“Se por acaso um viajante me vier perguntar em Londres por outra cidade inglesa, «além de Londres», parece sempre que o mando ir tomar banho. «Bath», digo-lhe, que em inglês quer dizer banho. Bath é também o nome da cidade mais encantadora de Inglaterra e se não digo Edimburgo, como (Jorge Luís) Borges, é porque a cidade de (Robert Louis) Stevenson sempre esteve na Escócia.”
As palavras não são minhas, pertencem ao cubano Guillermo Cabrera Infante e foram retiradas, com a devida vénia à D. Quixote e ao escritor que é justamente considerado uma das grandes personalidades da literatura em língua espanhola, de O livro das cidades.
- Adoro viver em Bath. É uma cidade maravilhosa, cheia de história e de cultura.
A frase também não é da minha autoria, tem de ser creditada a Faith Toynbee, director de marketing das termas de Bath, no cargo há apenas um ano mas o tempo suficiente para se render aos encantos desta urbe com poucos habitantes (cerca de 90 mil) e muitos turistas (nenhuma outra, à excepção de Veneza, recebe tantos por residente).
- De acordo com os dados de que disponho, o número de visitantes por ano ronda os seis milhões. Nos meses de Verão, Bath é, de facto, muito frequentada pelos turistas. Mas prefiro ver um lado positivo nesta procura: é importante para o negócio e para as atracções turísticas, enfatiza ainda Faith Toynbee.
Esta é realidade que Bath enfrenta todos os anos. Mas a ficção ou a lenda também cabem na história desta cidade que é um verdadeiro ícone da arquitectura inglesa e um símbolo do estilo georgiano.
Antes ainda, talvez Guillermo Cabrera Infante possa dar o seu contributo, em palavras e credibilidade, para o que virá a seguir.
“A fundação da própria cidade é atribuída a um grupo de reis ingleses, cujos nomes ressoam como palíndromos: Bladud e Lud Hudibras e a esse rei que pareceu nunca tomar banho, Lear, que, na realidade, foi curado de uma erupção cutânea (mas não da sua loucura senil) quando se meteu nos pântanos borbulhantes de calor não de espuma.”
Consta que era uma manhã de muito frio, no Inverno, fustigada por um vento cortante como uma lâmina, um céu coberto de um cinzento carregado, sem espaço para mais nuvens. Não existem evidências mas poderia ser o ano 853 a. C., quando Bladud, após contrair lepra durante os seus tempos de estudante em Atenas, decidiu regressar a casa, sabendo que, na sua qualidade de príncipe imperfeito, nunca poderia ser o herdeiro da coroa.
Sem dar qualquer explicação, Bladud abandonou de imediato o palácio real para se tornar um guardador de porcos num lugar do reino até então pouco explorado por viajantes. Pai do infortunado King Lear, imortalizado por William Shakespeare, o príncipe desencantado terá rumado ao vale do rio Avon, numa área hoje conhecida como Keynsham, dez séculos antes de os romanos aqui construírem casas e mais de 1500 anos antes de os saxões chegarem a Bath.
À procura de bolotas, Bladud conduziu a vara de porcos por um território para ele desconhecido, tendo cruzado o rio Avon a norte de Saltford, numa zona onde as águas eram pouco profundas e cuja toponímia actual não deixa grandes dúvidas quanto ao peso da lenda: Swineford, o vau dos porcos.
Nessa manhã de Inverno, a vara de porcos, afectada também pela lepra e indiferente à ameaça de chuva, chafurdava por entre o barro quente com um deleite de difícil compreensão para um ser humano. Observando os animais brincando, Bladud chegou à conclusão de que estes, com um aspecto lustroso, respiravam saúde. Num instante, pensou que também poderia beneficiar de uma imersão nesse lodo aparentemente milagroso — e assim encontrou a cura para a sua doença, regressando ao palácio para suceder ao pai no trono. Grato, Bladud não perdeu tempo e logo mandou fundar uma cidade e construir uns banhos em redor daquela fonte termal para que outros pudessem debelar as suas enfermidades, dedicando esses poderes curativos à deusa celta Sul.
A Aquae Sulis
Muitos anos mais tarde, já depois do nascimento de Cristo, chegaram os romanos e logo fundaram a cidade de Aquae Sulis, as Águas de Sul, erguendo, ao mesmo tempo, um extenso complexo termal para tirarem partido da temperatura natural (46 graus) das águas que brotavam das suas três fontes, bem como um templo dedicado à deusa Sulis-Minerva, a pouco metros de onde se eleva a magnificente abadia.
