Fugas - hotéis

Dona Antónia andou por aqui

Por Sandra Silva Costa ,

Agora que no Douro não se fala de outra coisa que não sejam as vindimas, Sandra Silva Costa (texto) aproveita para contar a experiência que teve na Quinta do Vallado, que se abriu ao enoturismo em 2006. Em boa hora, porque, sem luxos desmesurados, tem tudo o que é preciso para garantir uma estadia no ponto, como mostram as fotos de Paulo Ricca.
Por mais Douro que já tenhamos visto, nunca nos cansamos. Pode parecer suspeito, monótono, gasto, o que quiserem, mas de cada vez que lá vamos voltamos novamente rendidos a uma paisagem que, se tivesse sido traçada a régua e esquadro, não seria tão perfeita. A última vez que lá fomos ainda era Verão - e o dia era de Verão em cheio, acima dos 40 graus sem margem para dúvidas - e quando chegámos à Quinta do Vallado, a escassos minutos da Régua, tudo o que nos apetecia era deixarmo-nos cair na água fresca da piscina com vista panorâmica sobre os vinhedos em volta.

Culpa nossa, chegámos mesmo em cima da hora do almoço e Francisco Ferreira, um dos proprietários da quinta, tinha já a mesa posta - a piscina teve de esperar. Presunto, queijos e alheira para abrir o apetite, costelinhas grelhadas para compor o estômago e uma sobremesa de laranjas com vinho do Porto - assim se escreveu a refeição distendida, regada, claro, pelos vinhos da casa.

Outrora propriedade da lendária Dona Antónia Ferreira, a Ferreirinha, a solarenga Quinta do Vallado foi construída em 1716 e continua na posse da família. Está situada junto à foz do Corgo, um afluente do Douro, e em 2006 passou a abrir-se ao enoturismo. Tem apenas cinco quartos (quatro "normais", que se distinguem pelas cores - há o verde, o amarelo, o azul e o azul marinho) e uma suite (terracota).

Foi esta que nos calhou em sorte. Quanto ao quarto propriamente dito, sem grandes luxos, tem duas camas generosas, rosas sob a forma de quadros e está tudo praticamente dito. A suite terracota tem ainda uma área de estar com um sofá, uma pequena mesa de apoio onde repousam alguns livros e revistas, meia dúzia de quadros nas paredes e rosas cheirosas no móvel de canto - e uma janela que nos traz o Douro para dentro e nos leva para fora para o Douro.

É para lá que vamos agora. Andamos pelos caminhos que nos conduzem à desejada piscina, deitamos o olho aos muros de xisto e cruzamos os dedos para que os figos que crescem de uma árvore centenária já estejam maduros. Quase sem aviso prévio, caímos finalmente na água e demoramo-nos por lá, que o sol continua a queimar. Só depois nos esticamos na espreguiçadeira, que vamos movendo à procura de luz ou de sombra.

Damos de caras com os socalcos e pensamos que não queremos que o dia acabe. Há-de acabar, mas na verdade não lamentaremos a visão de fim de tarde que temos pela frente. Ao volante de um jipe, Francisco faz as honras da casa e mostra-nos a vinha, espalhada por 64 hectares. Explica-nos as diferentes castas que tem plantadas, dá-nos a provar as uvas que, em duas semanas, começarão a ser vindimadas, e depois oferecenos, de mão beijada, um quase pôr do sol que nos há-de ficar gravado na retina. Se juntarmos tudo o que já vimos até agora, talvez percebamos melhor por que é que a revista americana "Travel and Leisure" incluiu o Vallado na sua lista de hotéis aconselhados em todo o mundo.

Antes de ficarmos completamente entregues à nossa sorte, Francisco mostra-nos ainda a nova adega da Quinta do Vallado. Tem a assinatura de Francisco Vieira de Campos e Cristina Guedes, jovens arquitectos da chamada escola do Porto, discípulos de Souto Moura e Siza Vieira, e promete dar que falar. O edifício, que José Augusto Moreira, num texto publicado no P2 a 30 de Agosto, definiu como "um enorme paralelepípedo que brota da montanha", arrisca-se a ser um monumento arquitectónico na região, pelo que merece uma visita atempada.

