Fugas - Viagens

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Devemos muito à Grécia, incluindo uma visita

Por Álvaro Vieira

O país que nos deu muitos dos nossos princípios civilizacionais continua a ter muito para oferecer. O passado estará sempre muito presente, mas a Grécia não é apenas história. E há mais país além das notícias sobre as crises da dívida soberana e dos refugiados. Há um povo que quer ser feliz.

Não é preciso puxar muito pela cabeça para inventar argumentos para visitar a Grécia, para mergulhar no azul da paisagem, flutuar na densidade salgada do mitológico mar Egeu ou imergir no casario branco que se estende a perder de vista de Atenas. Até podem ser os 2792 anos dos primeiros Jogos Olímpicos da Antiguidade, agora que, a partir de 5 de Agosto, se realizam as XXXI Olimpíadas da Era Moderna, no Rio de Janeiro. Num estado com o património da República Helénica, que foi berço da democracia, da filosofia, que nos legou boa parte dos nossos princípios civilizacionais, são muitos os pontos de interesse cultural que se impõem. E é claro que num país com 1400 ilhas, algumas bem diferentes de todas as outras, e 13.700 quilómetros de costa, será praticamente impossível não encontrar uma praia que nos encha as medidas. De resto, a quantidade e variedade do território insular em causa é tanta que seria possível passarmos anos a compor sucessivas visitas à Grécia, sempre com razoável dose de novidade.

Nos últimos anos, o turismo, de longe a principal indústria grega, que costuma representar cerca de 20% do Produto Interno Bruto, foi o esteio da sobrevivência de um país cuja economia em 2013 já se tinha contraído mais de 25% face a 2007, quando ainda crescia a 4% ao ano! A crise financeira da república em 2010 e, pouco tempo depois, a crise geral das dívidas soberanas da zona euro atiraram a Grécia para o que se sabe: austeridade, recessão, desemprego superior a 25% (está a descer, vai agora nos 23%), alguma convulsão política e social. Em cima disto, a crise dos migrantes do Próximo Oriente e do Norte de África tem nas costas gregas alguns dos seus principais cenários.

Significa isto que os turistas passaram a evitar a Grécia? Muito pelo contrário. Há quem lhe chame um “milagre”, como o The Guardian num artigo de Maio, mas o facto é que a visita dos turistas tem vindo a aumentar desde 2013. Não é fácil dizer se houve mais gente a rumar à Grécia por um impulso de solidariedade, por vontade de ajudar assim o país, ou se o acréscimo de visitantes teve a ver com o facto de estes terem acreditado que a crise ditaria uma descida acentuada de preços (que nunca foi muito perceptível).

Atenas em alta

Só no centro de Atenas, que espera este ano um recorde de 4,5 milhões de turistas, há nove novos hotéis em construção. O turismo na Grécia, do qual depende um em cada cinco empregos, está a crescer ao dobro ou triplo da velocidade do crescimento registado em Portugal, Espanha, França e Itália e em 2015 assegurou outro recorde. Foi responsável por 24% do PIB! E os recentes atentados na Turquia, o vizinho que disputa turistas com a Grécia, só farão acentuar esta tendência. Em Portugal, a Fugas apurou que, nalguns balcões de agências de viagens onde Istambul e a Capadócia costumavam ter bastante saída, a procura destes destinos se reduziu a praticamente zero.

O que tem Atenas de especial? Calor, muito calor nesta altura do ano. Entre as terceira e quarta semanas de Junho, a visita da Fugas coincidiu com uma onda de calor, o que resultou numa subida à Acrópole com uma temperatura de mais de 40º. Não tem que ser sempre assim, mas aconselha-se chapéu e protector solar. Uma subida deve é passar, obrigatoriamente, pelo Areópago, o pequeno monte onde no ano 54 o apóstolo Paulo terá proferido o sermão A Um Deus Desconhecido, e pelo Odeon (século II d.c.) de Herodes Áticos, que continua a funcionar como espaço de concertos com capacidade para cinco mil espectadores e onde já cantaram, por exemplo, Dulce Pontes e Mariza.

