- Como se chama?
- Não é importante.
- Há quantos anos vive no mosteiro?
- Não é significativo.
- Onde nasceu?
- Não é relevante.
A vida decorre em voz baixa, as freiras falam através de murmúrios, sussuram umas com as outras quando se cruzam, tornando as conversas inaudíveis. Sentada na pequena loja de madeira onde se vendem ícones, a irmã, exibindo um sorriso dócil num rosto pálido, desvaloriza as questões pessoais, porque as acha superficiais, mas revela total abertura quando a conversa, às primeiras horas de uma manhã fresca, de uma brisa suave e de um céu manchado com poucas nuvens, se torna mais abrangente.
- Mais importante do que a minha identidade, a minha existência ou as minhas origens, é o que sente o meu coração e pensar no bem dos outros e não em mim – e só assim, com a ajuda de Deus, me sinto plenamente realizada.
Escuto-a com um interesse renovado, emoldurado pela janela:
- A primeira irmã que entrou no mosteiro, em 1991, logo depois da revolução, tinha 14 anos. Mas já não está aqui. Actualmente há dez freiras a viver permanentemente em Humor.
Duas delas, incluindo Ana, com quem falara uns minutos antes, ocupam-se agora dos jardins, das roseiras que não tardarão a emprestar ao lugar ainda maior encanto, num silêncio apaziaguador mas com uma dinâmica que não era possível até ao colapso do comunismo, uma época marcada pela perseguição à religião — tão ou mais evidente do que quando o Império Áustro-Húngaro anexou uma região que haveria de permanecer sob o jugo dos Habsburgos até 1918 e cuja toponímia, de origem eslava, se deve, ainda hoje, aos invasores.
Bucovina significa o país das faias mas representa também, a despeito da serenidade que abraça o viandante, uma história turbulenta, de frequentes ocupações e constantes divisões, disputada por romanos e otomanos, por tártaros e mongóis. A todas estas tentativas resistiram, praticamente indemnes ao galopar dos séculos, os mosteiros, as igrejas e as pinturas naquela que é uma das regiões mais belas da Europa, um quadro de prados verdes, de faias e de abetos acolhido aos pés dos Cárpatos e onde o tempo parece teimar em deter-se.
A manhã ainda revelava timidez quando cheguei a Humor, a escassos seis quilómetros de Gura Humorului, uma cidade que cresceu graças à queda do regime de Nicolae Ceausescu e ao consequente incremento da indústria do turismo, fortemente associada aos mosteiros, integrados, alguns deles, na lista de Património Mundial da UNESCO desde 1993. Mal se transpõe a porta, uma espécie de magnetismo atrai, de forma instantânea, o viajante, da mesma maneira que uma história aos quadradrinhos seduz uma criança — naquelas paredes, encimadas por tectos em forma de chapéu de abas largas, estão retratadas cenas da vida religiosa e, quadro a quadro, obrigando os olhos a não se desviarem de um percurso, reportam a essência do universo ortodoxo sem esconderem a forte influência bizantina.
Fundado em 1530 por Theodor Bubuiog sob a direcção do princípe moldavo Petru Rares, o santuário, um dos mais visitados da região, recebeu miniaturistas e calígrafos e nele se elaborou o Evangelho que conserva a miniatura de Stefan cel Mare, a grande referência na construção da maior parte dos mosteiros e igrejas de Bucovina e figura máxima, entre 1457 e 1504, do Principado da Moldávia, a quem foi garantindo, dando provas de inegável resistência, a independência face aos constantes ataques otomanos e, ao mesmo tempo, fortalecendo a ortodoxia e o catolicismo contra outras correntes sustentadas pela Reforma e pelo Luteranismo — e por isso, sendo oficialmente Stefan III, é ainda hoje mais conhecido por Stefan, o Grande.
Os olhos não se cansam, percorrem os frescos do exterior, datando de 1535, como os dedos percorrem as páginas de um livro, com a mesma delidadeza, sem pressas, ora seguindo aqueles que são dedicados à Virgem Maria, padroeira do santuário, ora os que mostram a vida e os milagres de São Nicolau; depois, viram-se para os que pintam o cerco persa de Constantinopla e a reconquista da cidade, em 1453, ou o Regresso do Filho Pródigo ou, ainda, cenas da vida de São Jorge e mesmo do Diabo Cómico (uma mulher).
