Fugas - Vinhos

Continuação: página 2 de 3

Em busca das leveduras indígenas para criar vinhos diferentes

Em contrapartida, os vinhos de hoje, sobretudo os brancos, estão a ficar cada vez mais parecidos, com aromas de perfil tropical...

Isso tem a ver com a tecnologia que se usa e não necessariamente com a levedura. Embora haja leveduras que potenciam esse carácter tropical, é sobretudo a tecnologia que condiciona isso. Houve exageros, porque se começou a descobrir que havia leveduras que impactavam um determinado carácter ao vinho e esse carácter era procurado no mercado, havia uma moda. Uma grande quantidade de produtores foi na esteira desse sucesso e começaram, de facto, a aparecer muitos vinhos iguais. Nem aconteceu tanto agora com os vinhos ditos tropicais, aconteceu mais há 20 anos, com os chamados vinhos tecnológicos. As leveduras que se usavam escondiam, aliás, muito o carácter das castas. Daí o sucesso da QA23 nos vinhos brancos.

O que levou a Sogrape a voltar a olhar para as leveduras passado este tempo?

O que fizemos agora foi repetir um pouco o exercício de há 20 anos, com o objectivo de encontrar leveduras adaptadas a outras regiões que permitissem produzir vinhos com caracteres novos, com novos perfis sensoriais; mas, por outro lado, também quisemos sair um pouco daquilo que tem sido a tendência de limitar todo o trabalho de identificação de leveduras a uma espécie, que é a Saccharomyces cerevisiae. Não usámos esse critério. Analisámos quase 800 estirpes de leveduras e, dessas, mais de metade não era Saccharomyces cerevisiae. Depois fomos seleccionando com base em vários critérios e chegámos a 34 estirpes, em que tínhamos quatro que não eram Saccharomyces cerevisiae, e todas elas produziam vinhos com bastante interesse.

Já estão em condições de as usar?

Neste momento, as quatro estirpes que validámos funcionam em escala normal de vinificação. Nesta vindima vamos experimentá-las em várias castas, de vários locais, e procurar encontrar a melhor adaptação entre a estirpe de levedura e a casta e o tipo de mosto da região onde é produzido. Estamos na fase de desenvolvimento.

Vão aplicá-las a todos os vinhos?

Vamos experimentá-las.

Vão experimentar com o Barca Velha?

Vamos experimentar com mostos da Quinta da Leda [onde é feito o Barca Velha] e vamos ver como funciona. Se ela se der bem com o Barca Velha, porque não?

Se a QA23 permite potenciar a tipicidade das castas, com estas pretendem o quê?

Potenciar caracteres diferentes das castas. É criar variedade. Aumentar a diversidade. O mercado valoriza os vinhos diferentes e é esse o grande potencial dos vinhos portugueses.

As experiências que fizeram são animadoras?

Muito animadoras. Nós pegámos em 200 mil litros de mosto da Bairrada e dividimo-lo por quatro cubas de 50 mil litros e em cada cuba pusemos cada uma das quatro estirpes. E fizemos quatro vinhos completamente diferentes. Com boa qualidade, mas com aromas diferentes. Uns mais para o lado dos ananases e dos toques florais, outros mais minerais, outros mais resinosos. Você pega naquilo e diz: "Isto são quatro vinhos completamente diferentes." No entanto, o mosto de partida era o mesmo.

--%>