Outro equipamento cultural na zona que já não vai para novo é o Teatro de Dionísio, do século VI a.c., onde Ésquilo e Sófocles apresentaram as suas tragédias. Continuando a olhar para a esquerda, vemos lá em baixo o que resta do templo de Zeus, com um canto do pórtico bem conservado e algumas colunas alinhadas no chão, sobre o relvado, como se o monumento estivesse a ser montado.

Menos antigo, foi inaugurado em 2009, o novo Museu da Acrópole, já distinguido com vários prémios, fica muito perto, para ajudar a compreender melhor o Pártenon, mandado construir por Péricles (século V a.c.) em honra da deusa Atena Partenos, da qual o arquitecto e escultor Fídias fez uma enorme estátua em ouro e marfim para o interior do templo. A estátua foi levada para Constantinopla e destruída no século V.

O fascínio da Acrópole

Este é o sítio arqueológico mais antigo do mundo, a seguir às pirâmides do Egipto, e fascina há séculos a humanidade. Algumas estátuas e outros elementos esculpidos em mármore desaparecidos do Pártenon podem ser vistos no Museu Britânico, em Londres, no Louvre, em Paris, e até no Vaticano. A título de curiosidade, refira-se que, em Nashville, nos Estados Unidos, foi construída uma réplica em tamanho natural do Pártenon, tal como se supõe que ele seria com todos os seus elementos. O que resta do Pártenon está há décadas a ser objecto de intervenções de preservação, já que o monumento, depois das pilhagens associadas às muitas guerras a que assistiu, é hoje vítima da poluição atmosférica — bem visível no céu de Atenas —, sobretudo das chuvas ácidas que corroem a pedra.

Ao lado, mais pequeno, vemos o Templo de Erecteion, dedicado a Poseidon e Ateneia, com um dos pórticos a ostentar seis cariátides (mulheres de Karyai, feitas escravas durante a guerra que opôs Atenas a Esparta e outras cidades do Peloponeso) a fazer as vezes de colunas. Hoje, dizer a uma grega que é uma cariátide é um piropo, um elogio à sua beleza. Na Acrópole encontramos ainda o majestoso Propileu, pórtico de acesso ao topo do planalto, e o templo de Nike, a deusa da Vitória.

Cá em baixo, o antigo Estádio Panathinaiko, sede dos primeiros Jogos Olímpicos da Era Moderna, em 1896 — Atenas também tem o novo Estádio Olímpico, construído para as olimpíadas de 2004 e que é sobretudo conhecido como Estádio Calatrava, por ter sido projectado pelo arquitecto espanhol Santiago Calatrava —, é outro local de visita habitual. É aqui que cada novo país organizador dos Jogos Olímpicos é investido e é aqui que se coroam os vencedores da maratona de Atenas, que se realiza no primeiro domingo de Novembro. O Campeonato Europeu de Atletismo de 1982 decorreu neste estádio e foi neste evento que se realizou a primeira maratona feminina. A vencedora, como aliás nos dois Europeus seguintes, foi Rosa Mota.

Não é um evento desportivo, mas o render da guarda, no túmulo do soldado desconhecido da Praça Sintagma, aos pés do Parlamento Nacional, também tem muito de atlético. A complexa coreografia protagonizada pelos evzones, guardas presidenciais, com os seus trajes tradicionais em que sobressaem os enormes pompons dos sapatos, tem sempre muitos turistas a filmar e a fotografar. Alguns dos passos e momentos de imobilização cumpridos por estes pitorescos soldados exigem muito equilíbrio e força. E é vê-los transpirar quando, ainda por cima, faz muito calor e têm que usar as tradicionais calças e meias de lã, sob as saias brancas de 400 pregas, a evocar os anos de ocupação turca. O render da guarda acontece à hora certa, de sessenta em sessenta minutos.

