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Praias encantadas ao virar da fronteira

Por Sousa Ribeiro

Por Espanha, de Vigo a Ribadeo, de Llanes a Santander, passando por San Sebastián e descendo para sul, de Alicante até Almería, de Tarifa a Cádiz, uma viagem com o mar, a cultura, a gastronomia e o ócio sempre por perto.

Ligue o motor do carro e ignore qualquer estigma que possa ter em relação aos vizinhos. Esqueça que há uma fronteira e parta à descoberta, sozinho ou em família, de algumas das mais belas praias de Espanha, sem deixar de visitar, durante o dia ou pela noite fora, algumas das cidades ou vilas que lhes são próximas e que proporcionam uma ampla oferta cultural e gastronómica, entre outras. Primeiro destino, a Galiza, o último a magnificente cidade de Cádiz. São dez praias e outros tantos lugares, são estes como poderiam ser outros, mas um carro permite planificar pouco e ver muito.

Playa de Rodas, Vigo

Muitos anos antes de o jornal inglês The Guardian a considerar, em 2007, a melhor praia do mundo, já eu punha os pés nas suas areias finas e brancas e essa imagem, por estar ligada à minha primeira experiência como viandante, continua bem presente na memória. Inexperiente, tanto ou mais do que os amigos que me faziam companhia, decidi montar a tenda numa duna sobranceira à praia e o resultado não podia ser mais desastrado: as luzes das lanternas e as vozes dos polícias retiraram-me do sono horas depois e, sem alternativa perante a ordem, tive como tecto milhares de estrelas.

A Playa de Rodas, com as suas águas cristalinas de cor esmeralda, um quilómetro de comprimento e 60 metros de largura, está localizada no arquipélago das Cíes e liga a ilha de Monteagudo com a de Faro — a outra, apenas acessível de barco privado, é a de San Martiño (é necessária uma licença para atracar). As três integram, tal como as de Ons, Sálvora e Cortegada, o Parque Nacional das Ilhas Atlânticas da Galicia, numa área que se estende por 1195 hectares terrestres e mais de sete mil de superfície marítima.

Para chegar à Playa de Rodas, há que apanhar um barco no porto de Vigo, que o deixará no cais de Rodas ao fim de 40 minutos — a praia fica situada à esquerda mas há outras (num total de nove) que valem a pena a visita, como a nudista de Figueiras, também conhecida como a praia dos Alemães. Durante o período da Semana Santa e no Verão, há vários ferries que efectuam a travessia mas é importante ter em conta que o acesso está limitado a 2200 pessoas por dia, pelo que convém reservar com alguma antecedência. 

Uma vez de regresso a Vigo, uma cidade que nunca dorme e é considerada, com toda a legitimidade, capital do ócio da Galiza, não faltam programas, de movida ou culturais, com que ocupar o tempo. Para começar a noite, nada melhor do que uma errância pelo bairro histórico, entre uma tapa e um copo, ao longo da Plaza da Constitución, da Colegiata, de Cesteiros, da Calle Real, da Teófilo Llorente e da Calle Oliva. Para continuar, nada melhor do que errar por Churruca (nome de uma das ruas principais) para absorver as noites de rock e indie, por ruas como Cervantes, Rogelio Abalde, Irmandiños, Martín Códax, pela Alfonso XIII e em redor da igreja de Santiago de Vigo, como preparação para outras visitas mais culturais quando o sol começar a subir no céu numa cidade que se apresenta também como exemplo de contracultura e capital galega do underground.

Numa urbe com séculos de história, são os monumentos (quase todos eles com uma relação com o mar) mais modernos a encabeçar a lista de preferências dos locais, entre eles o El Sireno e o monumento a Júlio Verne, em perfeita convivência com a Puerta del Atlântico e outras, como La Farola, que traçam a história de Vigo.   

Playa de Castro de Baroña, Corunha

A Playa de Castro de Baroña é muitas vezes incluída entre as mais belas de Espanha mas está mais vocacionada para aventureiros do que para famílias com crianças. Não tendo uma ondulação forte, as suas águas destacam-se por um desnível acentuado e súbito — e por isso desaconselháveis a quem não sabe nadar — e trata-se de um local com grande concentração de iodo, possibilitando um bronzeado rápido. Abrigada sob colinas com mais de 50 metros de altura, a Playa de Castro de Baroña, com uma extensão de 500 metros, está protegida dos fortes ventos e tem a particularidade de permitir um encontro com a história.