Sede de uma respeitável escola medieval de calígrafos e iluministas (se bem que muitos dos trabalhos produzidos encontram-se actualmente expostos em museus como o de Putna), o mosteiro de Humor, também por ser o primeiro que franqueio, convida a permanecer e a uma segunda contemplação, agora mais focada no pórtico, nas pinturas do Juízo Final, com os seus elementos decorativos tipicamente moldávios, em três imagens rectangulares, pintadas a vermelho, a branco e a preto e exclusivas de Humor, representando o fogo, o frio e a escuridão do Inferno.
Uma vez no interior, por onde a luz do sol tenta insinuar-se através das pequenas janelas — e por isso conserva sempre a frescura — a expressão de espanto não diminui, aqui e acolá até se acentua, talvez exacerbado pela atmosfera silenciosa, pelo mosaico de cores, pelas pinturas de Theodor Bubuiog (o fundador, falecido em 1539, encontra-se sepultado, tal como a sua mulher, em Humor) oferecendo, com a ajuda da Virgem Maria, uma réplica do mosteiro a Cristo e outras, na primeira divisão, designada pronaos, exibindo diferentes cenas de mártires ou, finalmente, sobre a fronteira decorativa, uma representação pictórica dos três primeiros meses do calendário ortodoxo (synaxary), Setembro, Outubro e Novembro.
- Aqui, neste lugar tão especial, o meu coração enche-se de alegria.
Despeço-me da irmã e saio para a rua, ao encontro de duas senhoras, sorridentes, bonitos e floridos lenços cobrindo-lhe a cabeça, que me tentam vender ovos da Páscoa, ricamente pintados. Em Bucovina, há uma crença popular que diz que se um ovo santificado não se rachar até à Páscoa (ocorreu no dia 1 de Maio) seguinte, a família será protegida durante o ano inteiro — e deste modo nasceu a tradição, ainda hoje preservada, de coleccionar os ovos decorados que são colocados numa bandeja.
O azul de Voronet
À boleia, em poucos minutos, regresso a Gura Humorului. A cidade fervilha de vida com o seu mercado de comida para animais. Percorro dois quilómetros a pé, até ao cruzamento que me irá levar a Voronet. Faço sinal a um casal que vai incitando o cavalo a puxar a carroça e o homem, com umas mãos com uns dedos sapudos, obriga o animal a deter-se e eu salto para aquele que é um dos meios de transporte típicos da região. Apenas trocamos sorrisos, eles, de costas para mim, vão partilhando uns salgados que logo me oferecem, dando mais uma prova da genuína hospitalidade do povo romeno, tão em contraste com a imagem que dele temos.
- Casei com uma mulher natural de Bucovina mas durante uns anos vivi em Madrid. Nessa altura, tive uma namorada espanhola e, pouco depois de a conhecer, convidei-a a visitar a Roménia. Ela mostrou-se sempre renitente, queria todas as informações, exigia contactos telefónicos, saber com rigor os lugares onde supostamente a levaria. Finalmente, acabou por vir e, uns dias mais tarde, admirada, perguntou-me: mas a Roménia é assim, um país tão bonito, com gente tão amável? Eu não lhe disse, mas pensei, enquanto sorria: a ignorância limita as nossas fronteiras.
Recordava-me agora, em cima daquela carroça, das palavras de Cosmin Avramescu como, com a mesma nitidez, de todas as portas que se me abriram, dois anos antes, viajando por Maramures — e só dessas memórias me abstraí quando, uns trinta minutos mais tarde, a aldeia começou a despontar no horizonte. Uma mulher pinta a protecção de madeira que delimita o jardim de sua casa da estrada, outra, mais velha, está sentada num rudimentar banco de madeira vigiando as galinhas com uma vara na mão; mais para lá um homem, erguendo e baixando um machado, corta a lenha já a pensar nos rigores do Inverno; bonitas casas, muitas delas em madeira, trepam as colinas; um marulho sereno sobe do rio e tudo contribui para transformar o cenário numa harmonia perfeita.
Uma fila de pequenas barraquinhas de madeira, correndo de um lado e do outro de uma rua estreita e oferecendo ícones religiosos ou peças do artesanato local, anuncia-me a chegada a Voronet, para muitos considerada a Capela Sistina do Oriente e levantada por Stefan cel Mare em 1488. Albergando uma das mais consideráveis colecções de pinturas religiosas, a igreja, dedicada a São Jorge, é mundialmente famosa por ter, na sua fachada oriental, aquele que é por muitos definido como o fresco mais magnificente de Bucovina. Nele, ocupando toda a extensão da parede, plantam os olhos um casal italiano, enquanto um padre e uma mulher, sentados num banco ao meu lado, o admiram com uma expressão nostálgica.