Mais estranhos, para os portugueses, são os horários do comércio, que funciona das 8h às 14h e que só às terças e quintas reabre das 17h às 20h. Nalguns sítios, os mais frequentados por turistas, as lojas permanecem abertas por mais tempo, reabrindo após a sesta ou nem fechando após o almoço, atendendo os clientes até às 23h. É assim, por exemplo, no bairro de Plaka, aos pés da Acrópole, e facilmente acessível desde a Praça Sintagma, descendo a Rua Ermou — uma artéria muito comercial, mas com o mesmo tipo de estabelecimentos que encontramos em qualquer cidade europeia.

É nas ruas de Plaka, cheias de pequenas lojas, cafés e restaurantes, com destaque para as tradicionais tavernas, que encontramos o contraponto urbano às largas avenidas de gente apressada e trânsito intenso, nas quais impressiona a quantidade de pessoas que se deslocam em scooters e motas a alta velocidade e sem capacete, que não é obrigatório. Será da combinação entre estas duas atmosferas que se construirá a percepção — ou mais provavelmente, a presunção — de se estar a captar a essência de Atenas.

Que passa também passa por pormenores como o copo de fredo expresso ou fredo cappuccino que os atenienses trazem tantas vezes na mão. A nós parecerá uma heresia que um povo que se diz apreciador de café o consuma gelado, em copos de plástico com palhinha, a maior parte das vezes com leite misturado. Os gregos responderão que não temos tanto calor como eles.

A verdade é que estas bebidas são uma presença cada vez mais importante no seu quotidiano. Escolhem-se os cafés aonde se vai em função da qualidade e do preço do fredo cappuccino. Que pode ser de 3,50 euros, para levar, e muito mais se for para ficar a ocupar uma mesa, no interior ou na esplanada do café. De qualquer forma, estes produtos, que vemos em muitas mãos, são mais do que uma bebida para os gregos. São uma companhia para um bom bocado de tempo, um copo que os acompanha nas deslocações a pé e de transportes públicos, que os acompanha até no trabalho, quando compatível.

Um hiato

A presunção de que é fácil captar a essência de Atenas também tem a ver com o preconceito de que esta é uma capital com pouco para ver. Compreende-se que uma cidade que se estende aos pés e à volta de algo com a importância da Acrópole dificilmente poderá guardar algum património que se lhe compare. E também é verdade que, em Atenas, quando saímos do domínio do arqueológico, o património que vemos, a partir da rua, parece relativamente recente. Como se a cidade tivesse dado um salto da Antiguidade para os séculos XIX e XX.

Talvez isso tenha a ver com o facto de a Grécia ter sido conquistada em meados do século XV pelos otomanos e de ter permanecido sob o seu jugo durante nada menos do que quatro séculos. Foi um período que, em nome do orgulho nacional, os gregos fizeram por esquecer, tentando apagar até da própria língua boa parte das inevitáveis influências de quase 400 anos de aculturação.

Na guerra da libertação participaram artistas e intelectuais ocidentais, como o bem conhecido dos portugueses Lord Byron. O poeta inglês, que também andou por Sintra, é um herói nacional na Grécia, onde morreu com 36 anos (em Missolonghi) e tem um monumento em Atenas. “Vyron”, Byron em grego, tornou-se um nome próprio masculino popular no país e existe até uma localidade, nos arredores de Atenas, cujo nome, Vyronas, presta também homenagem ao poeta, que foi sepultado em Inglaterra mas sem o coração, que — numa solução muito ao gosto da época — ficou na Grécia.