À sua direita, encontra-se o Castro de Baroña, da Idade do Ferro e habitado durante muitos anos já depois da ocupação romana. É um dos castros celtas mais bem conservados da Galiza e beneficia de uma localização privilegiada, já que se encontra na entrada da ria de Muros-Noia, com o Monte Louro mesmo em frente.

Para chegar à Playa de Castro de Baroña, deve-se circular pela C-555 até encontrar um desvio próximo de Porto do Son que conduz, em pouco tempo, às duas colinas que protegem a praia, onde, com um pouco de sorte, pode contemplar um espectáculo gratuito de golfinhos executando admiráveis piruetas.

A Corunha é uma cidade agradável para passar umas horas ou uns dias e com uma oferta cultural significante. Pode-se apreciar a sua arte contemporânea, de finais do século XX e com a assinatura de um grupo de arquitectos influenciados pelas correntes vanguardistas internacionais; pode-se observar as galerias da Avenida de la Marina, como um espelho que recebe e reflecte a luz do dia e que deu à Corunha o nome de Cidade de Cristal; pode-se visitar o farol que é Património Mundial da Humanidade desde 2009, museus científicos, Arqueológico, de Arte Sacra, de Belas Artes, de Arte Contemporânea, dos Relógios e Museu Militar, entre muitas outras atracções numa cidade famosa pelas suas noites únicas e intermináveis.

Playa de las Catedrales, Ribadeo

O verdadeiro nome é Playa de Aguas Santas mas todos a conhecem por Playa de las Catedrales devido aos enormes rochedos — alguns com mais de 30 metros de altura — que decoram um cenário de uma beleza infinita. Situada na paróquia de A Devesa, Ribadeo, na província de Lugo, a praia estende-se ao longo de 1400 metros e, durante a maré baixa (exige-se precaução porque as águas sobem rapidamente e mais ainda durante as chamadas marés vivas), utilizando umas escadas, pode-se percorrer de um lado ao outro, errando de forma sonhadora por entre verdadeiras galerias que a natureza se foi encarregando de moldar ao longo dos séculos.

À medida que o dia avança e o sol sobe no céu, as catedrais vão adquirindo diferentes matizes e convidam o viajante a fitá-las numa quietude que contrasta com a força das vagas que se atropelam.

Próximos do parque de estacionamento, há alguns miradouros de onde se pode observar, durante a maré alta, este museu a céu aberto declarado Monumento Natural mas é importante não se aproximar muito da berma dos penhascos: nesta zona da costa galega do mar Cantábrico os ventos sopram com força. 

Para chegar à Playa de las Catedrales, localizada na foz da Ria del Eo, o melhor é utilizar a E-70, passar por Guitiriz, Vilalba e, uma vez em Foz, recorrer à N-634 até a A Devesa ou, em alternativa, à Autovia del Cantábrico até à saída 513.  

Dada a sua proximidade e riqueza cultural, Ribadeo, com pouco mais de dez mil habitantes, é um lugar que justifica uma visita. Beneficiando da importância portuária de Porcillán, cuja principal actividade se centrava, até ao início do século XVIII, no comércio de madeira para Sevilha e Lisboa, este município situado na fronteira entre a Galiza e as Astúrias conheceu tempos de esplendor económico que ainda hoje se reflectem na sua arquitectura e no seu património, a maior parte dele concentrado na vila. Entre eles, os paços de Cedofeita, fundado por Lope García de Cedofeita em finais do século XV e início do século XVI e com um recinto amuralhado, o de Ibáñez, actualmente sede da casa consistorial, e o da Quinta Longa, em Santalla de Vilausende. De carácter religioso, destacam-se a Capela de Atalaia, construída no século XII, bem como o convento de Santa Clara e o santuário das Virtudes, em Arante, enquanto o castelo de San Damián, erguido nos primeiros anos do século XVII, é o melhor exemplo de património militar de Ribadeo, onde também não deve perder a Torre dos Moreno, construída em 1905 e o edifício mais emblemático de uma vila também famosa pelo Diadema de Ribadeo, uma jóia que terá pertencido a uma dama do século V ou VI e que é considerada uma das mais magnificentes da joalharia peninsular da época dos castros.

