"Pipas” está de megafone na mão, em frente à Torre dos Clérigos, perante um grupo de turistas. Berra em inglês: “Sabem por que é que esta torre é tão emblemática? Eu também não!”
Desengane-se quem pense que Kombi T7+5 é uma visita guiada pelas ruas mais emblemáticas da cidade Invicta. É antes uma história alucinante pelos sítios “menos conhecidos do Porto e que são mais portuenses do que todos os outros”, refere Rita Lagarto, actriz na companhia Os Bisturi, que durante o ano representa em salas de teatro mas nestas férias preferiu levar os estrangeiros a conhecer as ruas que a viram crescer.
Os jovens actores confessam que correm riscos ao inovarem a forma mais comum de fazer teatro. Rita explica que as pessoas têm receio de entrar numa carrinha com cinco estranhos, que ainda por cima são jovens e não têm nenhuma instituição como rede. “A própria peça também é um bocado para deixar as pessoas na dúvida.”
A viagem vai alternando entre os momentos passados na carrinha pão de forma, com Carlos e os seus suspensórios “no comando”, e os momentos a pé. Numa correria louca atrás dos actores, o público acompanha a história, pedaços das memórias de cinco jovens portuenses — o lugar onde fumaram o primeiro cigarro ou o sítio onde acordaram sem qualquer recordação da noite anterior.
Percorremos as ruas entre a Praça de Lisboa e a Calçada das Virtudes. Descobrimos os encantos da freguesia da Vitória, apreciámos o seu miradouro, que oferece uma panorâmica inesquecível do Porto. Vamos atrás da miúda dos sonhos de Sérgio. Assistimos aos devaneios de Rita, que queria suicidar-se no Jardim da Cordoaria. Andamos em busca do “Pipas”, que nos abandona logo no início do espetáculo. E ficamos ainda a saber que imaginação a mais pode transformar-nos em… bananas.
Esta é uma peça feita por portuenses para presentear quem os visita. “O que é que os turistas vêm cá ver? Vêm ver a nossa cidade, a nossa cultura, os nossos monumentos, mas também nos vêm ver a nós, os portuenses. Acho que isto vai fazer a diferença quando eles voltarem para os seus países e disserem que conheceram a Rita ou o Sérgio”, sugere Rita.
A ideia partiu da actriz. “O Porto tem vindo a receber cada vez mais turistas.” E foi para eles que criaram este espectáculo. A falta de oferta cultural no mês de Agosto, principalmente para os estrangeiros, levou a que a peça fosse falada em inglês.
Segundo a actriz, “as pessoas com um mapa turístico vão aos Clérigos ou à Ribeira, um turista normal não se aventura pelas ruas que não conhece”. “Nós aqui vamos com eles e levamo-los a ver sítios lindíssimos que são ruas só de habitantes, que são o verdadeiro Porto”, explica.
Mariana Costa é portuense, assistiu ao espectáculo no mesmo dia que a Fugas e afirma que esta “é uma maneira de visitar a cidade de uma forma animada”. “Uma das ruas (Travessa do Ferraz) pela qual passámos eu nem conhecia e sou de cá”, refere.
Intervir no teatro e no Porto é o objectivo desta jovem companhia. Os Bisturi nasceram em 2009 e desde o princípio que têm como lema “arriscar mais, intervir mais”. Sérgio Cunha, 23 anos e um dos actores da companhia, refere que ao mostrar as ruas menos populares do Porto estão também a trazer-lhes vida.
Rita conta-nos que os habitantes gostam, já se ambientaram e até brincam quando os actores passam nas ruas. “Eu já tenho um apelido, sou o Faster. Porque numa das cenas o Carlos está sempre a gritar, quando passamos na Rua das Carmelitas, “Sérgio faster, faster!”. Agora já toda a gente grita: ‘Lá vai o Faster’.”
O elenco de Kombi T7+5 é composto por actores profissionais formados pela Academia Contemporânea do Espectáculo. A peça entrou em cena no dia 1 de Agosto e vai prolongar-se até dia 31. A “viagem” custa 12,50 euros por pessoa, 10 euros para grupos de quatro. Há três sessões diárias. A primeira começa às 10h30 da manhã, seguindo-se outra pelas 14h e uma última às 18h.
Texto editado por Sandra Silva Costa