- O que sinto? Paz. A primeira vez que aqui estive foi com os meus pais, devia ter cinco ou seis anos. Depois disso, já voltei a Voronet pelo menos mais umas dez vezes e muitas mais espero vir — e nesse momento ergue os olhos para um céu agora mais carregado de nuvens —, assim Deus o permita. É um lugar fantástico, sereno, que nos faz sentir pequenos perante tanta beleza. São mais de 500 anos de história, enfatiza Victoria Petrescu, enquanto o marido, o padre Mihai Petrescu — também presença frequente desde criança em Voronet —, vai abanando com a cabeça para cima e para baixo, confirmando as impressões desta romena natural de Ploiesti, no Sul do país.
Mal o silêncio se volta a instalar, todos, ao mesmo tempo, como que atraídos, satisfazemos a curiosidade olhando aquela parede em frente. O génio do trabalho do homem, incentivado por esse grande promotor da cultura que foi Stefan cel Mare, tendo como fundo uma paisagem natural generosa, transformam estes espaços de culto em lugares mágicos e inspiradores e dos quais se parte infinitamente mais rico. À nossa frente, já sem o casal italiano a obstruir o campo de visão, um quadro majestoso, detalhado, o Juízo Final, os anjos rodando os signos do Zodíaco para indicar o fim dos tempos, a humanidade conduzida para o julgamento, São Paulo escoltando os crentes, à direita Moisés conduzindo os não-crentes, o Paraíso e o Jardim do Éden, as personagens mais humanizadas, mais próximas da cultura popular, com as suas cores vibrantes e tão pouco desgastadas ao longo dos séculos — e, um pouco por todo o lado, sobressai o azul, um azul forte, conhecido em todo o mundo como o azul de Voronet.
Vale a pena contornar a igreja várias vezes. Na parede virada a norte, o Genesis, Adão e Eva e Caim e Abel; na que fixa o sul, a Árvore de Jessé (pai do rei David) com a genealogia de personagens biblícas, mais exemplos dos milagres de São Nicolau e, entre outras representações, São Jorge lutando contra o dragão. No nártex, encontra-se o túmulo de Daniel, o Eremita, o primeiro abade do mosteiro e aquele que aconselhou Stefan cel Mare a não desistir na sua luta contra os turcos, estimulando o princípe de tal forma que este não só continuou a enfrentar o inimigo como também a conquistar novas vitórias para as suas tropas.
E, em sinal de gratidão para com Deus, mandou levantar o bonito santuário de onde me apresto a sair, não sem antes me sentar para uma derradeira contemplação às pinturas e à constante inquietação de algumas das doze irmãs, cuidando dos espaços ajardinados.
- É uma vida dura e de muitas provações, admite Victoria Petrescu à despedida.
Os vales do silêncio
Na Roménia é fácil andar à boleia, se bem que alguns dos carros que se detêm fazem serviço de táxi e exigem, sendo um transporte público mas clandestino, uma pequena remuneração. Não foi, em momento algum, o meu caso e, em pouco tempo, percorri a distância (pouco mais de três dezenas de quilómetros) que separam Voronet de Moldovita. O verde domina a paisagem, casas, cada uma com o seu poço, e árvores trepam o dorso das encostas, um grupo de irmãs lança à terra lavrada as sementes sob um sol radioso. No mosteiro, com uma igreja ao centro com frescos em que a tonalidade dominante é o amarelo e rodeada por fortificações e torres, reina a tranquilidade. Apenas um casal de romenos e um idoso se passeiam, a esta hora, pelo santuário que também abriga um pequeno museu e onde se pode ver o trono original do filho de Stefan cel Mare, Petru Rares, o fundador. Caminho ao encontro do padre Leontie Loluta (um dos três que vivem em Moldovita, além de 34 freiras) e por ali erro, na sua companhia, escutando com atenção como, pausadamente, descreve a sua rotina diária, desde o despertar, pouco depois das quatro da manhã, até ao recolhimento, por volta das dez da noite.
- Com 13 ou 14 anos já queria ser padre. Nunca foi uma imposição dos meus pais. Gosto deste lugar, dos pequenos trabalhos que se fazem, do tempo de oração, de observar a fé e o respeito de todos os que o visitam, sejam romenos, espanhóis, italianos ou alemães.