Playa de Torimbia, Llanes, Astúrias

A localidade de Niembro é o ponto de partida (através de uma estrada asfaltada até uma colina que termina no Cabo Prieto e que serve de parque de estacionamento) para aceder a Torimbia, uma das praias mais formosas da costa de Llanes e já famosa na década de 1960 devido à prática de nudismo. Com 500 metros de longitude e quase 100 de largura, tem a forma quase perfeita de uma concha e integra a Paisagem Protegida da Costa Oriental. Torimbia, localizada num fundo de uma escarpa com mais de 50 metros, é uma praia natural e beneficia da beleza paisagística agreste que a envolve, proporcionando, durante a época de veraneio, serviços que incluem vigilância, sinalização de perigo, um posto da Cruz Vermelha e um pequeno bar.

A escassos 15 minutos de Niembro, está a cidade de Llanes, com um casco antigo declarado Conjunto Histórico-Artístico e, no porto, com alguma relevância entre os séculos XV e XVIII, devido ao comércio de sal e de peixe, a obra do basco Agustin Ibarrola, conhecida como “Os cubos da memória”, um conjunto de pedras de múltiplas cores que protegem a vila do mar e que, ao mesmo tempo, pretendem fundir elementos essenciais da obra do artista com o passado histórico-cultural da vila.

Llanes, cuja história se inicia no século XIII, quando ganha o foro independente no reinado de Afonso IX, conta com uma população que não chega aos cinco mil mas proporciona uma oferta hoteleira que supera as 1200 camas e quase meia centena de restaurantes.

Llanes é particularmente interessante em meados de Agosto, quando tem lugar a Festa de San Roque, ou no final do mês (as festividades prolongam-se por duas semanas), altura em que homenageia a Virgem de Guia (ambas foram declaradas de interesse turístico nacional). Esta são as alturas ideais para o viajante se identificar com o folclore local, especialmente com o Pericote, uma dança ritual de cortejo a que alguns historiadores atribuem uma origem celta e é considerada uma das manifestações culturais da península ibérica — na verdade um baile ao ritmo de tambores e gaitas com trajes típicos das Astúrias e com grupos de três (duas mulheres e um homem).

Playa de Covachos, Santander

A Playa de Covachos, a três quilómetros de Soto la Marina, em Santa Cruz de Bezana, há muito que mantém a sua essência de areal nudista, em parte devido à dificuldade de acesso mas também por força da inexistência de bares ou outras infra-estruturas — não há ruídos de motores de barcos e é perfeita para quem pretende desligar-se do mundo.

Não raras vezes afectada por sucessivos temporais no Inverno, a praia, com 50 metros de comprimento e dez de largura, sofre de igual forma da impetuosidade das marés, responsáveis pela diminuição da quota de areia, o que obriga por vezes os visitantes (a última parte do acesso é pedonal) a um salto superior a dois metros desde o último degrau da escarpa.

Mesmo não sendo beneficiada pela natureza, Covachos permanece como uma das praias mais bonitas do país e com importante valor geológico, com a sua ilhota à qual se chega, na maré baixa, através de uma língua de areia desde a falésia — não deixe de procurar também a cascata de água doce proveniente de mananciais subterrâneos.

Santander, a capital da Cantábria e próxima da Playa de Covachos, é uma cidade que atrai mal se recorta no horizonte, bela no seu conjunto arquitectónico perfeitamente integrado na baía. Entre os seus monumentos mais proeminentes destacam-se a catedral, cujas obras se iniciaram no século XIV, bem como a Plaza Porticada, renovada após um incêndio em 1941; mas também a cidade burguesa, desenvolvida no século XIX como o apoio da corte real, que a colocou no topo das suas preferências como lugar de veraneio e promoveu a construção de estruturas cheias de glamour, como o Palácio de la Magdalena, o Hotel Real e o Gran Casino, situado no final da primeira Playa del Sardiñero e projectado, em 1916, por Eloy Martínez Valle. Na verdade, a grande atracção de Santander passa por um passeio costeiro, um percurso que se pode começar no bairro de pescadores, com os seus bares de peixe e marisco frescos, seguir ao longo do Paseo Pereda antes de desembocar em Puerto Chico e de pisar as areias de praias como a de Los Bikinis, La Magdalena, a enseada do Sardiñero (cinco praias), até chegar ao Cabo Mayor e ao farol castigado pelo vento para melhor se perceber a fúria do mar Cantábrico. 