Outros estrangeiros que se associaram aos comités internacionais de luta para a libertação da Grécia, que acabou com a reinstauração da monarquia e subida de Oto (da Grécia, sobrinho do Oto da Baviera) ao trono, ajudaram o país a recuperar as suas raízes nacionais. Isso é patente no desenvolvimento dos estudos arqueológicos e também na própria arquitectura. É por isso que encontramos tanta arquitectura neoclássica em Atenas.

Veja-se o Zappeion, um centro de congressos e feiras cuja concepção tem tudo a ver com a restauração da independência da Grécia e duas tendências muito características do século XIX, a exaltação nacional e promoção industrial através das exposições mundiais. Construído em 1888 pelo magnata Evangelis Zappas, o Zappeion propunha-se albergar eventos desportivos relacionadas com o relançamento dos Jogos Olímpicos e realizações culturais paralelas. Com um imponente pórtico coríntio, foi inaugurado em 1888, a tempo de acolher as provas de esgrima das primeiras Olimpíadas da Era Moderna, em 1896, e serviu de aldeia olímpica aos Jogos de 1906. Depois, foi sucessivamente sede da emissora nacional, hospital, armazém, esteve abandonado e chegou a equacionar-se a sua demolição. Hoje é um moderno centro cultural e de congressos. Fica a cerca de 45 minutos de metro, a partir do centro da cidade.

Atenas também dispõe de tram, eléctrico rápido, que tem a vantagem de nos permitir ver as ruas enquanto nos deslocamos. Não é difícil orientarmo-nos com um mapa: a sinalização pública adopta a dupla grafia e praticamente tudo aparece escrito com o alfabeto gregos e com caracteres ocidentais.

Plaka e tavernas

Só em 1834 é que Atenas, então com apenas cerca de cinco mil habitantes, se torna capital da Grécia, com um plano de modernização e expansão da cidade. Nessa altura, a zona mais densamente povoada de Atenas era justamente o bairro de Plaka, na encosta oriental da Acrópole. Também é sobretudo neste bairro que os turistas encontram as tavernas, como a Kalokerinos ou a Stamatopoulos, que combinam a comida com o folclore grego, ao jantar — serão primas, muito mais barulhentas, das casas de fados de Lisboa. É certo e sabido que aqui há-de ouvir, pelo menos uma vez, o tema ao som do qual dança Anthony Quinn, no filme Zorba, o grego (Michael Cacoyannis, 1964) — uma adaptação que Mikis Theodorakis compôs da música e dança sirtaki para o filme — e outras músicas tocadas no bouzouki, um instrumento de cordas de som bem metálico e mediterrânico. Nestas tavernas com música e danças assiste-se também à dança do ventre, uma influência turca que não foi enjeitada.

Ao assistir à interpretação das canções e danças gregas mais animadas, prepare-se para ouvir, muitas, muitas vezes, alguém gritar “Opaaa!” Antigamente isto era uma manifestação de aprovação, por parte do público, em relação à actuação de músicos ou dançarinos. Um sentimento que se expressava também através do arremesso de pratos ao chão. O efeito sonoro é interessante, o gesto também deve ter efeitos terapêuticos significativos no combate ao stress, mas o arremesso de pratos levanta questões de segurança e até económicas que hoje em dia o limitam a situações muito excepcionais, e cada vez menos urbanas. Já o “Opa” — é mais uma interjeição, sem significado preciso; qualquer coisa como um “É lá” português — é tão acessível que passou a ser proferido pelos próprios músicos e dançarinos. O “Opa” é viciante. Deixa-nos à procura de pretextos para voltar a gritar “Opaaa!”, nem que seja para dentro.

A mesma influência turca é sugerida pela tradição do regatear no comércio. Na Grécia não se regateia tudo, como é evidente. Os preços na restauração, nas lojas de multinacionais, nos transportes e outros serviços públicos, nos inúmeros táxis amarelos em serviço urbano — bem mais acessíveis do que noutras capitais europeias — não se discutem. Mas em relação ao resto, desde que não o faça diante dos outros clientes, desde que não prejudique os negócios futuros do comerciante, pode sempre tentar fazê-lo.