- Aprecio especialmente a piscina no telhado. As termas são maravilhosas para relaxar.
Faith Toynbee refere-se à piscina termal da Thermae Bath Spa, uma nova e controversa construção cúbica, de pedra e vidro, acrescentada aos banhos romanos, com uma panorâmica soberba sobre a cidade e uma atmosfera serena que o repicar dos sinos da torre da abadia gótica torna ainda mais mágica. Inicialmente com abertura prevista para 2002 e um orçamento (em 1996) de quase 13 milhões de libras, o projecto, com a assinatura de Nicholas Grimshaw, conceituado arquitecto responsável pela estação ferroviária de Waterloo, foi sendo sucessivamente adiado devido às várias disputas legais com os empreiteiros.
Em Agosto de 2003, para celebrar o renascimento da cultura termal na cidade, teve lugar em frente ao Crescent Royal um concerto gratuito dos Três Tenores, José Carreras, Plácido Domingo e Luciano Pavarotti, ao qual assistiram sete mil pessoas (e outras 20 mil através de ecrãs gigantes colocados no Royal Victoria Park). Mas foram necessários mais três anos para se proceder à abertura oficial das termas, um atraso com consequências para o bolso dos contribuintes, já que o custo total mais do que triplicou (45 milhões de libras) em relação ao orçamento inicial. Aos poucos, o investimento dá sinais de retorno financeiro: segundo um estudo realizado no ano passado, as termas atraíram 260 mil pessoas extra por ano, contribuindo com qualquer coisa como 15 milhões de libras para a economia da cidade.
Bath é o único lugar em todo o país onde, imitando celtas e romanos num outro tempo, se pode desfrutar de um banho em águas quentes e ricas em minerais. Enquanto as nascentes Hetling e Cross abastecem as termas modernas, a King’s Spring fornece água (os três mananciais produzem cerca de 1,5 milhões de litros por dia) aos antigos banhos romanos.
Prefiro passear, agora que a manhã ameaça extinguir-se, por estes, pelo seu coração, o Great Bath, descer até ao nível das águas de um verde opaco onde, desde 1978, após a morte de uma jovem de 14 anos de uma forma de meningite (alegadamente depois de um banho em Bath), ninguém mais foi autorizado a mergulhar — e Bath deixou de ser um banho para se tornar num museu pelo qual sinto prazer em demorar-me, errando ao longo das suas passagens e aposentos situados abaixo do nível das ruas, ao encontro de outras piscinas mais pequenas e do hipocausto, da King’s Bath, construída no século XII em redor da nascente original e das ruínas do templo de Sulis-Minerva, sob o Pump Room.
Esta última, a sala da bomba, era o aposento onde estava colocado o mecanismo que bombeava a água para os banhos, hoje transformado num luxuoso restaurante da moderna cozinha inglesa onde se pode ouvir o Pump Room Trio (que na verdade são quatro, embora dois deles actuem alternadamente) ou, estranhamente, tomar um chá que, ao contrário do que seria suposto em Inglaterra, é servido apenas até as cinco e nunca depois das cinco.
No átrio, junto às bilheteiras, observo as longas filas que vão para lá da porta principal e se estendem pela rua. Fito a abadia com um prazer renovado e observo, aqui e ali, as estátuas humanas, uma com uma bicicleta, ambos de um branco imaculado, atraindo as atenções dos turistas como os porcos atraíam o olhar de Bladud, o príncipe desencantado.
A abadia de Bath, banhada pelo sol a meio da manhã, encanta-me. Dirijo-me a um dos bancos da praça, parcialmente ocupado por um casal que me sorri, uma expressão que interpreto como sendo a autorização para lhes fazer companhia.
Neste lugar, pouco tempo depois da partida dos romanos, terão existido (não há evidências arqueológicas), no final do século X, um convento e um mosteiro mandados levantar pelos anglo-saxões. E — uma vez mais sem que os documentos históricos possam comprovar a veracidade dos factos — um outro lugar de culto, como parte do mosteiro beneditino, construído mais de dois séculos antes numa cidade onde, em 973 (mas reinando já desde 959), foi coroado Edgar, o primeiro soberano de uma Inglaterra acabada de se unificar. Em 1973, para assinalar os 1000 anos sobre a coroação, Bath recebeu a visita da rainha Isabel II, uma presença que uma pedra, no chão da abadia, comemora e recorda a todos os turistas.
