Fugas - Vinhos

Adriano Miranda

Trivialidades, curiosidades e valorização da vinha

Por Rui Falcão

Chegados ao mês de Agosto, a época do ano que a maioria dos portugueses reserva para o retiro de férias, para o remanso e para os assuntos menos profundos, é hora de abordar temas mais leves e complacentes, curiosidades do mundo do vinho, que é igualmente um mundo pejado de tradições, um mundo que gosta de preservar as suas heranças e as suas histórias do passado.

E ninguém melhor que os ingleses para compreender o sentido da palavra tradição, ritual e memória histórica. Apesar de historicamente a Inglaterra não ser um país produtor de vinho, situação em rápida transformação na actualidade, a Inglaterra tem sido a placa giratória internacional do vinho desde o final do período medieval, o mercado tradicional e decisivo, o centro da crítica, do conhecimento e do reconhecimento do vinho. Muitos dos principais vinhos tradicionais europeus foram comercializados, promovidos e tornados famosos graças à contribuição inglesa, condição em que podemos situar os vinhos de Bordéus, Champagne, Reno, Jerez e os nossos extraordinários vinho do Porto e vinho da Madeira.

A famosíssima loja e empresa de distribuição Berry Bros & Rudd, mais conhecida na gíria do vinho como a BB&R, reclama para si própria a etiqueta de comerciante de vinho mais antigo do mundo, guardando registos escritos da sua fundação, em 1698. Continua curiosa e teimosamente a manter exactamente o mesmo endereço desde a sua criação há mais de três séculos, o famoso número três de St James Street, no coração de Londres, quase adjacente ao palácio de St James, mantendo a posição de fornecedor oficial da coroa britânica como o tem sido desde 1763. Além do negócio do vinho, a BB&R ficou mundialmente conhecida por ter sido a criadora do bestseller Cutty Sark, durante muitas décadas o whisky mais vendido no decisivo mercado norte-americano.

Como não poderia deixar de acontecer neste tipo de competição, a de mais velho do mundo de qualquer coisa, a data é disputada por parte do também ele comerciante de vinho Hedges & Butler, que alega ter sido fundado em 1667. Apesar da veracidade da data de criação, o facto de a companhia ter sido comprada por uma multinacional, perdendo assim a sua independência, retirou o troféu das mãos da Hedges & Butler para o passar à Berry Bros & Rudd. O distribuidor de vinho mais antigo do novo mundo parece ser a norte-americana Acker Merrall & Condit, fundada originalmente em 1820 como comerciante de vinho e actualmente uma das casas leiloeiras mais famosas do planeta.

Vinhos que por essa época, ao contrário do que sucedia no período medieval, seriam já substancialmente semelhantes ao que hoje chamamos e reconhecemos como vinho. Durante o período medieval, os vinhos eram apreciados sobretudo como base para a elaboração de bebidas medicinais. Uma das mais usuais, bebida para facilitar a digestão, podia ser elaborada com vinho branco ou tinto. O vinho, de preferência doce, seria fervido na companhia de mel. A espuma superficial deveria ser retirada e depois de arrefecido seriam adicionados porções de gengibre, canela, cardamomo, pimenta branca, cravinho e noz-moscada. Após um dia de repouso, o líquido seria filtrado através de panos e guardado durante um período mínimo de um mês até por ser consumido.

Um dos apelos mais românticos no mundo por vezes tão idílico do vinho é o conceito de “vinhas velhas”, termo poético e claramente inspirador que, por não estar quantificado nem regulamentado em nenhuma lei, na verdade não tem qualquer significado real. Há quem utilize o termo quando os vinhos são elaborados com vinhas centenárias, há quem o utilize para vinhas com mais de trinta anos, há quem o utilize para vinhas com pouco mais de quinze anos. No limite, já que não existe nenhum enquadramento legal, seria até possível usar o termo para vinhas com três ou quatro anos de idade. Mas todos sabemos que a simples menção das palavras “vinhas velhas” num qualquer rótulo torna imediatamente o vinho mais apelativo e mais convidativo, autorizando até um preço superior face à idade das vinhas.

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