Playa de la Concha, San Sebastián

“Antes de criar o paraíso, Deus encomendou uma maqueta. Quando a maqueta estava terminada, o Senhor aprovou-a e as obras do Paraíso começaram e terminaram. Mais tarde, os anjos perguntaram ao Senhor o que deviam fazer com a maqueta e Deus ordenou: podeis colocá-la em algum lugar do mar Cantábrico. E esse lugar era San Sebastián. E assim nasceu a nossa cidade.”

Estas palavras são reveladoras do encanto que a Pérola do Cantábrico produzia no escritor José María Mendiola (1929-2003), um filho de uma das mais belas urbes de Espanha, elegante por natureza, cultural, rica como poucas em gastronomia, perfeita para quem goza os prazeres da vida, como já acontecia quando, depois de derrubadas as suas muralhas e uma vez empreendido o caminho da modernidade, recebeu a visita da rainha María Cristina e da sua corte, transformando-se num balneário de moda.

Abraçada por colinas e montanhas pintadas de verde, Donostia é uma cidade romântica, capaz de mudar de humor mais facilmente do que um casal de namorados, vivendo cúmplice de um mar que tem tanto de dócil como de violento. O seu coração está situado na baía de la Concha, uma meia-lua que se estende ao longo de três quilómetros, entre o Monte Igeldo, com a escultura Peine del Viento, de Eduardo Chillida, e o pitoresco porto de pesca, protegido pelo monte Urgull, onde os surfistas enfrentam as ondas e homens e mulheres caminham sobre a areia fina, para cá e para lá, cuidando do físico.

O mar é a referência de San Sebastián mas quando se vira as costas às grades brancas de ferro forjado que são o emblema da cidade os olhos pousam-se em edifícios como o Palácio de Miramar ou o antigo casino, nos dias de hoje ocupado pelo Ayuntamiento. E logo depois, sem pressas, às primeiras horas da tarde ou da noite, nada melhor do que caminhar pela parte antiga, com os seus bares e tavernas, as suas ruas estreitas, ir de pintxos e impregnar-se no mundo do txikiteo, comendo e bebendo segundo a tradição basca.

Entre umas tapas e uns copos de vinho, o apelo à contemplação — e cultural, com a realização de vários festivais, entre eles o de jazz, este mês — é permanente: o Teatro Victoria Eugenia e o Hotel María Cristina, as pontes que cruzam o Urumea, o rio tão dependente do humor do mar, como a de Zurriola, também conhecida como Kursaal, numa alusão ao antigo casino, cujo espaço está agora ocupado pelo Centro Cultural y Auditório. E, de volta ao casco viejo, no istmo do monte Urgull, desponta a igreja de San Vicente, o monumento mais antigo da cidade, a basílica barroca de Santa Maria e o Museu de San Telmo, incursão obrigatória para perceber as raízes ancestrais de um povo apaixonado pela cidade e pelo mar.

Playa de la Granadella, Alicante

A Playa (cala) de la Granadella é uma praia pequena (220 metros) e bonita, com águas cristalinas, considerada um dos tesouros de Jávea, cidade costeira na província de Alicante.

Para chegar à Playa de la Granadella deve procurar a estrada que liga ao Cabo de la Nao, efectuando um desvio dois quilómetros antes do cabo, descobrindo a pouco e pouco e à medida que se vai aproximando os segredos que a praia esconde.

Situada na zona mais meridional de Jávea e com bandeira azul desde 1987, a Playa de la Granadella é ideal para a prática de mergulho e oferece um assinalável conjunto de facilidade (tem uma ocupação alta), como restaurantes, Cruz Vermelha, socorristas, duches, entre outros.

Jávea está a curta distância de Dénia, um porto importante onde pode apanhar um ferry caso pretenda prolongar as suas férias e visitar, por exemplo, Ibiza, a pouco mais de três horas, ou Formentera, mas se optar por seguir ao longo da costa, até às praias da Andaluzia, Alicante constitui uma alternativa a ter em conta para pernoitar.

