Para lá da Alcáçova, da Casa de Mértola e da Oficina de Tecelagem, o museu prolonga-se noutras divisões (ao todo, são 13): o Castelo, a Basílica Paleocristã, a Casa Romana, o Núcleo de Arte Sacra, a Ermida e a Necrópole de São Sebastião, a Forja do Ferreiro, o Núcleo de Arte Islâmica, a Casa do Mineiro, a Alcaria dos Javazes e o Mosteiro (os três últimos já fora da vila). Ainda este ano, abrirá o novo Núcleo Museológico da Igreja Matriz, e há ainda que referir o projecto particular do Hotel Museu, inaugurado em 2011, e uma surpresa para quem julgava estar a construir uma simples unidade de alojamento e acabou por encontrar um bairro islâmico e um armazém romano nas fundações. Conclusão: a obra foi adaptada e hoje o hotel pode ser visitado. Como nota Lígia Rafael, “em cada obra que se começa em Mértola, aparece sempre trabalho para os arqueólogos”.
Por estas e outras razões, a vila histórica apresentou a candidatura à UNESCO a Património da Humanidade e está na fase final de avaliação pela Comissão Europeia do estatuto de Marca de Património Europeu, títulos que podem contribuir para o aumento do já significativo número de turistas. “Numa vila com 1200 habitantes, recebemos 30 mil visitantes todos os anos”, concretiza a responsável do gabinete de Turismo da autarquia.
O homem do cozido
“Vêm pessoas de propósito de Lisboa comer o nosso cozido [de grão, à alentejana] e também temos aqueles clientes habituais, que vêm a Mértola uma vez por ano, em Agosto, e nunca deixam de vir aqui.” Manuel Inácio di-lo e nós acreditamos. A avaliar pela esplanada sempre cheia, onde (pelo menos hoje) passa música árabe, o restaurante regional A Esquina é um sucesso de vendas, principalmente durante o Verão. Sete dias por semana, cá circulam caçoulas de ensopado de borrego, cozido de grão, migas com porco preto e sopa de cação, entre outras iguarias.
Mértola tem sido apontada como um exemplo de sucesso no que diz respeito ao turismo, por isso, o restaurante de Manuel Inácio, onde constam pratos em cerâmica e cabeças de javali na parede, não se pode queixar a esse nível. Depois do forte êxodo rural que reduziu a população a metade, nos anos de 1970, o trabalho fomentado por Cláudio Torres – nome lembrado por cada boca da vila, fundador do Campo Arqueológico de Mértola e Prémio Pessoa em 1991 –, levou a localidade a tornar-se um pólo de investigação sobre o mundo mediterrânico e um núcleo de interesse dos mais variados públicos.
“No 25 de Abril, Mértola era um dos concelhos mais pobres da Europa, mas tinha um vastíssimo património islâmico, natural [com o Parque Natural do Guadiana] e do saber fazer, então, acabou por encontrar um filão para o seu processo de desenvolvimento”, enquadra Jorge Revez, presidente da Associação de Defesa do Património de Mértola (ADPM). A ideia nunca foi atrair turistas mas potencializar o que de bom brota e se faz na terra, para proveito local, acima de tudo, “num modelo que seja aceite por quem cá vive”.
O figo-da-índia, o medronho, as plantas tintureiras, as ervas aromáticas e medicinais são alguns dos recursos emergentes da agricultura biológica local, que se vão encontrando espalhados pelo comércio tradicional da vila. Jorge Revez sabe que o investimento neste campo não chega para “estancar a perda de população”, no entanto, ela “já é muito menor do que nos concelhos à volta”, encaixados nesse eixo difícil e solitário que é o Alentejo nas barbas de Espanha. Já se exportam chás – da erva-príncipe à erva-ursa, o espectro é largo – que fizeram (juntamente com outros produtos) com que Mértola fosse o primeiro concelho a representar Portugal na principal feira dedicadas a produtos orgânicos do mundo, a BioFach, na Alemanha.