Naquela altura a aguardente utilizada na fermentação, uma componente essencial do produto acabado e que representa 20% em volume, era fornecida pelo IVP e existia um controle analítico mínimo. Numa análise de rotina conduzida a alguns vinhos do Porto na Alemanha descobriram, que alguns vinhos do Porto Tawny teriam alguns milhares de anos. O que acontecera na realidade era que a aguardente, fornecida pelo IVP, era proveniente da indústria fóssil. Ao que parece o Porto era muito bom e não houve qualquer problema de saúde, pois a aguardente era tão pura e retificada que esses portos é provável que durem para sempre!
Ainda assim, pessoalmente sentia que a produção de vinho do Porto não oferecia desafios enológicos tão estimulantes quanto o vinho de mesa, designadamente na área da fermentação. Assim enquanto estava baseado na Quinta do Bonfim, durante a vindima, comecei a desenvolver algumas fermentações de vinho tinto em pequena escala, escolhendo fermentações de vinho do Porto que haviam sido fortificados num estágio posterior para conseguir estilos mais secos e conseguia assim um dia extra para fermentação com curtimenta.
Eram envelhecidos em cascos portugueses usados, engarrafados e servidos à mesa ao almoço em Gaia, revelando-se bastante populares, especialmente com comerciantes ingleses do Reino Unido que se mostraram interessados em comprá-los, apenas para lhes ser dito que eram apenas experiências de pequena escala do David. Ainda me lembro do 1986, um vinho muito simpático e que ainda se bebia bem nos primeiros anos do novo século.
Deste modo, no final dos anos 80, a minha curiosidade sobre o potencial dos vinhos de mesa no Douro levou a que os Symingtons me dessem o ok para ajudar a Sofia Berqvist a lançar o seu projeto de vinhos de mesa na Quinta de La Rosa. Foram tempos entusiasmantes. O Douro estava a acordar para a oportunidade de produzir grandes vinhos de mesa, beneficiando da sua incrível variedade de castas e do seu infindável micro e meso climas.
O Dirk Niepoort estava então a começar e recordo-me de fazer provas com ele e de comparar os meus vinhos mais equilibrados de La Rosa com o estilo mais rústico e tânico do Redoma. Claro que achava que os meus eram melhores e ele defendia o seu estilo mais improvisado e tem sido fascinante ver como o seu estilo e os vinhos do Douro têm evoluído e melhorado ao longo dos anos. Confesso que sou um grande fã do Dirk e dos vinhos dele e reconheço-lhe muitas qualidades. É uma das pessoas mais generosas que já conheci e ainda tenho algumas garrafas de porto vintage com que ele me presenteou durante a minha estadia no norte.
Em 1994 seguiu-se a Quinta do Crasto, uma propriedade magnífica no Douro, com incríveis vinhas velhas e uma família muito talentosa por detrás do projeto. A Quinta do Crasto tinha sido produtora de vinhos do Porto e quando comecei havia uma certa dose de conflito sobre que fruta seria destinada à produção de Porto e qual iria para o vinho de mesa. Obviamente que todos queríamos as cobiçadas “Vinhas Velhas”. Numa ocasião havia um espetacular lagar trabalhado de Touriga Nacional destinado a vinho do Porto que nós transferimos durante a noite para um tanque de aço inoxidável para produzir vinho tinto, resultando num confronto entre ambas as partes na manhã seguinte. Felizmente tivemos o apoio do Jorge Roquette, cuja busca pela perfeição em vinho tinto feito a partir de parcelas de vinhas velhas resultou em grandes vinhos como Maria Teresa e Vinha da Ponte.