ou o suborno levaram a melhor. “Ficámos lá presos três horas e o tempo estava a passar porque tínhamos de apanhar um avião no dia seguinte em Quichinau, capital da Moldávia”, conta Pedro. Eram 22h, o voo às 8h40 do dia seguinte. 240 quilómetros para pedalar em 10 horas. Solução: um táxi foi o “carro vassoura” daquela noite, depois de negociada a corrida em russo com tradução por telefone de um amigo em Portugal. Thomas seguia à frente na bicicleta e o táxi atrás, a iluminar o caminho. Às 8h chegaram à capital moldava e “acharam que iam conseguir”. Mas o taxista não sabia o caminho para o aeroporto, acabaram por perder o avião.

“Não é uma história muito feliz, mas foi a primeira vez que batemos o nosso recorde pessoal: fizemos 423 quilómetros num dia, chuvoso e metade de noite, cerca de 20 horas de bicicleta”. “O que ganhámos daquela experiência foi a certeza de que conseguíamos fazer algo tão difícil”, acreditam. Afinal, foi isso que motivou Thomas a tentar bater o recorde: “testar os limites e ver quanto é que conseguia aguentar física e mentalmente”.

Foi em 2008, na primeira grande viagem que fez de bicicleta – e onde realmente começou a paixão por esta forma de viajar – que Thomas ouviu falar do recorde do Guinness. “Nunca mais me saiu da cabeça”, confessa. Nas viagens anteriores, Buenos Aires-Vancouver e Himalaias, “estava simplesmente a viajar sozinho, com a minha bicicleta, indo de um lugar para o outro, tirando dias para descansar e visitar monumentos. Mas queria fazer algo mais desafiante”.

Arriscar a vida por um recorde

“Queres ir numa viagem à volta do mundo? Eu pago-te a comida, os voos e as estadias”. Pedro Carvalho ainda teve de “pensar um bocado”, mas “passados cinco minutos estava a ligar-lhe a dizer que sim”. Em Setembro, juntou-se a Thomas e a Robert, o outro elemento da equipa, na Alemanha. Foi a terceira vez que estiveram juntos, depois de se terem conhecido em viagem no ano anterior, num encontro de passagem por um hostel na Argentina. No dia em que Thomas fez 27 anos partiram de Berlim rumo ao mundo, rumo ao desejado recorde do Guinness.

Para tal, tiveram de percorrer 40 mil quilómetros (o equivalente ao perímetro do equador), 29 mil dos quais a pedalar, sempre no mesmo sentido e cruzar dois antípodas (escolheram Madrid e Auckland na Nova Zelândia) antes de regressarem à meta em Berlim. O objetivo inicial era fazê-lo em 100 dias. Acabaram em 105. Pelo caminho, a mesma bicicleta amarela, muitos veículos de apoio alugados, dormidas onde perdiam as forças, em tendas junto ao carro, hostels ou na polícia local.

“Foi um recorde muito amador”, confessa-nos Pedro uns dias depois de regressar da odisseia. “Não tínhamos muita preparação, fomos aprendendo à medida que íamos andando” e “tivemos de improvisar muito em cima do acontecimento”. “Acho que é o que torna esta viagem ainda mais incrível, tivemos sempre a sorte do nosso lado”. Mas não se livraram de alguns sustos.

Para ganharem tempo ao relógio e sempre que as pernas deixavam, seguiam até às 22h/23h. O México não foi excepção. No entanto, numa dessas noites – “escuridão total e só nós na estrada” – apareceram dois homens com lanternas, armas e caras tapadas com lenços, a fazer sinal para pararem. “O Thomas percebeu logo que não podia ser coisa boa, vira-se para trás e começa a gritar: «Vão, Vão! Não parem!»”. Mas Robert, que ia a conduzir o carro de apoio, começou a abrandar, “sem reacção”.

“Como entretanto o carro ia já muito devagarinho, eles acharam que nós íamos realmente parar e tivemos sorte, porque ele entretanto desperta e carrega no acelerador e os tipos ficaram espantados, um deles estava já com a arma junto ao vidro do condutor”, conta Pedro, lembrando-se que nem os pais ainda sabem da história. “Ainda gritei para nos baixarmos, mas não dispararam. Correu bem, mas nessa noite fomos para um hotel em frente a uma estação da polícia. Pensei sinceramente no que é que eu andava ali a fazer, a arriscar a minha vida por causa de um recorde do Guinness, que vale o que vale comparado com a vida de três pessoas”.

No entanto, afiança, “o México é um país espectacular”, onde conheceram muitas pessoas. E até, ironia das viagens, uma mexicana que pedalava pela Austrália com o objetivo de mudar a imagem que o povo tem do seu país. Sempre em contra-relógio, não fizeram muitas amizades além de encontros à beira da estrada, sobretudo com ciclistas. Também não viram as principais atracções de cada país (as praias tailandesas, por exemplo, passaram-lhes a cinco minutos de distância), mas deixaram-se encantar pela exuberância das paisagens na Nova Zelândia, pelos quilómetros de deserto remoto na Austrália, pela simpatia da maioria dos povos, pela aridez de Atacama. Como regressaria à maioria dos países, para Pedro a viagem serviu sobretudo para “identificar os sítios onde não ir” [como a zona “muito monótona” junto à costa no norte do Perú] e “redescobrir países” [como a Argentina e o Chile], onde andaram por lugares a que os turistas normalmente não vão.

Depois de dias a deslizar com o vento na Argentina – a mais de 200km por dia – o regresso à Europa foi “muito mais difícil”. Cãibras em Lisboa atrasaram a partida para a última etapa, feita de mais cidades e declives, mas bom tempo. O Natal no País Basco foi passado num hotel, com a família no Skype, regado a vinho tinto e queijo português. Já a última etapa alongou-se e teve umas 32 horas de bicicleta e mais algumas de ano novo. “Fizemos esse dia de seguida. Saímos da fronteira da Holanda com a Alemanha, passámos pela aldeia natal do Thomas [onde foram recebidos “que nem heróis”] e depois seguimos directos para Berlim, [onde] chegámos por volta das 9h”. Um misto de “felicidade” e “vazio”, um recorde do Guinness (provavelmente) conquistado.

Agora, enquanto Pedro regressou ao trabalho, Thomas já só pensa no próximo desafio.

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Na estrada
A bicicleta (Agresti) foi fabricada propositadamente à medida de Thomas e da sua odisseia. No apoio da estrada, contou com Pedro Carvalho e Robert Cramer, que seguiam num veículo prontos a prestar todo o apoio. Os tempos de descanso foram feitos na sua maioria na tenda mas também entre hostels e outros alojamentos similares, à beira da estrada ou em casas de amigos.

O percurso
Thomas saiu de Berlim no dia 17 de Setembro (às 08h15)  e cruzou a meta na capital alemã a 31 de Dezembro (às 09h59). Eis o mapa da “prova”: Alemanha, Polónia, Ucrânia, Moldávia. (voo). Tailândia, Malásia. (voo). Austrália. (voo). Nova Zelândia. (voo). Canadá, Estados Unidos, México. (voo). Equador, Perú, Chile, Argentina. (voo). Portugal, Espanha, França, Bélgica, Alemanha.
Total de quilómetros percorridos: 29.019 km
Tempo: 105 dias 1 hora 44 minutos
Máximo de quilómetros percorridos num dia: 455 km (Argentina)

Na net
Site: www.cyclingtheworld.de 
Facebook: www.facebook.com/cyclingtheworld2012
Blogue de Pedro Carvalho: ocarrovassoura.blogspot.pt

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