Fugas - Vinhos

Adriano Miranda

Dez desejos pouco extravagantes para 2017

Por Pedro Garcias

Os últimos anos têm sido bons para o vinho português, mas os próximos poderão ser ainda melhores, se não houver grandes choques na economia e o país continuar a atrair turistas. 2017 já será memorável se se cumprirem alguns destes desejos.

1. Que o Alentejo pare com a importação de castas francesas. Já chega. Há mais vida para além da Syrah, do Petit Verdot, do Cabernet Sauvignon, do Viognier, do Sauvignon Blanc. Olhem para as poucas vinhas velhas que ainda vão sobrevivendo na região e repliquem as melhores variedades. Já nem precisam de adaptação. Recuperem o Castelão, a Tinta Grossa, o Moreto. Na era da “geração curiosa”, o consumidor procura vinhos diferentes, não boas imitações.

2. Que o Dão olhe para trás e aprenda com os seus tintos clássicos do século passado, para ver se perde a tentação recente de fazer vinhos com mais álcool, mais madeira e muito mais fruta de origem duvidosa. Os tempos até são favoráveis aos vinhos elegantes, finos e digestivos, que fazem a marca da região. Há boas excepções, claro, mas quase que se contam pelos dedos. É preciso dar mais tempo ao vinho, para depois se poder pedir mais dinheiro por ele. Já agora: concedam ao Alfrocheiro todas as honras possíveis, não apenas à Touriga Nacional, e não desistam de levar o Encruzado até ao olimpo, que a casta merece. E percam a vergonha com a Uva Cão, cuja acidez é uma bênção para os vinhos brancos.

3. Que a Bairrada acredite que o seu futuro passa mesmo por vender milhões de garrafas de espumante, com uvas locais, não compradas por vias travessas noutras regiões. E que os tintos e os brancos devem ser de nicho e pagos a bom preço. A Bairrada é uma espécie de “petit France”, sem queijo mas com um pouco de Champanhe, Borgonha e Bordéus.

4. Que Lisboa não emule o Alentejo e se deixe afrancesar de mais. Há grandes castas nacionais que podem fazer milagres junto ao Atlântico. Porquê Roussanne ou Viognier quando temos Arinto e Alvarinho?

5. Que o Douro, com a sua imensidão, se divida em pequenas sub-regiões, para potenciar ainda mais a sua enorme riqueza e diversidade; que passe a ser possível colocar nos rótulos o nome das localidades onde o vinho tem origem, como acontece em qualquer região francesa; que a certificação dos vinhos seja muito mais exigente, para não ser possível encontrar reservas e grandes reservas a preços de Champomy; que o Instituto dos Vinhos do Douro e do Porto deixe de ter um representante do Estado e passe a ser gerido por representantes do comércio e da produção, como nas outras regiões vitivinícolas; e, já agora, que as taxas pagas pelos viticultores para promoção sejam mesmo gastas em promoção e não desviadadas para os cofres do Tesouro.

6. Que o vinho do Porto deixe de ser remetido quase exclusivamente para o final das refeições, quando já se bebeu espumante, branco e tinto e um cálice de vinho doce e com 20% de álcool, muitas vezes acompanhado de queijo, é um verdadeiro tiro no fígado. Façam como os antigos e experimentem o prazer de beber vinho do Porto socialmente e fora das refeições.

7. Que o vinho Madeira fique um pouco mais barato, para que um número maior de portugueses possa desfrutar de um dos melhores vinhos do mundo.

8. Que a Touriga Nacional deixe de ser tão diabolizada por cá, quando no mundo ainda é uma desconhecida. Ficar na moda tem destes perigos, mas desdenhar de uma casta por ser demasiado boa, por marcar muito os vinhos, não é um bom argumento. Se for bem usada, de preferência em lote, a Touriga Nacional continua a ser uma das melhores castas nacionais, se não mesmo a melhor. Que outra é tão bem sucedida em tantas regiões do país? Se calhar, o seu problema é mesmo esse. O seu terroir é o Dão e o Douro.

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