-> MAIS: Taylor's, Fonseca e Croft declaram vintage clássico 2009
Se as previsões dos climatologistas se confirmarem, o aumento da temperatura vai ter consequências sérias na viticultura mundial. O cultivo da vinha não atravessa o mesmo perigo de espécies como o urso polar, mas é provável que o excesso de calor venha a adulterar a tipicidade de alguns vinhos (já aconteceu isso em várias regiões francesas na colheita de 2003), que surjam novas pragas, que muitas regiões vitivinícolas tenham que se reinventar e adaptar se não quiserem desaparecer e que o mapa vitícola mundial continue a estender-se rumo aos pólos e comece a incorporar novas zonas produtoras, actualmente frias de mais para a viticultura de qualidade.
As mudanças já estão a ocorrer, como se constata pela antecipação do início das vindimas em vários países, pela ocorrência de ondas de calor extremo alternadas com precipitações intensas e pelo aparecimento de pragas até então pouco habituais. Dentro de algumas décadas, o atlas do vinho não será seguramente o mesmo. Até ao final deste século, segundo a previsão de Bernard Seguin, coordenador das pesquisas de clima do Institut National de la Recherche Agronomique francês, o limite setentrional da viticultura - que em meados do século passado se estendia da Bretanha à Ucrânia - deverá chegar à Escandinávia.
A boa notícia é que o aquecimento vai melhorar a qualidade das uvas em muitas regiões, como a nossa região dos Vinhos Verdes, por exemplo. E países como a Bélgica, Holanda ou Inglaterra, hoje sem clima para a viticultura de qualidade, poderão vir também a ter condições para produzir os seus próprios "Grand crus". No caso dos ingleses, povo enófilo como poucos, seria a felicidade na Terra. Para já, graças ao aumento da temperatura, a Inglaterra vai -se afirmando no mundo dos espumantes, em particular no sul do país, onde o solo não é muito diferente do da região de Champanhe. E ninguém se admire se, dentro de alguns anos, as grandes casas francesas começarem a comprar terras nas cada vez mais pujantes regiões de Kent e Sussex, assegurando, assim, a continuidade do negócio.
O vinho gosta de sol e de calor e ao longo da história beneficiou muito do aquecimento global, sobretudo no chamado Velho Mundo, ou seja, os países europeus com maiores tradições vinícolas, como a França, Itália, Espanha e Portugal, entre outros.
Especialistas de três universidades americanas (Gregory Jones da Universidade do Sul de Oregon, Michael White da Universidade Estadual do Utah e Owen Cooper da Universidade do Colorado) compararam a classificação atribuída pela leiloeira Sotheby's ao vinho produzido em 27 regiões vitivinícolas de todo o mundo nos últimos 50 anos com a variação dos valores da temperatura durante o mesmo período e concluíram que um aumento da temperatura média de cerca de dois graus Célsius correspondeu a uma melhoria gradual e significativa da qualidade dos vinhos.
Em Portugal, o passado recente no vinho do Porto pode permitir a mesma conclusão. Em média, por década, as grandes casas do sector só declaram Porto Vintage clássico (vinhos de uma só colheita de qualidade excepcional engarrafados com a marca principal das empresas) duas ou três vezes. Na primeira década deste milénio, já vamos em três anos "vintage" clássico: 2000, 2003 e 2007. E já é certo que, rompendo com uma tradição de séculos, algumas das principais casas do sector vão declarar "vintage" clássico também em 2009.