No mosteiro de Moldovita, localizado na pacata aldeia de Vatra Moldovi?ei, o mural que mais atrai os fiéis e turistas é aquele que representa o Cerco de Constantinopla, em 626 d.C., com a particularidade de os persas estarem vestidos de turcos e, contrariando a verdade histórica, apresentando os bizantinos ortodoxos como vencedores e os muçulmanos como derrotados.
A tarde avança, a estrada, como uma serpente, vai subindo em curvas pronunciadas até chegar aos 1100 metros acima do nível das águas do mar; ao fundo, avisto pela última vez Moldovita com as suas paredes e um vale pintado de verde onde apetece demorar o olhar. Não tarda, estou em Sucevi?a, também situado num vale montanhoso, com um mosteiro que, pelas suas dimensões e pelas suas paredes impenetráveis, dando-lhe uma aparência de fortaleza, produz um impacto imediato no viajante. Um trilho bordejado de árvores dos dois lados dá acesso ao interior do recinto fortificado (o maior dos mosteiros de Bucovina) e no centro recorta-se uma igreja levantada entre 1582 e 1601 (a última de 22 a ser pintada, a única que não foi mandada construir por Stefan cel Mare ou a sua família e inscrita na lista da UNESCO apenas em 2010), praticamente toda ela coberta de frescos — na verdade, é, entre todas elas, a que conta com o maior número de pinturas, sendo a mais relevante a Escada da Virtude, que conduz ao paraíso. Estranhamente, não por culpa de uma escada mas de um andaime que caiu, a parede ocidental encontra-se despida; reza a lenda que, vítima da queda, o artista morreu e os seus contemporâneos, com medo, recusaram-se a pintar.
O dia está prestes a declinar quando chego, depois de atravessar, a pé, uma zona pobre do distrito de Suceava, onde os meninos jogam à bola na rua e me saúdam à minha passagem, a Dragomirna, na minúscula aldeia de Mitocu Dragomirnei. Fundada entre 1602 e 1609 pelo calígrafo, artista e bispo Anastasie Crimca, o mosteiro, banhado pelos últimos raios de sol, não apresenta frescos no seu exterior, é uma construção num estilo mais austero, em virtude de, nessa época, face aos constantes ataques otomanos, a arquitectura religiosa estar mais focada nas preocupações defensivas do que nos seus elementos decorativos. Por isso, as fortificações de Dragomirna permanecem como as mais altas de Bucovina (bem como a torre da igreja, erguendo-se no céu a uma altura superior a 40 metros), impressionando tanto os fiéis como os críticos da arte (os especialistas consideram o design único no mundo ortodoxo), e produzindo um encanto especial quando reflectidas nas águas do pequeno lago.
Na cave, no Museu de Arte Medieval, encontram-se alguns dos seus melhores tesouros, como um elegante candeeiro esculpido por Anastasie Crimca. Mas provavelmente o maior de todos, cumprindo um desejo do fundador, de que se não passasse um dia sem que os fiéis aqui acorressem, é que, a despeito de ter ficado votado ao silêncio durante o reinado dos Habsburgos e durante as purgas comunistas, sete freiras já idosas, contrariando as ordens do regime, continuaram a viver em Dragomirna nas décadas de 1960 e 1970.
Talvez porque, como a irmã de Humor, não queriam saber da sua identidade, da sua existência, das suas origens. Apenas desejavam ter o coração cheio de alegria.
Ao longe, sob um céu nocturno, avisto Suceava.
Suceava, a cidade que respira vida
Quando, em 1999, Alex Vlad, na companhia dos seus pais, deixou para trás a Roménia, partindo em busca de uma vida melhor na Grécia, Suceava era ainda uma cidade famosa por se ter transformado, na década de 1980 e durante o regime de Nicolae Ceausescu, numa urbe com uma fábrica de papel altamente tóxica e poluente onde se produziam diariamente 20 toneladas de resíduos de celulose, causando, ao longo dos tempos, sérios problemas respiratórios e nervosos (Síndrome de Suceava) entre uma população que actualmente ascende a pouco mais de cem mil habitantes. Alex Vlad tinha sete anos, recorda as brincadeiras com os amigos, a maior parte delas na rua, o pouco interesse que lhe provocaram, durante a primeira visita, os mosteiros de Bucovina nesse tempo que parece tão distante.
- Não conseguia reconhecer a cidade. Que mudança radical. É verdade que foram 17 anos mas os meus olhos não queriam acreditar. Suceava estava muito diferente, ainda com um caminho a percorrer, talvez longo, mas que se transformara, apesar de alguns problemas e carências, num lugar agradável para viver.
