Fugas - Viagens

Sara e Pedro, uma longa lua-de-mel a pedalar por amor

Por Mara Gonçalves

Sara e Pedro Marques de Sousa queriam fazer uma grande viagem. Os planos deram em casamento e passaram para a lua-de-mel. Trocaram alianças, a casa por uma tenda, o carro por duas “binas”. Durante dois anos pedalam o amor que os une pelo continente americano.

O que veio primeiro: o casamento ou a viagem? Sara e Pedro Marques de Sousa não têm a certeza. “Já pensávamos casar, assim sem nenhum plano definido. Achámos que tornar esta viagem a nossa lua-de-mel seria uma boa opção”, conta-nos Sara em conversa a partir do México. “Gostamos muito um do outro e juntámos o útil ao agradável”, remata Pedro.

O casal lisboeta conheceu-se em 2010 num workshop de cozinha vegetariana, ele professor e ela aluna. Apaixonaram-se, começaram a morar juntos e pouco depois planeavam uma grande viagem de bicicleta, que rapidamente se transformou em casamento e lua-de-mel. Trocaram a casa por uma tenda, o carro pelas “binas” Sabrina e Samantha, os armários por alforges amarelo-vivo, os empregos pelo desconhecido e o início normal de um casamento por novas aventuras a cada dia. Casaram-se a 15 de Dezembro de 2012 e em Maio do ano seguinte partiram num périplo romântico, que vão relatando no blogue “Nós de Bina”

O roteiro previsto da viagem inclui 15 países: EUA e México, todos os países continentais da América Central e depois Colômbia, Equador, Peru, Bolívia, Chile e Argentina. No entanto, com nove meses de viagem pedalados, a Patagónia parece-lhes cada vez mais longe. “O entretanto é tão bom que o final acaba por ser muito relativizado, tudo aquilo que vamos descobrindo vai-nos puxando para um atraso bom”, contam. Neste momento já estão mais de um mês aquém daquilo que imaginavam, mas garantem que “não ficam muito amuados” se não chegarem ao destino previsto.

A verdade é que também “não são muito ciclistas”, confessam. Não fazem largos quilómetros por dia nem atingem grandes velocidades, gostam muito de parar, conversar com quem encontram, relaxar em locais bonitos e ficar vários dias nas grandes cidades. “Às vezes demoramo-nos um bocado mais do que o que deveríamos, mas é algo que nos agrada”, dizem. E não são raras as vezes em que isso acontece.

No México, a Casa Ciclista de Guadalajara e as pessoas que lá estavam “marcaram-nos muito” e em vez dos cinco dias planeados acabaram por ficar 12. O mesmo aconteceu nos EUA. Cruzaram-se com o casal Raphael em Oregon, que os convidou a ficarem em casa deles se passassem por Portland. “O nosso plano era ficar três ou quatro dias e acabámos por ficar uma semana, com eles sempre a insistirem para ficarmos mais. Acabámos por viver uma coisa que nos fazia muita falta que era estar em família”, contam. Durante aqueles dias celebraram aniversários, assistiram aos jogos dos filhos, conheceram tios e avós.

No início tiveram de lutar diariamente contra o medo e a vergonha de falar com estranhos e pedir um sítio para ficar. O nervosismo ainda não desapareceu por completo, admitem, mas este contacto humano constante que o andar lento da bicicleta proporciona foi uma das principais razões para utilizarem este veículo. “Acabamos por nos entregar um bocadinho nas mãos dos outros e depender da bondade alheia” e muitas vezes descobrem-se sítios “nada turísticos”, mas que “têm interesse pelas pessoas que se encontram”, defendem. “Precisamos de ter uma perspectiva um bocadinho mais optimista do nosso mundo e pensámos que ir de bicicleta fosse uma forma de voltar a acreditar”. Até agora podem dizer que a fé na humanidade está restaurada: aquilo que mais destacam da viagem é precisamente a bondade das pessoas, sempre dispostas a dar-lhes água, comida, boleia, um banho de água quente ou um sítio onde dormir.

Neste momento, o casal encontra-se a meio do périplo pelo México, que “está a ser uma grande surpresa”. “São vários países num só: tem a parte do deserto, depois toda a parte colonial, tem praias, uma das maiores cidades do mundo e as pessoas são muito calorosas”, descreve Sara. Antes tinham estado seis meses nos EUA.

Começaram a odisseia em Boston, viram o pôr-do-sol no topo do Empire State Building em Nova Iorque e encantaram-se com as largas avenidas de Washington DC. Depois atravessaram o país de um ponta à outra pela ciclovia 76, mais conhecida como TransAmerica, onde começaram verdadeiramente a pedalar. No caminho até à costa ocidental norte-americana, subiram três cadeias montanhosas – Apalaches, Montanhas Rochosas e Cordilheira das Cascatas – provas difíceis de superar mas que deixaram “sempre um sentimento de conquista muito grande” e que encantaram com as “paisagens bonitas”. O Parque Nacional de Yellowstone, com os seus geisers, lagos de cores extravagantes e cascatas, “é quase um sítio do outro mundo” e “foi muito interessante ver as mudanças dos EUA” há medida que avançavam.

O regresso a Portugal está marcado para 2015, de preferência no início do Verão para não ficarem “muito deprimidos com o fim da viagem”. “Acho que o pior de tudo será o pós-viagem, a readaptação a uma vida sedentária”, avança Pedro, esperando momentos de “inquietude” no retorno a casa. Já Sara acredita voltarem “mais cúmplices e unidos”, com um “interesse acrescido em bicicletas”, mais desenrascados, com vontade de viajar e fazer mais exercício e de não voltar a “trabalhar desenfreadamente”.

Para já, esta viagem “deixou de ser um evento extraordinário para passar a ser a rotina diária”. “Arrumamos as coisas de manhã na bicicleta e fazemos os quilómetros do dia, chegamos, procuramos um sítio para dormir e falamos com pessoas”, enumeram. “Já é quase mais um modo de vida diferente do que pura e simplesmente uma viagem”.

Uma longa e extraordinária lua-de-mel que, garantem, não trocavam por nada.
______________________________
Nós de Bina: Site | Facebook 

--%>