É escocês, o casal que, como eu, planta os olhos na abadia. Mas o olhar deles parece envolto numa certa nostalgia.
Em finais do século X, John of Tours, bispo de Bath, deu início a um programa ambicioso de construção que incluía planos para mais edifícios monásticos, um palácio e uma catedral. Por altura da sua morte, em 1122, já algumas das paredes da catedral normanda haviam sido erguidas mas a parte final dos trabalhos foi da responsabilidade do seu sucessor, Robert of Lewes — uma vez mais sem certezas, tudo indica que foi completada e consagrada no início da década de 60 do século XII.
Aquela que foi a última grande igreja a ser construída em Inglaterra durante o período medieval, a mesma que agora tenho à minha frente, começou a ser levantada no derradeiro ano do século XV e prepara-se para celebrar, em 2016, os seus 400 anos (apenas foi concluída em 1616). Do lado sul da abadia, umas escadas dão acesso ao pequeno Heritage Vaults Museum, que explora a história por vezes turbulenta (em 1539, os monges tiveram de se render à coroa na sequência da Dissolução dos Mosteiros ordenada pelo rei Henrique VIII) da igreja, exibindo, também artefactos arqueológicos e um estranho modelo do século X do monge Aelfric, vestido com o tradicional hábito preto beneditino.
Mas é no exterior, na fachada ocidental, que se concentra a maior parte dos olhares, nas escadas por onde sobem e descem os anjos que, de acordo com a lenda, terão inspirado, depois de um sonho, o bispo Oliver King.
Durante a Idade Média, Bath transformou-se num centro eclesiástico e numa cidade focada no comércio da lã — e foi necessário aguardar pelo início do século XVIII para a ver revitalizada e de novo na moda pelos mesmos motivos (os banhos) que a tornaram apelativa no passado. Por esse tempo, em 1692 e, mais tarde, em 1702, chegava a Bath, com todo o seu empreendedorismo e em visita real, a rainha Anne, provavelmente ignorando que acabava de inaugurar a idade de ouro da cidade.
Não resisto a voltar a um capítulo das páginas de O Livro das Cidades: “Quando a rainha Anne passou um mês em Bath trouxe com ela a nobreza como cauda. Entre esta, confundido mas não confuso, veio Beau Nash, protegido por um capitão de terra dentro que muito rapidamente se fez matar num duelo por um tira-me para lá essas fichas (Em inglês: «a chip on his shoulder.») Foi assim que Nash se tornou mestre-de-cerimónias de Bath. De imediato, com botas e mandiles. Mas não mandriles: os ingleses ainda cuspiam no chão e mijavam em qualquer esquina.”
Talvez o cubano nascido em Gibara, com o seu humor que não é compreendido por todos, não se explique bem, na presunção, tão característica de qualquer escritor, de que o leitor tudo assimila. Richard “Beau” Nash era um jogador profissional, extrovertido e elegante, que abateu, nesse duelo, o mestre-de-cerimónias da cidade e, vangloriando-se ainda da sua vitória, logo se autoproclamou rei de Bath antes de se insinuar pelas ruas, de proibir o porte de armas e de sentenciar um código de conduta.
E logo, impaciente, entrou em cena Ralph Allen, um empresário que nada mais conhecia do que o êxito, que havia organizado o serviço dos correios britânico e que sonhava, não se sabe desde quando, em edificar uma cidade que o mundo teria de considerar um portento. Dando asas a essa ambição sem limites, Ralph Allen adquiriu, em 1727, umas pedreiras próximas de Bath, de uma cor que fazia lembrar o mel, com pedras fáceis de manejar e ainda mais fáceis de transportar.
Precisamente no mesmo ano, chegou a Bath o último elemento da tríade que vivia em perfeita harmonia, o arquitecto místico, John Wood, fascinado pelo passado greco-romano e pela obra de Andreas Palladio, outro arquitecto veneziano de finais do Renascimento.
A combinação revelou-se, no mínimo, perfeita e tão sólida como essas pedras que parecem pesar sobre os ombros dos turistas. Ralph Allen proporcionava os materiais, James Wood os projectos e Richard “Beau” Nash assumia a área comercial.
Bath tornava-se numa espécie de magnetismo, um íman que não parava de seduzir a aristocracia inglesa (mais tarde a classe média) e a cidade transformava-se, para cima e para baixo, para um lado e para o outro, umas vezes por obra e graça do Wood pai, outras pela inspiração do filho, num lugar onde cabia um urbanismo sem paralelo, tão compacto e tão unitário, com os seus edifícios exalando uma magnificência que os conhecedores da época logo comparavam a outros de uma Roma clássica ou representativos de uma arquitectura neoclássica.