Fortemente influenciada pelo turismo, devido à proximidade do aeroporto e de um grande número de resorts, é uma cidade vibrante, com boa gastronomia e um ambiente nocturno cuja fama é lendária. Mas Alicante tem outro tipo de ofertas, como o Museu de Arte Contemporânea, abrigado na Casa de la Asegurada (século XVII) e com uma importante colecção de trabalhos de artistas espanhóis, como Dalí, Miró, Chillida, Sempere, Tàpies e Picasso; ou o Castelo de Santa Bárbara (século XVI), com uma panorâmica soberba sobre a cidade e um museu que retrata a história de Alicante, e o Museu de Belas Artes, situado no Palácio de Gravina, uma mansão do século XVIII. 

Playa de Monsul, Almeria

Steven Spielberg, entre tantos outros, famosos ou anónimos, não resistiu à sua beleza e escolheu a Playa de Monsul para rodar algumas cenas de Indiana Jones e a última cruzada. A praia, localizada na área abrangida pelo Parque Natural Cabo da Gata-Níjar (com uma extensão terrestre de 35 mil hectares e uma franja marítima de uma milha de largura, equivalendo a 12 mil hectares), expressa, como nenhuma outra, a origem vulcânica do mesmo, encantando com as suas línguas de lava que o mar e o vento se encarregaram de erodir. Monsul é, com efeito, um dos mais belos diamantes de todo o mar Mediterrâneo e, como praia virgem que é, não oferece ao visitante nada mais do que a sua beleza selvagem, as suas areias finas e as suas águas cristalinas. Bem no centro, projecta-se uma enorme rocha que a natureza, com os seus caprichos, parece ter plantado na areia e que, nos dias de muito calor, serve de refúgio para os banhistas que apreciam um pouco de sombra.

Para chegar a Monsul, o melhor é utilizar o autocarro (na sequência dos protestos dos locais, e como forma de fomentar o uso do transporte público o preço baixou de três para um euro) que sai de San José (cada 30 minutos entre as 9h e as 21h), uma vez que o parque de estacionamento, além de caro (cinco euros), é bastante limitado. Mal a lotação se esgota, há uma barreira que impede a circulação de automóveis; quem preferir correr o risco deve seguir um trilho florestal de quatro quilómetros a partir de San José, onde o estacionamento (na Calle Entrada de San José) é gratuito e onde existe uma paragem de autocarro. Uma caminhada ou a bicicleta também são opções a ter em conta numa praia que recebe milhares de turistas durante o Verão.

Quando o crepúsculo ameaça cair sobre Monsul, dourando tudo à sua volta, percorro os pouco mais de 30 quilómetros que separam a praia de Almeria, cidade andaluza que nos meses de Verão ultrapassa facilmente os 40 graus durante o dia — não por acaso é considerada a mais seca da Europa. Caminhando ao longo do Paseo de Coches, com as suas palmeiras e jardins, dou por mim a cantar enquanto lanço olhares ao Cable Inglés, um cais construído em ferro (iluminado quando a noite tomba sobre a cidade) para facilitar a ligação entre o porto e a estação ferroviária (agora de cara lavada) e o escoamento de minerais provenientes de Alquife.

I am Francisco Vasquez Garcia,

I am welcome in Almeria

We have sin gas and con leche

We have fiesta and feria.

Envergonhado da minha voz, desisto de imitar o inimitável Shane McGowan dos Pogues e parto à descoberta de alguns dos lugares que tratarei de redescobrir na manhã seguinte. Almeria, fundada pelo califa Abd-ar-Rahman III de Córdova no ano 955 d.C., é uma cidade que facilmente cativa, pelas suas gentes mas também pelo seu legado histórico, no qual se inclui a imponente Alcazaba, uma fortaleza medieval erguida no século X mas destruída em 1522 na sequência de um terramoto — e o mesmo destino, nesse ano trágico, teve a catedral, originalmente construída como mesquita e, depois do terramoto, levantada no estilo renascentista, a despeito de manter algumas das suas estruturas defensivas. Antes de deixar Almeria para trás, quando o calor começa a tornar-se insuportável, tempo para uma visita à igreja de Santiago, às ruínas do castelo de San Cristobal e, uma vez vencida uma escadaria que parece eterna, à Chanca, um conjunto de casas escavadas nas rochas mas também um dos bairros mais populares e pitorescos da cidade, com traços ainda da ocupação muçulmana, da Al-mari’yah, a Torre de Vigia.

