Fugas - Viagens

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    Museu do Traje Rui Gaudêncio
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    Igreja Paroquial do Lumiar Rui Gaudêncio
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    Parque Botânico do Monteiro-Mor Rui Gaudêncio

As histórias esquecidas do Lumiar

Por Alexandra Prado Coelho

Na sua quarta edição, a Lisbon Week, que acontece até 2 de Abril, parte à redescoberta do bairro do Lumiar com muitas propostas diferentes. A Fugas seguiu uma das várias pistas: as visitas guiadas a palácios, quintas e igrejas.

Não é fácil reencontrar hoje, por entre as ruas e os prédios do Lumiar, os vestígios do que foi aquela zona de Lisboa há 100 ou há 200 anos. Mas é precisamente essa a proposta das visitas culturais da Lisbon Week, que arranca hoje e se prolonga até 2 de Abril: descobrir histórias e personagens de uma freguesia que é actualmente, em população, uma das maiores de Lisboa e que ainda está longe dos principais circuitos turísticos.

Houve um tempo em que o Lumiar era uma área de quintas pertencentes à nobreza que, com os seus solos muito férteis e abundância de água, assegurava uma produção agrícola importante para o abastecimento de Lisboa. Mas, para conhecermos o início da história, temos que recuar ainda mais no tempo, até ao século XIII, mais precisamente ao dia 2 de Abril de 1266, data da sua fundação.

Curiosamente, uma das mais antigas referências conhecida permanece hoje na toponímia: o Paço do Lumiar — uma das áreas mais bem preservadas da freguesia — vem do século XIV, quando D. Dinis, ao fazer a partilha dos bens do Mordomo-Mor do rei, o Conde de Barcelos, deixou ao seu filho bastardo (e genro do conde), D. Afonso Sanches, uma quinta e uma casa de campo, chamada Paços do Infante D. Afonso Saches, que mais tarde passou a ser apenas Paço do Lumiar.

Foi durante os séculos XVII e XVIII que o número de palácios se multiplicou naquela zona, que continuou a ter fortes características rurais até meados do século XX. De entre esses palácios, um dos que mais se destaca é o do Monteiro-Mor, onde actualmente se encontra o Museu do Traje, e que pertenceu ao Marquês de Angeja, D. Pedro José de Noronha Camões de Albuquerque Moniz e Sousa, presidente do Real Erário depois da queda em desgraça do Marquês de Pombal.

Comecemos por aí um breve passeio pelas histórias do Lumiar, a partir do que serão as visitas guiadas da Lisbon Week.

Parque do Monteiro-Mor

“Foi o Marquês de Angeja quem criou, no Lumiar, o primeiro jardim botânico da cidade”, conta o olissipógrafo José Sarmento de Matos, sublinhando, contudo, que nunca fez um estudo aprofundado sobre os palácios do Lumiar. “No século XVIII começa a surgir a ideia de fazer jardins e de as pessoas passearem em jardins. Começa-se a olhar a natureza de outra maneira.” A esse propósito, também o Marquês de Pombal tinha lançado uma moda entre os nobres: a criação de bichos-da-seda (e a consequente plantação de amoreiras) para que houvesse material suficiente para alimentar as fábricas de sedas.

A ajudar o Marquês de Angeja no seu jardim, criado em 1750, esteve o naturalista italiano Domenico Vandelli, acrescenta Inês Pais, a historiadora de arte que vai acompanhar as visitas da Lisbon Week. Apesar do seu papel no governo da nação, o Marquês de Angeja era um verdadeiro entusiasta do seu jardim, no qual introduziu espécies exóticas para Lisboa, e existe mesmo um retrato que o apresenta com um barrete na cabeça e sentado a uma mesa com espécies botânicas à frente.

Na primeira metade do século XIX, a quinta e o palácio Angeja — que ainda tem sinais de uma ocupação anterior — foram postos à venda e comprados pelo 1.º Duque de Palmela. “A duquesa de Palmela mandou vir um grande jardineiro que alterou várias coisas do jardim original”, relata Sarmento de Matos.

Com os Duques de Palmela juntam-se — através de um casamento entre a herdeira do Palácio do Monteiro-Mor e o 2.º Duque de Palmela — os dois palácios (onde hoje ficam o Museu do Traje e o do Teatro) e o grande parque chamado do Monteiro-Mor, com 11 hectares e mais de 250 espécies botânicas, passou a unir as propriedades.

