Uma lista que, neste caso, não pretende ser nem exaustiva nem uma relação fria e analítica do somatório aritmético dos vinhos que melhores classificações obtiveram ao longo de um ano inteiro de provas.
Muito mais que uma compilação absoluta dos melhores vinhos do ano, gostaria de enunciar os vinhos que mais me impressionaram ao longo deste ano civil, aqueles que por razões distintas me despertaram mais emoções e que mais me incendiaram a alma. Vinhos que surpreenderam ou que se mostraram quase previsíveis e fáceis de entender, vinhos inovadores ou clássicos, caros ou baratos, velhos ou novos… mas sempre com personalidade, individualidade própria e honestidade intelectual e material de se manterem fiéis ao local onde as vinhas estão plantadas.
Num país que se celebrizou internacionalmente pelos vinhos generosos e que contou e continua a contar com a ajuda destes para desbravar terreno mediático para a implantação dos vinhos de mesa, seria impossível não começar com o incrível e notável trio composto pelos vinhos do Porto, Madeira e Moscatel de Setúbal. Sobretudo num ano que revelou ser admirável para a santíssima trindade dos vinhos nacionais, com a libertação de vinhos velhos e prodigiosos que sobressaltaram o mundo com a sua imensa longevidade, qualidade e carácter.
Os produtores de vinho do Porto continuam a surpreender com o desembaraço com que são desvendadas colheitas muito antigas, algumas delas ainda do século XIX, vinhos inimagináveis que com frequência criam alvoroço e emoções fortes. Só este ano foram lançados dois vinhos velhíssimos e extraordinários, o Graham’s Ne Oublie, um Tawny muito velho que resiste desde 1882, data em que Andrew James Symington desembarcou pela primeira vez em Portugal, e o Taylor’s Single Harvest 1863, um Colheita do ano homónimo que marca o Vinho do Porto Colheita mais antigo do mercado. Dois vinhos muito diferentes entre si mas igualmente imensos na dimensão, complexidade, frescura e opulência.
Os produtores de vinho da Madeira são aqueles que têm mais facilidade em providenciar vinhos velhos, vinhos muito, muito velhos… embora por vezes esse atributo acabe por se transformar num dos maiores pesadelos da Madeira. As expectativas de provar vinhos centenários são tão elevadas que quando alguém lança um vinho com quarenta ou cinquenta anos de idade, algo que em qualquer outra região seria um marco histórico, soe a prematuro, como se a região só pudesse desembargar vinhos centenários… e como se todos estivessem dispostos a pagar os custos inerentes a guardar um vinho durante um período de tempo tão prolongado. Só isso poderia explicar que quando é sugerido um vinho tão assombroso como o Blandy’s Malvasia Frasqueira 1988 se discuta mais a idade jovial do vinho que o mérito indiscutível de um dos grandes vinhos do mundo.
No mundo ainda tão desconhecido e pouco valorizado do moscatel de Setúbal só a José Maria da Fonseca se pode orgulhar de ter vinhos verdadeiramente velhos, muitos dos quais se aproximam ou chegam a ultrapassar o primeiro século de vida. Este ano seria virtualmente impossível não destacar o poderoso e viçoso JMF Moscatel de Setúbal Superior 1911, um vinho extraordinariamente concentrado e recentemente engarrafado que foi vendido integralmente num leilão comemorativo organizado pela casa homónima.