Playa de Bolonia, Tarifa

Com toda a justiça, a Playa de Bolonia, comprida (quase quatro quilómetros de comprimento), de areias finas e douradas, é considerada uma das mais formosas da Andaluzia e uma das últimas praias virgens do sul da Península Ibérica. Rodeada por um importante conjunto natural e histórico, surpreende, à sua direita, por uma delicada duna formada pela força dos ventos provenientes do estreito e que vai serpenteando entre os pinheiros verdes que completam um quadro de diferentes cores e quase perfeito, servindo de abrigo aos turistas adeptos do nudismo. Declarada Monumento Natural em 2001 e de grande valor ecológico, a duna de Bolonia é altamente móbil e impede o crescimento de espécies vegetais, à excepção do estorno, que ajuda à sua manutenção. 

Com uma escassa ocupação humana na área circundante, Bolonia está bem conservada e proporciona igualmente uma visita às ruínas da antiga cidade romana de Baelo Claudia (deve o nome ao imperador Claudio), erguida sobre um assentamento fenício e descoberta em 1917 por um arqueólogo francês — e muito antes também a deusa egípcia Isis teve o seu templo na cidade.

Tarifa, a cidade do vento, é a porta de entrada e de saída de dois continentes, não distando mais do que 14 quilómetros da costa africana — Tânger situa-se mesmo em frente; mas Tarifa é também palco do encontro entre as águas do Atlântico e do Mediterrâneo e o ponto mais meridional de Espanha: o estreito de Gibraltar.

Perder-se pelas ruas estreitas e labirínticas bordejadas de casas baixas da parte antiga de Tarifa é um prazer renovado a cada instante; e sentir o pulsar da vida numa praça que não se procura ou ao longo de uma alameda que conduz ao mar e cujo som produzido pelas ondas não tarda a magnetizar o viajante — tudo isto oferece uma cidade que se orgulha do seu castelo, testemunha de lutas heróicas entre árabes e cristãos e da fortaleza mandada erguer por Abd al-Rahman III no ano 960 e uma das mais sólidas nesse tempo distante.

Playa de Zahara de los Atunes, Cádiz

Viajando para Norte, de regresso a Portugal, antes de Vejer de la Frontera, circulando ao longo da N-340, de repente-se flecte-se para oeste, na direcção de Zahara de los Atunes, nos dias de hoje já não a pequena aldeia de pescadores com os seus barquinhos de madeira sobre as areias da praia como num passado que vai ficando cada vez mais distante. Vítima da fama de praia paradisíaca, Zahara de los Atunes foi perdendo grande parte do seu carácter e muita da sua quietude e da sua tradição pesqueira mas, a despeito de estar incluída em todo e qualquer mapa turístico, continua a ser uma das praias mais encantadoras da Andaluzia, com as suas casas trepando as colinas, as suas areias finas e um odor a sardinhas assadas ao qual é difícil de resistir.

Considerada a tacita de plata, devido à cor das suas águas ao entardecer, Cádiz, mais a norte e tantas vezes comparada a Havana, é uma cidade que deve ser calcorreada com serenidade, perscrutando as suas ruas e a sua catedral, vivendo as suas festas, escutando as músicas que os ciganos eternizaram, o flamenco. E logo se regressa à sua baía, imaginando o passado, a tradição marítima de Cádiz, a construção de barcos, o Vaporcito del Puerto, utilizado para chegar ao Puerto de Santa Maria e que continua tão vivo na memória da etnia cigana.

E é no Puerto de Santa Maria que quase tudo acontece, com os seus bares e restaurantes com fama de servirem o melhor marisco de Cádiz, pelo seu casario, palácios, casas senhoriais e edifícios religiosos, como a Casa de Las Cadenas, de los Frailes, a igreja Mayor de Nuestra Señora de los Milagros, a de San Francisco e o Mosteiro de San Miguel, agora convertido em hotel — e também pela histórica praça de touros e o Castelo de San Marcos.

O sol mergulha no mar. De Espanha, nem bons ventos, nem bons casamentos mas praias capazes de prender mesmo aqueles que se sentem pouco atraídos pelos vizinhos, pela sua paisagem natural, pela sua gastronomia, pela sua rica história.

É tempo de regressar a Portugal.  

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