Daqui se depreende que a soberana não pode, para sermos justos, garantir o exclusivo dessa viragem histórica, exacerbando Bath como cidade da moda. Ralph Allen e o já citado Richard “Beau” Nash, um dandy, colocaram a cidade nos píncaros da fama, atraindo a sociedade que não se contenta com pouco e não se satisfaz com muito. Ralph Allen desenvolveu um esforço notável para tornar rentáveis as pedreiras de Coombe Down, construiu o Prior Park (a menos de dois quilómetros, para sul, do centro da cidade) e concedeu emprego e liberdade aos dois John Wood para criarem alguns dos mais proeminentes edifícios de Bath.
Ao mais velho, entre outras construções, como o St. John’s Hospital, Queen Square, Royal Mineral Water Hospital, North e South Parades, fica a dever-se o Circus, um anel de 30 casas simétricas divididas por três terraços onde viveram, em diferentes épocas (conforme se pode ler em placas afixadas nas fachadas), famosos como Thomas Gainsborough, o major-general Robert Clive, também conhecido como Clive da Índia (inspirou um filme em 1935 com título homónimo e realizado por Richard Boleslawski) e David Livingstone.
Ao mais novo dos Wood, o edifício mais glorioso de todos, uma meia-lua que permanece como um dos melhores exemplos da arte da arquitectura, o Royal Crescent, onde agora me sento, aquecido pelos raios tépidos do sol, ora observando o terraço semicircular de casas majestosas, ora esta eternidade de espaço (relva) que se perfila à minha frente, onde jovens casais se entregam ao amor com a mesma paixão com que John Wood se dedicava à arquitectura.
Construído entre 1767 e 1775 (sete anos antes da morte do homem que o desenhou), o Royal Crescent era um território ocupado, nesses finais do século XVIII, pela alta sociedade, alugando as casas com vista para o verdejante Royal Victoria Park.
Bath rivalizava, por essa altura, com Londres, com invernos cheios de entretenimento que tanto seduziam a população da capital, atraída pelos ecos que chegavam desse primeiro resort de frivolidade e moda. Com as suas salas de jogos, Bath estava para o século XVIII como Las Vegas está para o século XXI. E Bath continuou a prosperar, atraindo monarcas e aristocratas, escritores, actores, jogadores de râguebi (a equipa local é uma das mais fortes em todo o país), futebolistas e estrelas de Hollywood, tantos famosos que se misturavam com turistas anónimos.
Mais famosa é a relação que Bath sempre teve com escritores. O escocês Tobias Smollett, tão apreciado por Charles Dickens, como admite em David Copperfield, viveu durante uns tempos na cidade; o próprio Dickens visitou Bath em diversas ocasiões, na qualidade de repórter parlamentar ou apenas para rever um dos seus melhores amigos, Walter Savage Landor, no número 35 da St. James Square (onde se pode ver uma placa em bronze imortalizando o momento), sem esquecer que, em Os Cadernos de Pickwick, a vida de Bath é satirizada pelo grande escritor (Dowler e Winkle envolvem-se numa perseguição hilariante à volta do Royal Crescent); Henry Fielding, autor de Tom Jones, residiu em Twerton, um subúrbio de Bath, onde terá escrito pelo menos uma parte da sua famosa novela antes de viajar, na companhia da mulher, para Lisboa — e na capital portuguesa, com apenas 47 anos e dois meses após ter desembarcado, veio a falecer.
Mas nenhum destes escritores está tão intimamente ligado a Bath como Jane Austen, a autora de Mansfield Park, Orgulho e Preconceito e Emma. Contra a sua vontade, Jane Austen viveu na cidade — depois de a visitar em diferentes ocasiões — durante cinco anos, um período negro da sua vida (por ter deixado para trás um namorado e devido à morte do pai) mas tão colorido e inspirador para as suas novelas. Depois de terem compartilhado um tecto com familiares, os Austen alugaram uma casa no número 4 da Sydney Place, mais tarde viveram em Green Park Buildings (não são mais do que uma memória) e, com a morte do progenitor e sem a pensão que este recebia, foram obrigados a nova mudança, agora para a Gay Street, no número 25, bem próximo da casa (similar) onde funciona (número 40) o Jane Austen Centre, um museu que explora as ligações da escritora à cidade e com exibições de costumes da época e quadros contemporâneos de Bath.