Ao fim da tarde, as mães trazem os seus filhos a passear nos parques e jardins bem cuidados, os jovens sentam-se nas esplanadas e convivem, os mais novos fazem malabarismos com os seus skates na enorme praça que é o coração da cidade; a fábrica foi encerrada com a queda do ditador e o edifício deu lugar a um concorrido centro comercial, a cidade produz o popular gelado Betty, uma fábrica de cerveja oferece postos de trabalho e coloca no mercado as marcas Suceava e Calimani, a 24 de Junho o sagrado e o profano misturam-se, a festa religiosa confunde-se com as festividades nas ruas, cheias de cerveja, de comida, com a música sempre presente.
Quando, em qualquer altura do ano, a noite dá lugar ao dia, Suceava mostra a sua faceta cultural — e não apenas a sua vocação para servir de base para uma visita aos mosteiros de Bucovina. Também na cidade, situada a poucos quilómetros da fronteira com a Ucrânia, as igrejas estão por todo o lado: a de St. Dimitru, de 1535, mandada construir por Petru Rares, com traços dos frescos originais no exterior; a Mirau?i, também conhecida como a igreja de São Jorge, reconstruída no século XIX e originalmente a residência do bispado moldávio e o lugar de onde Stefan cel Mare começou a governar o Principado; a Domni?elor, um dos monumentos mais proeminentes de Suceava. Mas o mais emblemático de todos é o mosteiro de Sfântul Ioan cel Nou, dominado pela igreja de São Jorge, incluída na lista de Património Mundial da UNESCO, para onde todos os peregrinos acorriam nos tempos de esplendor daquela que foi a capital da Moldávia entre 1388 e 1565 e era, por essa altura, um importante eixo comercial na rota Lviv-Istambul.
Suceava aprecia-se calmamente, sempre a pé, errando pelos seus museus (etnográfico e da história de Bucovina) e, deixando o centro urbano, pelo parque que a determinada altura dá acesso à cidadela, à Cetatea de Scaun, acabada de renovar e nunca tomada pelos invasores apesar das múltiplas tentativas até ser totalmente destruída pelos turcos em 1675 e desmantelada para as pedras serem utilizadas na construção de casas — os trabalhos de restauração apenas se iniciaram em 1944 e terminaram em finais do ano passado.
Bem próximo está o interessante museu das aldeias de Bucovina, um conjunto de casas que foram transportadas para este espaço juntamente com muitas das suas mobílias originais e, subindo mais de duas centenas de escadas, irá ao encontro de uma estátua equestre de Stefan cel Mare, olhando Suceava e algumas das igrejas que mandou erguer na região.
- Hoje, olho para os mosteiros com interesse, com curiosidade, com respeito, incapaz de perceber como os via com indiferença quando era uma criança. A vida produz mudanças, nas cidades e nas pessoas, diz-me Alex Vlad, numa noite cheia de estrelas no céu de Suceava.
GUIA PRÀTICO
Como ir
A Wizzair, companhia húngara de baixo custo, liga Lisboa a Bucareste duas vezes por semana (aos domingos e às quartas), com uma tarifa à volta dos 130 euros. Se as datas não forem as mais apropriadas, a melhor opção — e a mais em conta — para voar entre as duas capitais é proporcionada pela TAP e a Lufthansa, utilizando os aeroportos de Frankfurt ou Munique como escala: um bilhete de ida e volta custa cerca de 210 euros ou menos ainda se reservar com grande antecedência. E nada perde em tentar garantir uma boa tarifa entre Lisboa e Madrid e, desde a capital espanhola, com a Ryanair até Bucareste, uma ligação que é possível efectuar por pouco mais de cem euros (ida e volta).
A Tarom liga a capital romena ao aeroporto internacional Stefan cel Mare (situado a 15 quilómetros do centro de Suceava) em pouco mais de uma hora, com uma tarifa (também de ida e volta) a rondar os 140 euros. Se preferir alugar carro (útil para visitar os mosteiros de Bucovina, uma vez que o transporte público é escasso ou mesmo inexistente), a distância entre Bucareste e Suceava, se utilizar o trajecto mais rápido, ao longo da E-85, é de 440 quilómetros — e um pouco mais se optar por um percurso mais cénico. Bucareste e Suceava têm, por outro lado, boas ligações, embora um pouco demoradas (entre seis e sete horas), de comboio e autocarro. Suceava é servida por duas estações ferroviárias mas, se o seu destino for Bucareste, deve recorrer à Gara Nord (um edifício elegante que integra, desde 2004, a lista dos monumentos históricos do distrito de Suceava), também conhecida por Itcani, por estar localizada naquela antiga aldeia, hoje um subúrbio da cidade. Tanto a Gara Nord como a estação de Burdujeni (outra construção histórica que em tempos serviu de fronteira do império austro-húngaro) ficam relativamente distantes do centro, ao contrário do terminal de autocarros, situado a poucos minutos a pé dos principais hotéis e atracções de Suceava.
