A 10 de Setembro de 1756, o marquês de Pombal, primeiro-ministro d’El Rei D. José mandava publicar um alvará que criava uma companhia monopolista destinada a "sustentar a reputação dos vinhos e o amanho (cultivo) das vinhas" do Alto Douro, onde já então se produzia o actual vinho do Porto. Com um avanço de quase 100 anos sobre a história, o marquês criava o conceito das modernas regiões demarcadas e elegia o Brasil como um mercado reservado para dar músculo ao seu projecto. A partir dessa data, a Companhia ficaria com o exclusivo do comércio dos vinhos para os portos do Brasil, tendo para esse efeito criado uma reserva de 10 mil pipas. E, entre um extenso corpo de regras, obrigava-se a pagar 10 mil reis pelo transporte de cada pipa para o Rio de Janeiro e 7200 reis para Pernambuco.
A importância que o então "Estado do Brasil" tem na regulamentação da velha companhia é sugestiva de uma relação intensa entre o vinho produzido na metrópole e o consumo na sua principal colónia. Já em 1532 uma memória de Ruy Fernandes nos recorda que os "vinhos cheirantes" de Lamego abasteciam as "armadas de El Rei", e até que os ingleses descobrissem que poderiam ser "uma pólvora incendida no queimar, uma tinta de escrever na cor, um Brasil na doçura, uma India no aromático" e os começassem a importar em força, na segunda metade do século XVII, os mercados de além-mar foram o sustento dos nobres ou dos frades que os produziam.
Hoje, porém, o interesse não se manifesta apenas num sentido. Nem se faz apenas com a exportação de vinhos dos portos nacionais para o Brasil. Há companhias e enólogos portugueses a investir na produção de vinho no Brasil. E há empresários brasileiros que se renderam ao encanto do negócio do vinho em Portugal. Pelo meio há uma intensa troca de experiências entre as duas partes. É frequente encontrarem-se jornalistas brasileiros no Dão ou no Alentejo ou turistas em visitas pelas encostas de xisto do Douro. Como é frequente haver enólogos portugueses a cooperar com vinícolas gaúchas. Ou produtores a organizar provas em restaurantes ou garrafeiras no Rio ou em Fortaleza.
A viagem da Europa para a América do Sul faz-se a partir da sensação de que o mercado brasileiro do vinho está ainda a dar os primeiros passos de crescimento e que um dia se tornará um dos mais importantes do planeta. Actualmente, cada brasileiro consome em média anual dois litros de vinho, enquanto, por exemplo, os habitantes do Estado do Vaticano bebem 74. O que atrai os brasileiros na vinha e no vinho em Portugal é uma combinação entre a utilidade do negócio e o lado romântico, cosmopolita e socialmente reconhecido da produção de vinho. Ter uma vinha na Europa, de preferência com uma casa senhorial, tornou-se uma atracção irresistível para pessoas abastadas da China, de Angola e, obviamente, do Brasil. Para o milionário João Carlos Paes Mendonça, por exemplo, os resultados financeiros da sua Quinta Maria Izabel, no Douro, pouco acrescentam ao seu negócio imobiliário. Mas a paixão pela vinha e pelo vinho, essa é irresistível.