Agora que a noite começa a cair, o ocre dos edifícios da Quinta do Vallado ganha outro tom. Saímos para jantar (as refeições são apenas servidas por encomenda) e voltamos para dormir. Não se ouve nada mais do que seria suposto. No dia seguinte, acordamos e temos à espera um pequeno-almoço no ponto - nem a mais nem a menos - servido numa varanda onde há guarda-sóis brancos. Há pão fresco e estaladiço, sumo de laranja, queijo, fiambre, compotas, iogurtes, uvas da quinta e melancia - e uns queques de chocolate capazes de fazerem perder a cabeça a qualquer um. Não resistimos: comemos dois.

[A Quinta do Vallado foi distinguida com uma menção honrosa no Prémio de Arquitectura do Douro 2011, pelo projecto de remodelação e ampliação do edifício, do arquitecto Francisco Vieira de Campos. O grande vencedor foi Álvaro Siza, com o projecto do Armazém da Quinta do Portal]

Como ir

Do Porto, seguir a A4 até Amarante e depois continuar pelo IP4. Passar Vila Real e apanhar a A24 até à Régua. Uma vez na Régua, seguir a marginal, passar pelo viaduto da A24 e seguir a estrada que ladeia o rio Corgo, sempre com a água à direita. Três quilómetros depois, passa-se uma ponte sobre o rio e vira-se à direita, atravessando a linha férrea. Seguir na estrada e a quinta fica poucos metros à frente.

Onde comer

Pode fazer refeições na Quinta do Vallado - mas apenas por encomenda. Estas podem ser tomadas debaixo da ramada ou na zona da casa que foi recuperada pelo arquitecto Souto Moura. A cozinha, essa, teve ajuda à instalação do chefe Miguel Castro Silva. Fora dos muros da propriedade ocre, aconselhamos o incontornável D.O.C., em Armamar, que serve os pratos de criação apuradíssima do chefe Rui Paula num cenário praticamente pousado sobre o rio.

D.O.C.
Estrada Nacional 222
Folgosa
5110-204 Armamar
Tel.: 254858123; 910508895
www.restaurantedoc.com
GPS: 41º 9''5. 22''''N; 7º 40''57.45''''W

O que fazer

Não faltam coisas para fazer na região, mas, por uma questão de princípio, sugerimos apenas as que experimentámos. O Museu do Douro, a caminho de completar um ano, é o mais recente "must see" na Régua. A exposição "O Barão de Forrester - Um Inglês no Douro, Razão e Sentimento" foi a âncora neste ano zero do museu e está patente até ao próximo dia 1 - razão mais do que sufi ciente para se apressar. Para ver a exposição "O Universo de Rafael Bordalo Pinheiro - Caricatura e Cerâmica" tem mais tempo, até 31 de Janeiro do próximo ano. Para além disso, a exposição permanente do Museu do Douro, "Memória da terra do vinho", no Solar do Vinho do Porto, é também recomendável. O bilhete de acesso ao museu custa 5 euros e confere direito à entrada nos dois espaços.

Museu do Douro
Rua da Ferreirinha, 43
5050-256 Peso da Régua
Tel.: 254324177
www.museudodouro.pt
geral@museudodouro.pt
Horário: das 10h00 às 18h00 no Inverno e das 10h00 às 20h00 no Verão. Encerra às segundas-feiras.

Há outro lugar que a Fugas aconselha a não perder: o miradouro de São Leonardo da Galafura. Ficará a uns 20 minutos de carro da Régua mas a vista que dali se alcança é absolutamente soberba. Pode ser que se cruze com várias excursões e que, uma vez lá em cima, preferisse um pouco mais de silêncio, mas, ainda assim, insistimos que vale mesmo a pena. É o "Douro sublimado", é um "poema geológico", como escreveu Miguel Torga.

MAIS

O Douro por minha conta

Nome
Quinta do Vallado
Local
Peso da Régua, Vilarinho dos Freires, Vilarinho dos Freires
Telefone
254323147
Website
http://www.quintadovallado.com
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