Fugas - Vinhos

Adriano Miranda

O Douro entre a utopia e a realidade

Por Jorge Dias

Académico, estudioso da viticultura e dos problemas institucionais do Douro, Jorge Dias é o administrador da Gran Cruz. Neste artigo na primeira pessoa, Dias alerta para os perigos que se anunciam para o Douro e sugere pistas para a sua solução.

O Douro de hoje não tem nada a ver com o Douro que existia há 20 ou 30 anos aquando da nossa integração europeia.

Com efeito, vários quadros comunitários de apoio depois e muitos milhões investidos, o Douro registou uma evolução extraordinária, fruto quer do investimento público, quer privado.

Não querendo de forma alguma ser exaustivo, acessibilidades, saúde, equipamentos culturais, acesso ao conhecimento e à informação, foram alguns dos alicerces construídos pelo investimento público que propiciaram o investimento privado e mudaram a face do Douro, sobretudo nos sectores do vinho e do turismo.

Criando-se riqueza nestes sectores, as populações viverão cada vez melhor, o que naturalmente facilitará a criação de mais e melhor oferta. O Douro acolherá melhor os que o visitam, pois são eles quem, através do turismo e, implicitamente do vinho lhes trazem riqueza.

Esta é a minha visão de futuro para o Douro.

Uma visão em que o Douro se torne atractivo e fácil de viver para os portugueses que queiram regressar dos grandes centros urbanos. Uma região de fáceis acessibilidades rodoviárias, ferroviária e aéreas, e dentro da qual facilmente se acede aos cuidados de saúde, à educação nos parâmetros mais exigentes e a equipamentos culturais com uma programação adequada às actuais tendências.

Só assim se poderão atrair pessoas que criem mais oferta e que trabalhem nessa nova oferta, que qualifiquem o território e que dinamizem a economia regional.

Atraídos por esta dinâmica regional, novos investidores externos visitarão a região, acreditarão nas suas potencialidades e construirão a sua própria visão! Seja na oferta turística motivada pela crescente procura de locais preservados, fortemente ligada à natureza e ao mundo rural, seja na produção de vinhos do Porto e do Douro capazes de satisfazer os mercados mais exigentes, como temos já excelentes exemplos, o último dos quais incluiu três vinhos do Porto e do Douro no Top 10 mundial de 2014 para a prestigiada revista Wine Spectator.

Uma nova dinâmica de mercado que permita que os produtores consigam ver o seu esforço de melhoria das condições de produção, nas vinhas e adegas, realmente compensado: só aí poderão requalificar as suas propriedades e abrir as portas a uma crescente procura de novos consumidores, exigentes, que preferem comprar directamente aos produtores os bens produzidos nas suas terras.

Simultaneamente, sensibilizados por esta nova procura, os agentes públicos responsáveis pela região, e toda a região, compreenderão a necessidade de qualificar os espaços públicos, as aldeias e as vilas, os caminhos pedonais, os miradouros mais procurados ou os mais recônditos, incitando os visitantes à observação, à curiosidade, à emoção e à sensibilidade de melhor conhecer e compreender esta obra combinada do homem e da natureza, esta civilização da vinha e do vinho, contada e explicada pelos próprios habitantes da região que, finalmente, ganham auto-estima e se reconciliam com o seu passado.

Será esta uma visão utópica? Talvez.

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