Fugas - Vinhos

DR

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Roteiro nostálgico do Barossa Valley ao Alentejo

Enquanto estive no Douro merece ainda destaque o projeto do Fojo, no Vale do Pinhão, com quem estive envolvido nas primeiras vindimas. A primeira, em 1996, foi um enorme sucesso, em grande parte graças a uma classificação dada pela Jancis Robinson. Esse vinho foi produzido em condições bastante rudimentares, sem capacidade de refrigeração durante a fermentação que durou três dias e chegou a atingir mais de 30ºC. Para mim este vinho foi sempre um enigma. Incrivelmente denso e complexo mas também macio e um pouco alternativo.

No seguimento de uma chamada do Dr. José Roquette e de uma visita à Herdade do Esporão em 1992 senti que estava na altura de deixar para trás o Norte, os grandes anos que passei no setor do vinho do Porto e o movimento emergente dos vinhos tintos no Douro.

O Luís Duarte era o enólogo residente naquela altura no Esporão e felizmente demo-nos logo bem e começamos a melhorar a qualidade dos vinhos. Um processo longo, envolvendo uma maior variedade de castas, uma viticultura aprimorada e um uso mais racional dos barris de carvalho para broncos e tintos.

Ajudei a introduzir algumas castas estrangeiras. O Syrah e o Semillon adaptaram-se bem ao clima e permitiram reforçar algumas castas locais, como Trincadeira, Aragonês, Touriga Nacional, bem como Roupeiro, Arinto e Antão Vaz. As novas variedades incluíram também Verdelho e algo que não esperava, Alicante Bouchet. Percebi no quão importante se podia tornar, especialmente com produções baixas e a partir da década de 2000 tornou-se uma casta essencial para os nossos melhores lotes bem como enquanto monocasta.

O Monte Velho foi o vinho que ajudou a empresa a crescer, a um ritmo semi-alarmante ao longo da década de 1990 e de 2000. De um pequeno lote de 50.000 litros em 1991 aumentámos cerca de 100 vezes esse volume em 2016.
Para mim enquanto enólogo senti que tinha atingido a maturidade após receber uma visita do José Maria Soares Franco no final dos anos 90. Ele provou todo o nosso leque de castas da vindima de 1994, Trincadeira, Aragonês e Syrah, e ainda me recordo da sua reação, na medida em que ele nunca acreditara que fosse realmente possível produzir vinhos de qualidade no Alentejo.

Em 2008 comprámos a Quinta dos Murças e para mim foi gratificante e desafiante poder voltar ao Douro e ajudar a montar este projeto. As coisas mudaram muito desde os meus anos em La Rosa e no Crasto, sendo muito mais difícil hoje em dia produzir vinhos que tenham impacto imediato, pois já existem tantos enólogos a fazer vinhos de classe mundial.   

Ao longo dos anos conseguimos alcançar imenso no Esporão, por vezes crescendo de forma algo desmesurada para corresponder às exigências do mercado. Em anos recentes temo-nos tornado numa empresa mais ambientalmente responsável, com um tratamento mais sustentável da viticultura e da enologia, estando já a poucos passos de nos tornarmos completamente orgânicos na vinha. Acabei de completar a minha 25ª vindima no Esporão e mantenho um forte entusiasmo relativamente aos desafios que se avizinham. Espero que continuem por muitos e bons anos.

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