Quinta dos Azulejos

Dificilmente se encontrará em Lisboa uma quinta com mais azulejos do que aquela onde actualmente funciona o colégio Manuel Bernardes. “Foi mandada construir na primeira metade do século XVIII por António Colaço Torres, ourives e fornecedor da Casa Real”, conta a historiadora Inês Pais. Este faz um “jardim extraordinário” todo revestido a azulejos, “que se estendem a todas as superfícies, paredes, bancos, colunas”.

Só será possível visitar esta quinta nos dois fins-de-semana da Lisbon Week, altura em que o colégio está encerrado. Mas vale a pena porque é uma oportunidade rara para entrar naquele que, segundo se julga, o proprietário quis que fosse uma espécie de jardim do Paraíso.

“Há um pórtico com um medalhão onde está representado São Pedro com a chave do Paraíso”, prossegue Inês Pais. “Daí que se pense que a ideia seria a de tentar criar um paraíso na Terra.” Os painéis de azulejos representam cenas nobres e galantes, algumas campestres, outras bíblicas ou mitológicas. “Tem um lado muito enciclopédico daquilo que era o saber no século XVIII. É um exemplo interessante da cultura europeia da época transposta para uma técnica muito portuguesa que é a do azulejo.”

Quintas das Conchas e dos Lilases

“A Quinta das Conchas era a maior de todas as que existiam no Lumiar”, refere Sarmento de Matos. “No palacete principal, onde funciona agora a Junta de Freguesia, ainda se pode ver um portal manuelino.” Teve, ao longo do tempo, vários proprietários, sabendo-se que era, já em 1520, um morgadio pertencente a D. Afonso Torres, um rico negociante de origem espanhola.

Outro dos proprietários que ficou na História foi D. Francisco Mantero, nascido em Cádiz, mas que se casou em Lisboa e que se tornou um dos grandes exploradores das roças de café de São Tomé.

Comprou inicialmente a Quinta dos Lilases, na qual restaurou e ampliou a casa, dando-lhe um carácter de mansão colonial e, em 1897, comprou a parte rústica da Quinta das Conchas. Na sua nova propriedade, no centro de um grande lago artificial, mandou fazer duas pequenas ilhas nas quais plantou palmeiras, numa homenagem, em pleno Lumiar, às ilhas de São Tomé e Príncipe. Usou também a arquitectura do ferro e do vidro, em voga na época, para construir um jardim de Inverno.

A Francisco Mantero está associada uma lenda segundo a qual uma das suas casas estaria assombrada pelo fantasma de uma jovem que, tendo sido trazida de São Tomé, teria depois sido presa e enlouquecido. A história parece não ter qualquer fundamento, afirma Inês Pais, segundo a qual os descendentes de Francisco Mantero explicam que havia de facto uma jovem que viveu noutra área da propriedade mas apenas porque durante um período esteve doente e nessa zona podia beneficiar de melhores ares.

Convento da Nossa Senhora das Portas do Céu

Esta é, para José Sarmento de Matos, “uma das histórias mais exóticas de Lisboa”. A Igreja de Nossa Senhora das Portas do Céu, em Telheiras, que estava ligada ao convento com o mesmo nome, foi fundada por D. João de Cândia, chamado o “Príncipe Negro”, nascido em Cândia, no interior da ilha do Ceilão (actual Sri Lanka) no século XVI.

Expulsos do seu reino, D. João e o pai, D. Filipe, procuraram protecção junto dos portugueses e D. João cresceu entre os frades franciscanos, tornando-se clérigo em Goa. Em 1625 funda na Quinta do Ouvidor-Mor, em Telheiras, a Irmandade de Nossa Senhora da Porta do Céu e do Glorioso São João Baptista e um convento para os franciscanos.

Morreu em 1642, na casa que habitava em Telheiras, contígua ao convento, onde foi sepultado. A pedra que originalmente assinalava o seu túmulo está no Museu Arqueológico do Carmo, mas as ossadas de D. João de Cândia repousam ainda no local, onde a sua igreja, entretanto restaurada, é hoje a Paróquia de Telheiras. 

 

As visitas culturais

Palácios do Lumiar
Terça a sexta: 15h. Sábado e domingo: 10h/14h/16h
Ponto de encontro: Largo Júlio de Castilho
Bilhete 7€ Ticketline / Duração 02H00

Igrejas e conventos
Segunda a sexta: 15h
Ponto de encontro: Alameda Linhas de Torres, 156
Visita no autocarro LisbonWeek; duração de 2h
Bilhete 10€ Ticketline

Quintas do Lumiar
Segunda a sexta: 11h. Sábado e domingo: 10h/14h/16h15
Ponto de encontro: Alameda Linhas de Torres, 156
Visita no autocarro LisbonWeek; duração de 2h0.
Bilhete 10€ Ticketline

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