Quando ir
A região de Bucovina, em tempos ocupando uma área duas vezes maior — a parte norte situa-se em território ucraniano na sequência do pacto Ribbentrop-Molotov celebrado por soviéticos e alemães em Agosto de 1940 —, goza de um clima continental temperado, marcado por invernos frios e longos (queda frequente de neve) e verões frescos. A Primavera e o início do Outono são boas alturas para se visitar, até porque o Verão é a estação do ano em que ocorre maior precipitação.
Onde comer
Suceava dispõe de alguns espaços gastronómicos com qualidade, a começar pelo restaurante Latino, na strada Curtea Domneasca, 9 (próximo do terminal de autocarros) focado na cozinha italiana e internacional. Se achar os preços (pratos principais entre os 10 e os 23 euros) excessivos para o seu orçamento, tem, a poucos metros de distância, no número 3 da mesma artéria, um pequeno restaurante grego, Souvlaki Yanaki, onde se come por menos de quatro euros. Finalmente, pode também experimentar o restaurante Catalan, na strada Vasile Bumbac, 3, especializado em grelhados, ou o agradável Oscar Wilde, bar/restaurante com uma esplanada cheia de vida, na strada Stefan cel Mare, 26.
Onde dormir
Se é adepto do conforto, de um ambiente familiar (a proprietária é uma admiradora de Portugal, país que conhece bem) e privilegia a localização, o Villa Alice Hotel, na Strada Simion Florea Marian, é o lugar a eleger em Suceava — tem ainda a vantagem de praticar preços para todas as bolsas: dispõe de quartos de três, quatro e cinco estrelas (bem como apartamentos de quatro estrelas) e as tarifas variam entre os 29 e os 69 euros.
Como alternativa, pode experimentar o Hotel Gloria, na Strada Vasile Bumbac, 4-8, com 29 quartos e três suítes e tarifas entre os 20 e os 46 euros, ou o Continental (www.continentalhotels.ro), na Strada Mihai Viteazul, 4-6, onde um duplo custa cerca de 30 euros.
A visitar
Dispondo de dois dias, pelo menos, pode estender a visita a outros locais de culto, como a igreja de Arbore, a mais pequena, o mosteiro de Putna, seguindo uma estrada onde facilmente se cruzará com carroças puxadas por cavalos (e nesta região os cavalos, conhecidos pela sua força e resistência, atingem preços astronómicos) antes de chegar ao santuário que acolhe uma importante comunidade religiosa (a melhor hora é a que antecede o pôr do sol para escutar os cânticos dos monges) e que foi construído entre 1466 e 1481. Uma vez que deverá passar, a caminho de Putna, por Radauti, uma cidade agradável e com algumas atracções, não deixe de visitar o mosteiro Bogdana (para muitos a igreja de São Nicolau), erguido por Bogdan I em meados do século XIV e, por isso, o lugar de culto mais antigo na Moldávia, bem como, a sul de Suceava (cerca de 50 quilómetros) o mosteiro de Probota, o primeiro a ter pinturas exteriores em toda a região e alvo de um grande número de renovações desde 1930.
Informações
Os cidadãos portugueses apenas necessitam de um documento de identificação (passaporte, bilhete de identidade ou cartão de cidadão) para visitar a Roménia.
A moeda local é o leu (lei no plural) e um euro equivale a 4,44 leis — recorde-se que, em 2005, a Roménia substitui o antigo leu (conhecido pela abreviatura de ROL) pelo novo (RON).
A língua oficial é o romeno mas a maior parte da população entre os 18 e os 40 anos fala fluentemente inglês e não terá dificuldade em encontrar, aqui e acolá, quem domine o alemão, o francês, o italiano, o castelhano e até o português.
Portugal tem uma embaixada em Bucareste, na Strada Paris, 55, que pode ser consultada de segunda a sexta, entre as 9h e as 13h e entre as 14h e as 17h, através do telefone +4 021 230 41 36 ou do email s.consular.bucareste@mne.pt. O atendimento ao público é de segunda a quinta, das 9h30 às 12h30.