Estará, contudo, a perder tempo se o fizer no Brettos Bar, ainda em Plaka. É fácil dar com ele na rua Kydathinaion: é onde houver uma data de turistas a tirar fotografias da porta. Num país com sólidas tradições na invenção de líquidos alcoólicos, como o ouzo (licor de anis), a Metaxa (espécie de cognac) e a retsina (vinho branco ou rosé exposto a resinas que se usavam para selar as ânforas na antiguidade), o Brettos Bar, casa fundada em 1909, especializou-se nos licores, de receita caseira, para consumir no local e para levar para casa. Visto da rua, parece uma biblioteca ou uma farmácia, com a sua decoração em madeira e prateleiras cheias de cor e de luz. Curiosamente, no interior, quem se vê a consumir mesmo não são turistas mas atenienses. Com ar satisfeito, de quem está a pensar baixinho em “Opaaaa!”.

Mar Egeu
O paraíso dos cruzeiros

Qual é a melhor maneira de descobrir um país com mais de 200 ilhas habitadas, incluindo dezenas com património natural e histórico únicos? Só podia ser de barco.

Os cruzeiros são a forma mais prática de conhecermos, ou espreitarmos, várias ilhas gregas na mesma viagem. As ilhas não são apenas o cartaz mais popular da Grécia: justamente por causa do seu património histórico e natural, elas ajudaram a conformar o país que hoje conhecemos. E não há intimidade possível com a Grécia sem um mergulho no seu azul de céu e mar, sem nos expormos aos seus ventos e nos encadearmos com a luz do sol reflectida por casas caiadas de um branco imaculado.

Os programas de cruzeiros são inúmeros, cada companhia tem vários, com diferentes condições de alojamento e, naturalmente, diferentes preços. Convém ponderar bem, em terra, se não lhe convirá adquirir um pacote de bebidas, incluindo alcoólicas ou não, à discrição no navio.

A Fugas fez um cruzeiro que passou pelas ilhas de Mikonos, Patmos, Rodes, Creta e Santorini, visitando ainda Kusadasi, na Turquia. Embalada pela vitória na guerra pela restauração da independência face aos otomanos, a Grécia fez uma mal-sucedida tentativa de invasão da actual Turquia em 1822 que teve por consequência o fim dos quatro mil anos de presença helénica ininterrupta na costa oriental do Egeu.

Hoje, a escala em Kusadasi, com os seus minibazares de artigos em pele, em algodão e relógios contrafeitos  — genuine fake watches, lê-se por toda a parte — vale sobretudo a pena por partirem daqui excursões para as ruínas da fantástica cidade de Éfeso. Fundada pelos helénicos, chegou a ser a segunda cidade mais importante do Império Romano. As ruínas do complexo dos banhos e latrinas públicas, a fonte de Trajano, de cuja estátua resta um pé, as fachadas do templo de Adriano e da biblioteca de Celso, as casas das famílias mais ricas permitem-nos imaginar como seria a cidade, numa altura em que o mar, hoje a cerca de 20 quilómetros, chegava até aqui e em que os apóstolos Paulo e João pregavam nas colinas em volta. Um dos locais mais visitados é a casa que se acredita ter sido a última que a Virgem Maria habitou. Entre a cidade e o mar ficou um vale, de aluvião, por onde serpenteia, indeciso, o rio Meandro.

As excursões a Éfeso trazem anexadas visitas — que incluem passagem de modelos! — a fábricas de roupa e carteiras em pele. Depois de percorrer as ruas de Éfeso, Património da Humanidade, e viajar milhares de anos no tempo, é um choque de realidade.