Durante a II Guerra Mundial, Bath foi fortemente atingida pela Luftwaffe, durante os famosos raides Baedeker, com o intuito de destruir cidades históricas e, como complemento, de arrasar a moral britânica. Bath sofreu, de uma e de outra forma: algumas casas no Royal Crescent e no Circus sofreram danos consideráveis e os Assembly Rooms foram bombardeados e mais tarde restaurados. Era nestes últimos, desenhados pelo Wood mais novo e inaugurados em 1771, que se reunia a nata da sociedade, para dançar, jogar cartas ou ouvir música de câmara. Dispondo de tempo, não deixe de visitar a sala de jogos, de chá e o soberbo salão de bailes iluminado por candeeiros originais do século XVIII (durante a II Guerra Mundial foram retirados e guardados em segurança).
Dois séculos depois de uma tríade famosa ter colocado Bath no mapa do mundo, a UNESCO teve dificuldade, em 1987, em não abarcar toda a cidade na sua lista de Património Mundial da Humanidade — mas não teve coragem, nem argumentos, para deixar de fora cinco mil edifícios históricos.
Continuo sentado em frente à abadia, desfrutando do bom tempo e da panorâmica, sempre ao lado do casal de escoceses que cada vez se revela mais simpático.
- Faz tanto tempo. Mas parece que foi ontem. Foi em Bath, há mais de 40 anos, que passámos a nossa noite de lua-de-mel. Olhando a cidade, não se pode dizer que mudou muita coisa. É a Bath que conhecemos por essa altura, um museu ao ar-livre.
Tom e Jean Baty caminham, a meio da tarde, para o museu das termas, deixando-me sozinho e entregue aos meus pensamentos naquele banco que parece agora mais frio do que nunca. Eu não sei o que procuro com o meu olhar que vai abarcando a abadia mas sinto que o olhar deles e os seus passos procuram um passado cada vez mais distante. Mas muito menos distante do que o passado desta cidade que vive no presente sem poder hipotecar um tempo que parece morar tão longe.
“Bah Bath exclamam alguns, que são a maioria, que não sabem que Bath é a décima maravilha: uma cidade que é um museu para viver.”
A frase não é minha, provavelmente nunca foi lida ou escutada pelo casal de escoceses, é de Guillermo Cabrera Infante, como a que se segue:
“Assim é Bath com os seus filhos mesmo que não tenham nascido em Bath.”
Se George Orwell fosse um deles não teria encontrado melhor cenário para o título de uma das suas obras. Porque Bath, sendo um banho, simboliza o triunfo dos porcos.
Guia prático
Como ir
Situada no sudoeste de Inglaterra, Bath está apenas a uma hora e meia de comboio desde a estação de London Paddington ou, para quem utilize veículo próprio ou carro alugado, a poucos minutos das auto-estradas M4 e M5. Mas a opção mais rápida passa por uma ligação aérea à cidade de Bristol, localizada a escassos 30 quilómetros de Bath – a easyJet voa desde Lisboa por uma tarifa de ida e volta a rondar os 230 euros, um preço que pode sofrer uma redução drástica se reservar com alguns meses de antecedência ou beneficiar das promoções daquela companhia aérea. Desde o aeroporto de Bristol há vários autocarros por dia a efectuar a ligação a Bath ou, em alternativa, um serviço expresso até à estação de Temple Meads e, daqui, de comboio até Bath.
Quando ir
A melhor altura para viajar no Reino Unido é durante os meses de Verão, especialmente entre Julho e Agosto, período em que se regista também uma maior afluência de turistas. Na altura da Páscoa, Maio, Setembro e Outubro são outras hipóteses a considerar. Estes últimos oferecem por vezes muitos dias de sol — o chamado Verão indiano.
Onde comer
Um dos melhores lugares, com pratos bem apresentados e preços acessíveis (almoços entre seis e dez libras e jantares entre 12 e 15), é o Circus, na Brock Street, 34, a meia dúzia de passos do Royal Crescent, podendo optar por comer no rés-do-chão ou na mais íntima sala de refeições situada na cave. Outro espaço, em Bath, de onde não sairá desiludido com a experiência gastronómica, é o Marlborough Tavern, na Marlborough Buildings, 35, famoso pelos sabores ricos e rústicos com a assinatura do conceituado chef Richard Whiting. O Marloborough está aberto para almoços e jantares e pratica preços entre as 12 e as 17 libras. Para os adeptos de comida vegetariana há um restaurante imperdível na cidade — o Demuth’s, na North Parade Passage, 2, há mais de 20 anos a confeccionar pratos deliciosos (entre as 10 e as 15 libras) e focados na criatividade permanente.
