Sim, há muita história, arquitectura e religião. Entre as suas paredes viveram-se momentos únicos da história de Portugal, pelos seus jardins passearam príncipes e princesas, nos seus alojamentos dormiram monarcas, nos seus territórios sagrados foram sepultadas celebridades, pelos seus espaços se tomaram decisões que definiram o país. Muitas voltas deu sobre si próprio este convento nascido da aparição de uma imagem da virgem sobre um espinheiro no século XV. Até, mais de meio milénio depois, se reerguer e inaugurar como um hotel de luxo, tendo sido o primeiro cinco estrelas alentejano.
A dois passos de Évora, corro as pesadas cortinas dos janelões do meu quarto em ala conventual, onde o peso da história se sente também no mobiliário de época. O sol cai sobre os campos, reflecte-se ainda na piscina, o jardim mostra-se viçoso, a passarada faz a sua orquestra. Séculos de história unem-se e sentem-se neste cenário, um refúgio único, cuidado ao detalhe, que faz também da cultura local a sua força, da gastronomia aos vinhos e à hospitalidade.
À entrada, o Convento do Espinheiro mostra logo o seu charme numa restaurada e romântica imponência monumental (a igreja e conjunto são, aliás, monumento nacional). Pressentem-se mil e uma histórias a cercarem toda a construção conventual, a que em 2008 foram acrescentadas novas alas design em baixa construção e tom minimalista. Por todo o lado, há recantos para ir descobrindo por entre os jardins, pequenos esconderijos e tanques, retoques arquitectónicos alentejanos. E tudo num ambiente de hotel de luxo clássico — integra, aliás, a exclusivíssima rede Luxury Collection Hotel & Spa —, entre mobiliário secular, gordos tapetes trabalhados, ícones e candelabros, estátuas e quadros de momentos históricos, conjuntos de azulejos artísticos, um sem-fim de maravilhas e milagres de encher o olho que cada hóspede poderá descobrir numa real visita guiada pela história de Portugal. Das decisivas Cortes de Évora de D. João II em 1481 à notícia de que terá sido aqui que D. Manuel I recebeu a confirmação da chegada de Vasco da Gama à Índia ou à capela depois dos jardins construída por Garcia de Resende junto a uma oliveira milenar.
E muito mais se passou (e passa) neste convento que, após o milagre da aparição da virgem, foi erigido a meio do século XV e entregue aos monges de São Jerónimo. Assim começou tudo, dos milagres às lendas. Começou aí a peregrinação dos fiéis, fez-se ermida, fez-se convento com protecção real e entregue aos monges de São Jerónimo, até às ordens serem banidas. Em pleno século XXI, a peregrinação continua, sob motes mais hedonistas mas também ainda religiosos, já que há também quem aprecie a religiosidade do local (e, pelo menos uma vez por mês, ou para casamentos e ocasiões especiais, também há celebração na igreja). Com a extinção das ordens religiosas, o convento seria vendido em hasta pública e, após usos vários, entrou em decadência. Já nos finais do século XX, uma família madeirense, os Camacho, decidiu adquirir a propriedade — que é também um importante panteão —, porque o seu patriarca se “apaixonou” pelo espaço. É aqui que começa a verdadeira nova história do Espinheiro, renovado e reinventado, tornado refúgio de luxo nesta colina entre Évora e Estremoz.
Agora vive-se a história mas as peregrinações de fiéis são sob novos moldes, embora qualquer pessoa possa visitar o conjunto e, acima de tudo, a igreja, alvo de uma renovação assombrosa, ao detalhe, do altar e ícones ao impressionante trabalho em talha dourada ou conjuntos de azulejos religiosos (e até com referências maçónicas) — só falta restaurar o velho órgão, conta-nos Maria Carapinha, a directora do hotel, que, nascida em Évora, depois de viajar pelo mundo, voltou para a sua terra para liderar as vendas e marketing do Espinheiro e é, desde o ano passado, a sua nova directora (e uma guia exímia a relatar cada detalhe desta “sua” casa).
É que este nosso hotel, está visto, é não só um museu vivo, onde cada luxo é servido na sua exacta medida, mas também uma verdadeira casa familiar, onde são muitos os profissionais que estão cá desde o início. É o caso do escanção Cristiano Santos, que começou no bar, foi aprendendo tudo sobre vinhos e será nosso guia numa prova divina por vinhos alentejanos e portugueses (ressalte-se que o convento também tem uma pequena vinha, embora nem sempre suficiente ou de qualidade para produzir vinho). E há também novas chegadas a abrilhantar o elenco da casa. Como a do chef Bouazza Bouhlani, de ascendência marroquina mas que fez a sua carreira por Portugal e que agora lidera as cozinhas conventuais, apresentando uma cozinha mediterrânica profundamente alicerçada nos produtos e tradições do Alentejo: de um “risotto de camarão para um robalo perfumado com poejo e funcho” a um “dueto de porco do montado alentejano com miga de tomate”, às migas, sopas e açordas, aos doces conventuais reinterpretados; prazer, gula e muita arte que, só por si, valem uma visita.
Mas, por estes divinos oito hectares, não falta que fazer. Não só pelos restaurantes (Divinus, na antiga adega, e Claustrus — para refeições estivais nos claustros) ou pelos bares (Pulpitus, interior e íntimo, e Cisterna, o bar de vinhos). Outra das grandes atracções é um premiado spa (já considerado um dos melhores de Portugal e da Europa, tal como todo o hotel), baptizado de Diana como a deusa que marca o imaginário eborense. Nós fizemos a experiência com uma massagem que nos pôs em sintonia perfeita com a calma alentejana. Foi mesmo antes de um mergulho na piscina interior e panorâmica, um salto ao pequeno jacuzzi anexo e passagens pelos retemperadores banho turco e sauna. Nós ficámo-nos pela massagem mas sublinhe-se que no spa pode fazer-se muito mais, entre tratamentos desintoxicantes, corporais e faciais, massagens específicas, hidroterapia ou mesmo acupunctura e até programa especial para os mais pequenos ou futuras mamãs.
Já o alojamento é ao gosto histórico ou mais moderno do hóspede — há 92 quartos de diversas tipologias para escolher. O nosso quarto é uma maravilha conventual — porém, há muito mais acima (e diferente) do nosso, dos espaços mais recentes com design anos 1950 até ao derradeiro luxo das suítes históricas, incluindo uma real, baptizada de D. João II, com quarto principal, salão de estar e um vasto terraço com vistas sedutoras. Tudo majestoso, como se quer.
Mas, por aqui, confessamos, tudo nos parece majestoso. Porque este hotel especial é, definitivamente, uma jóia da coroa da hotelaria portuguesa.
A Fugas esteve alojada a convite do Convento do Espinheiro
- Nome
- Convento do Espinheiro
- Local
- Évora, Canaviais, Convento do Espinheiro
- Telefone
- 266788200
- Website
- http://www.conventodoespinheiro.com/
- Observações
- Além do restaurante e bares, jardins e hortas ou spa, há área de eventos e congressos, campo de ténis, paddle, parque infantil. O hotel também proporciona outras actividades ao longo da semana, como provas de vinhos e aulas de cozinha.