A primeira escala deste cruzeiro, a meio da tarde do primeiro dia a navegar, desde o porto de Piréus, é Mikonos, conhecida pela “ilha branca”. Acidentada, cheia de estradas estreitas por entre campos divididos por muros de pedra, Mikonos vale sobretudo pelo fim de tarde na sua “Pequena Veneza”, uma baía guardada por uma bateria de moinhos de vento, aos pés dos quais antigas casas de marinheiros mais abastados, debruçadas sobre o mar e às vezes com partes assentes em estacas, abrigam hoje bares e restaurantes.

A pequena igreja ortodoxa de Mikonos, profusamente pintada, também merece uma visita. No lado oposto ao da santidade, na libertina Paradise Beach, há praias com águas quentes, alguns nudistas e bares de música electrónica, shots e animadores e animadoras em fato de banho sobre as colunas. Mikonos tem uma reputação a defender: de ilha gay friendly, com bares icónicos como o Jackie O. As ruas muito estreitas de Mikonos, com muitas lojas de luxo e casas brancas com escadas e portas e janelas vermelhas, azuis e verdes-água formam um labirinto onde é difícil avançarmos rápido, tanta é a gente, e onde é fácil perdermo-nos.

Ninguém corre esse risco em Patmos, ilha muito mais desafogada. Tal como em Mikonos, abundam as moto4 de aluguer, que muitos gregos usam para se deslocarem na ilha, sempre sem capacete. Aqui se encontra a gruta do Apocalipse, onde São João Evagelista, que também aqui viveu, terá ouvido a voz de Deus.

A fama da ilha de Rodes continua a advir sobretudo de algo que há muito não existe: o colosso de Rodes. Uma estátua enorme, com 30 metros de altura e revestida a bronze, de uma figura humana (Apólo, Hélio?) que segurava uma tocha, a servir de farol, era uma das sete maravilhas do mundo antigo. Durante muito tempo pensou-se que o colosso estaria à entrada do porto, onde agora se encontram estatuetas de cervos, mas hoje sabe-se que não era assim e que a escultura estava mais para o interior da cidade.

Rodes é a mais oriental das ilhas gregas. Paradoxalmente, é daquelas onde sentimos mais a presença europeia. Também Património Mundial, as ruas empedradas da cidade medieval, com casas de ordens de cavaleiros europeias, sugerem-nos embaixadas. Ainda mais quente do que o resto da Grécia, há por aqui vários recantos com água e sombra e edifícios de influência otomana.

Ao longo da marina e avenida marginal anunciam-se várias excursões de barco, para observar o fundo marinho, visitar as suas praias ou descobrir a “baía Anthony Quinn”. Conta-se que, apaixonado por Rodes, onde decorreram as filmagens de Os canhões de Navarone (J. Lee Thompson, 1961), o actor mexicano-norte-americano, de ascendência irlandesa, antes ainda de se tornar Zorba, o grego em 1964, decidiu comprar os terrenos em volta de uma enseada paradisíaca para aí construir um centro internacional para cineastas e artistas em geral. O caso acabou no Supremo Tribunal grego, porque as autoridades do país, depois de encorajarem a compra, acabaram por concluir que os terrenos não eram alienáveis. Os herdeiros de Quinn continuam a disputa com a República Helénica.

Creta é a maior das ilhas gregas e tem várias praias paradisíacas e pouco frequentadas. O mesmo já não se pode dizer de algumas das suas principais atracções, como as ruínas do Palácio de Knossos, que requerem algum tempo, mais do que o proporcionado por alguns cruzeiros, para comprar o bilhete e fazer a vista. Knosso era o berço da civilização minóica (3000 a.c. a 1400 a.c.), do mitológico rei Minos e do Minotauro. Segundo a mitologia grega, o ateniense Teseu foi a Creta matar o Minotauro. Tinha prometido a seu pai, o rei Egeu, trocar as velas negras do navio por velas brancas, se fosse bem-sucedido na empresa. Mas embriagou-se na véspera da chegada a Atenas, não fez a troca, e Egeu, ao ver no horizonte as velas negras do barco, matou-se, atirando-se o mar, que tomou o seu nome.