Onde dormir
Bath é uma cidade muito popular durante o pico do Verão e essa tendência acentua-se ainda mais durante os fins-de-semana — e é acompanhada por uma subida astronómica dos preços dos hotéis. Caso tenha dificuldade em arranjar um quarto pode sempre tentar o posto de turismo, onde, mediante o pagamento de três libras, tudo farão para encontrar uma solução à medida do seu orçamento. Mas o ideal, se pensar visitar Bath, é reservar com grande antecedência através da Internet. Para quem não dispensa o luxo, a melhor opção é, de longe, o Queensberry Hotel, na Russel Street, 4, com tarifas entre as 95 e as 300 libras para um single e entre 105 e 425 para uma ocupação dupla. Quatro casas clássicas georgianas foram transformadas num hotel-boutique que abriga distintos quartos, uns modernos, outros zen, outros elegantes e todos eles com grande requinte. Bem mais barato é a Appletree Guest House, em Pulteney Gardens, 7, um Bed & Breakfast com uma atmosfera familiar e preços entre 55 e 66 libras para um single, entre 85 e 110 para um duplo e entre 120 e 132 se optar por um quarto familiar. Por último, a alternativa mais em conta passa pelo Bath YHA, não muito distante do centro (pode caminhar ou recorrer ao autocarro nº 18), numa bonita mansão e com quartos modernos – por um dormitório espere pagar 14 libras e por um duplo (neste caso convém reservar atempadamente) entre as 35 e as 40 libras.
A visitar
No rés-do-chão dos Assembly Rooms, não deixe de dar uma espreitadela ao Fashion Museum (é considerado um dos melhores do mundo), com uma exposição de trajes do século XVI até finais do século XX. Igualmente interessante é Building of Bath Museum, com uma mostra que retrata a evolução da cidade em termos arquitectónicos. Aberto todos os dias, o Holburne Museum apresenta, entre 24 de Outubro e 24 de Janeiro de 2016, uma importante colecção de objectos de arte em ouro, desde a Idade do Bronze até ao século XX. Todos os que pretenderem prestar o seu tributo a Bladud devem dirigir-se aos Parade Gardens, os jardins que acolhem uma estátua do rei (há uma outra, mais antiga, nas termas romanas), esculpida em 1859 por Pieroni. Ao lado de Bladud, como não podia deixar de ser, um porco, também em pedra, acrescentado recentemente à estátua.
Bath é uma cidade com múltiplos festivais ao longo do ano. Se a visitar até final de 2015 ainda vai a tempo de assistir a alguns dos eventos. Até final de Outubro tem o Great Bath Feast, um festival gastronómico; entre 24 de Outubro e 1 de Novembro tem o Heritage Open Week at Bath & North East, dedicado às crianças e famílias (a gastronomia também está presente); no dia 7 de Novembro, o já célebre e anual fogo-de-artifício no centro da cidade; entre 13 e 21 de Novembro, o Mozart Bathfest, celebrando a música do compositor austríaco; finalmente, entre 3 e 13 de Dezembro, o festival de cinema.
Se desejar fazer um passeio de barco, subindo e descendo o rio Avon, há vários operadores no cais próximo da Pulteney Bridge
Informações
Os cidadãos portugueses apenas necessitam de um documento de identificação (passaporte, bilhete de identidade ou cartão do cidadão) para visitar o Reino Unido. Uma libra esterlina corresponde a (mais ou menos) 1,35 euros. Um adaptador de corrente eléctrica é, seguramente, um dos objectos mais úteis que pode transportar na mala.
Os banhos romanos (www.romanbaths.co.uk), na Abbey Churchyard, estão abertos ao público das 9h às 20h em Julho e Agosto, entre Março e Outubro apenas até às 18h e de Novembro a Fevereiro funcionam entre as 9h30 e as 17h30 — a última admissão é uma hora antes do encerramento.
O complexo Thermae Bath Spa está aberto durante todo o ano (excepto dias 25 e 26 de Dezembro e 1 de Janeiro) — a New Royal Bath entre as 9h e as 21h30 e a Cross Bath (num edifício separado) entre as 10h e as 20h.