Fugas - Vinhos

Adriano Miranda

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O Douro entre a utopia e a realidade

De facto, desde que me conheço e que comecei a atentar nas coisas do Douro, ouço falar da crise da região e, simultaneamente, das suas potencialidades.

Benefício, escoamento, vinho de pasto, 43/80, 504 I, PDRITM, mão-de-obra, míldio, oídio, chuva abundante ou a falta dela, preços, excedentes, aguardentes, etc., etc., etc., são nomes de crises, conjunturais ou estruturais, que têm enchido páginas de livros e de jornais ao longo de décadas, escritas por centenas de pessoas, mais ou menos bem informados acerca da realidade regional.

A todas elas o Douro tem sobrevivido, melhor ou pior, com mais ou menos sacrifícios de todos quantos fazem desta região o seu modo de vida.

Por outro lado, as potencialidades do Douro têm enchido páginas e páginas de estudos estratégicos, discursos de políticos ou simples artigos de opinião.

Diga-se, em abono da verdade, que o cumprimento de muitas dessas potencialidades, da transformação dessa energia potencial em energia cinética, em movimento, é em muitos casos infelizmente ainda incipiente.

Talvez por isso, volvidos 30 anos, mesmo que, repito, o Douro de hoje nada tenha a ver com o Douro de então, é certo que continua a apresentar dos mais baixos índices de desenvolvimento socioeconómico, quaisquer que sejam os indicadores que utilizemos.

Ora, se uma região dita com tantas potencialidades permanece tanto tempo neste limbo do desenvolvimento, é lícito que nos perguntemos se essas potencialidades existem mesmo e, a existirem, então o que é necessário fazer para que se transformem definitivamente em melhoria das condições de vida, último e definitivo índice de análise do desenvolvimento socioeconómico de uma população.

Deixo as respostas para cada um dos actores regionais e para os que terão de operacionalizar e executar o programa de crescimento inteligente, sustentável e inclusivo previsto no Portugal 2020, em fase de arranque.

No que ao sector do vinho diz respeito, infelizmente continuam a persistir problemas antigos e a pairar nuvens negras sobre a região.

Porquê? Desde logo porque se trata de uma região que em vez de gerir procura, tem de gerir oferta. Não tanto no vinho do Porto, que felizmente tem alguns mecanismos de regulação, mas nos restantes vinhos da região, com excedentes maiores do que a própria dimensão do mercado, o que faz alinhar os preços dessas uvas e vinhos pelo preço do mercado mundial de vinho, substancialmente abaixo do custo de produção. Naturalmente que esta situação apenas se tem podido manter à custa do vinho do Porto e dos mecanismos de regulação de que beneficia (fixação anual do benefício e a chamada lei do terço) e que têm permitido alguma estabilidade dos preços.

Mas será esta situação sustentável por muito mais tempo? Como não me parece sustentável a degradação do quantitativo de benefício por hectare que se tem assistido nas últimas décadas, decorrente do aumento de área apta à denominação de origem Porto, sem um correspondente alargamento do mercado, bem antes pelo contrário. Desde 2000 que o sector perdeu mais de 16 milhões de litros de vinho do Porto comercializado e cerca de 50 milhões de euros de volume de negócios, o que constitui um facto muito preocupante, não só para as empresas, mas para todo o sector e naturalmente para a região, que também viu o produto regional fortemente diminuído.

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