Santorini também se presta muito a lendas. Desde logo, é mais um dos sítios descritos como o que resta do continente perdido da Atlântida. Compreende-se que assim seja. Entre 1640 a.c. e 1450 a.c., o vulcão Tera teve uma erupção violentíssima, que fez desaparecer a maior parte da ilha. Um enorme tsunami terá precipitado o fim da civilização minóica de Creta. A nuvem de poeiras e gases tóxicos afectou o clima da China e da Europa. Hoje, Santorini, que deve o seu nome a Santa Irene, protectora dos venezianos, a sua capital Fira e sobretudo a localidade de Oia proporcionam as paisagens mais retratadas nos postais gregos, com o seu casario branco e igrejas de abóbadas azuis, ainda que tudo, sobretudo nesta última, esteja cada vez mais tomado pelos espaços de restauração, lojas de souvenirs e espaços de hotelaria de luxo.

Em Fira, tal como Oia no alto de um penhasco, o acesso ao porto faz-se de burro ou por um teleférico que parece descer quase a pique, nalguns sítios. Santorini tem fama de ter o pôr do sol mais bonito do mundo.

Guia prático

Quando ir

A Grécia está repartida por zonas de clima temperado, o Norte, e mediterrânico, o Sul. Em nome do conforto, tente evitar o pico do Verão e o Inverno. De resto, qualquer mês é bom para visitar a Grécia continental e insular.

Como ir

A Aegean Airlines, a companhia de bandeira da Grécia, é a única a assegurar (desde Junho) voos directos entre Lisboa e Atenas. E acaba de reforçar a oferta, tendo criado no dia 14 uma terceira ligação semanal. Há partidas de Lisboa às 0h30 de terça, quinta e sábado que chegam a Atenas às 6h45, hora local. E regressos que deixam Atenas às 21h30 e chegam a Lisboa às 23h45 de segunda, quarta e sexta. Os voos de quarta e quinta mantêm-se até ao final de Setembro. Os outros dois voos mantêm-se neste horário até ao fim de Outubro. A partir daqui, haverá redefinição de horários.

Onde ficar

Não faltam hotéis entre o razoável e o muito bom em Atenas, para uma grande variedade de preços. Faça a sua pesquisa online ou aconselhe-se com a sua agência de viagens antes de reservar logo à primeira. Muito organizada à volta e em função da Acrópole, Atenas não permitiu grandes construções em altura. Assim, a vista do Pártenon mantém-se muito democratizada, sendo muitos os hotéis com restaurantes e bares na cobertura onde é possível fazer agradáveis jantares com a Acrópole iluminada como cenário. É o caso do Hotel Titania, que ainda tem a vantagem de ficar na mesma avenida que as neoclássicas Universidade de Atenas e a Biblioteca Nacional e a pouco mais de dez minutos a pé da Praça Sintagma e do Parlamento Grego.

O que fazer

A partir da Praça Sintagma, desça a pé até à zona de Monastiraki (também há estação de metro) e perca-se no mercado, nas lojas de velharias da zona e na espécie da feira da ladra que ali se realiza diariamente. Na Praça Monastiraki, além do pequeno mosteiro de Pantanassa, ao centro, há uma antiga mesquita ocupada por serviços da administração local e o edifício da estação de metro. Infelizmente, a vizinha Catedral da Anunciação, a catedral metropolitana ortodoxa de Atenas, um dos principais pontos de interesse deste bairro, está em obras de requalificação desde o tremor de terra de 1999. A Praça Monastiraki também costuma ter frutos e outros produtos frescos que contribuem para o seu colorido. Como é uma zona concorrida, convém proteger o porta-moedas dos carteiristas. Atenas é considerada uma cidade segura, mas informe-se no seu hotel sobre os locais que deve evitar atravessar à noite a pé.

A Fugas viajou a convite da Viagens Abreu

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