Fugas - Viagens

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  • O livro de Tiago Salazar (com olhos de Cristina Branco)
    O livro de Tiago Salazar (com olhos de Cristina Branco) DR

O fado do viajante tem sempre versos de amor e saudade

Por Mara Gonçalves

Ao fim de uma década de jornalismo de viagens, Tiago Salazar trouxe a público o seu diário íntimo de jornadas, feito de reflexões e saudade, quase sempre dirigido à sua mulher (a cantora Cristina Branco). "Hei-de Amar-te Mais" é a garantia deste convite à mais íntima das odisseias. “A viagem é uma dança e não tendo par é como se fosse uma valsa inacabada”, diz à Fugas.

No que pensa um viajante solitário quando se deita na sétima cama diferente daquele mês? O que lhe passa pela cabeça nas horas infinitas de autocarro ou de comboio entre um lugar maravilhoso e o outro? Tiago Salazar sonha com a mulher e os filhos, relembra histórias de infância e contos dos seus autores preferidos.

Durante anos, o jornalista e escritor de viagens foi registando em diário, pelos vários cantos do mundo, memórias, pensamentos e reflexões sobre a vida, o amor, a saudade, a dor por não poder partilhar o que estava a viver com aqueles que mais ama. Fragmentos de um diário escrito em viagem e uma selecção de cartas que trocou com a mulher (a cantora Cristina Branco, cujo olhar se eleva sobre a capa do livro) compõem as páginas de Hei-de Amar-te Mais, a obra que lançou este ano, depois d’ “As Rotas do Mundo”, “A Casa do Mundo”, das “Viagens Sentimentais” ou da série Endereço Desconhecido (RTP).

“É um bocado pôr a nu o que é que acontece nos intervalos daquelas viagens”, diz-nos Tiago. “Esses instantes de derrota também devem ser contados”, porque “isto também sou eu enquanto viajante”: alguém dividido entre o “amor pela profissão, pelo trabalho de escrita e de viagem” e o “amor pelos filhos, pela mulher”. “Às vezes vou a viajar sozinho e em trabalho, começo a pensar nisso e às tantas começo a escrever sobre isso, para os meus filhos, para a minha mulher”, confessa.

Hei-de Amar-te Mais resultou dessa escrita, onde Tiago Salazar adopta um estilo diferente dos livros que publicou anteriormente. Este “está mais próximo de uma literatura do real, da vida como ela é, como eu a vivo”, conta o autor. “Rompo com o viajante humorado, alegre e mostro o viajante que também tem as suas angústias e os seus desconsolos, muitas vezes caindo numa repetição do tema da saudade”. “Mas acho que ninguém que queira ter uma família e ser um viajante ao mesmo tempo escapa a isto”, conclui.

Desde 2007 que o jornalista mantém uma escrita diarística, além das muitas cartas que sempre gostou de escrever e de receber. Em Março de 2012 publicou alguma da correspondência trocada com a mulher na revista “Egoísta”. Páginas de diário e epístolas manuscritas entre Janeiro de 2007 e Março de 2013 estão compiladas neste livro, entre pequenas entradas de diário, poemas, cartas, canções de Vinicius de Moraes e Tom Jobim ou excertos de autores como Clarice Lispector, Tagore, Pablo Neruda e Sophia de Mello Breyner Andersen. Escritos intensos de um “eu”, Tiago, para quase sempre o mesmo “tu”: Cristina, “amor de sempre e para sempre”, escreve.

“A viagem é uma dança e não tendo par é como se fosse uma valsa inacabada, como se houvesse um espaço por preencher”, explica. Hei-de Amar-te Mais é por isso um bailado construído a duas velocidades: uma solitária, de “angústia e por vezes até algum sofrimento”; e outra, a dois, de “êxtase, puro sensualismo e paixão da partilha”. Entre as viagens que fez sozinho - a Istambul, países do leste europeu ou Brasil - e as viagens com Cristina – como Atenas, onde se revelammissivas trocadas num camarim, ou Sarajevo.

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