Fugas - hotéis

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La Mamounia: Sonhos de luxo nos jardins encantados de Marraquexe

Por Alexandra Prado Coelho

O recentemente renovado La Mamounia, espaço histórico de Marraquexe, quer ser mais do que um hotel - quer ser um mundo longe do mundo. Mas há cada vez mais as alternativas ao luxo: os riads que deixam o bulício lá fora.

É o momento das despedidas junto à porta do La Mamounia, o mítico hotel de Marraquexe e, confessamos a Denys Courtier, ficámos fascinados com a diversidade dos uniformes dos funcionários do hotel. O director-executivo sorri e permite-se fazer-nos uma ligeira correcção. "Nós chamamos-lhes vêtements d' images. Achamos uniformes muito vulgar." E, de facto, no La Mamounia nada é vulgar.

A forma como os 170 funcionários do hotel estão vestidos ultrapassa em muito a roupa, tinha-nos explicado Lamia El Ghorfi, responsável pela comunicação. "Não há sinalética no hotel. O pessoal é ele mesmo a sinalética." Cada traje é pensado em função do lugar dentro do La Mamounia, cada serviço ou departamento tem um e cada funcionário tem um vêtement d' image diferente para o dia, para a noite, para o Verão, para o Inverno, num total de perto de 800 roupagens.

Tentamos seguir a lógica e orientarmo-nos no hotel a partir dos trajes com que nos cruzamos. Na Galeria Majorelle funciona o bar italiano. "É o coração do hotel e o único dos quatro bares que está aberto das 11h à 1h." Nas recentes obras de remodelação do designer Jacques Garcia - o La Mamounia esteve fechado três anos, renascendo em 2009 - o tecto pintado por Jacques Majorelle, o artista plástico francês que no início do século XX se instalou em Marraquexe, foi "redescoberto".

"Sabia-se que este tecto pintado existia, mas estava escondido atrás de outro", conta Lamia. Agora, no eixo entre a entrada e os jardins, o tecto de Majorelle é novamente o centro. E aqui as empregadas de mesa trajam de amarelo-torrado porque essa é também a cor dominante da pintura de Majorelle. E, reparamos agora, é a cor dominante no chão, onde começa um longo tapete que nos há-de acompanhar por grande parte do hotel - são "28 mil m2 de tapete, feito exclusivamente para aqui".

A experiência com os vêtements d' images começa logo quando se entra no La Mamounia. Como tudo no hotel, esse momento foi pensado para ser uma experiência. Filme de Hollywood? Conto das Mil e Uma Noites? Numa coreografia que se repete mil vezes ao longo do dia, dois porteiros de esvoaçantes capas brancas e luvas abrem o primeiro conjunto de portas. Logo de seguida, novo conjunto de portas e mais outros dois porteiros, integralmente de branco, a abri-las do interior do hotel.

No átrio, ainda estamos a tentar perceber o espaço e já nos oferecem a bebida tradicional de boas-vindas em Marrocos: leite de amêndoas fresco, com um pouco de açúcar e água de rosas. E também uma tâmara, como se fôssemos viajantes que atravessaram o deserto e encontram finalmente um oásis que os acolhe.

O La Mamounia quer ser o nosso oásis, quer que nos percamos dentro dele e que esqueçamos que existe uma porta de saída. Há, aliás, 2264 portas - alguma vez encontraremos a da saída?

Podemos viver aqui para sempre, guiando-nos pelos vêtements d' image para saber se é dia ou noite, Verão ou Inverno. Viver esquecidos do mundo como no filme italiano O Jardim dos Finzi-Contini, em que uma família de judeus da alta sociedade vive no seu jardim, jogando ténis e recebendo os amigos, enquanto o mundo lá fora mergulha na II Guerra Mundial.

Também o Mamounia foi refúgio para quem queria esquecer o mundo durante a II Guerra. Winston Churchill, o primeiro-ministro britânico e o mais célebre dos muitos hóspedes célebres do hotel, dizia que este era "o sítio mais belo de todo o mundo". Diz-se que nos anos 1940 esses hóspedes, vindos da Europa e dos Estados Unidos para se abrigarem nos jardins que um dia o rei Sidi Mohammed Ben Abdellah ofereceu ao seu filho Mamoun, traziam as próprias mobílias para se sentirem completamente em casa.

Antes disso, apesar de ser já uma referência em Marrocos, o La Mamounia (construído em 1923 pelos arquitectos Henri Prost e Antoine Marchisio por encomenda da Companhia de Caminho de Ferro) tinha apenas 50 quartos. Em 1946 cresceu para 100 quartos, e depois sofreu remodelações nos anos 1950, em 1986 e por fim em 2006, já com Jacques Garcia que, explica Lamia, "recuperou muito do espírito original". Hoje o hotel tem 210 quartos, 71 suites e três riads cada um com três quartos, salões marroquinos e piscina privada.

E tem um fabuloso spa com 2500 m2, onde são usados cinco produtos com a assinatura Mamounia: o ghassoul (argila especial muito utilizada em Marrocos), sabão negro, água de flor de laranjeira, água de rosas e óleo de argão. É ali que Lamia nos chama a atenção para a música que paira no ar. Também ela foi feita especialmente para aqui, tal como o leve perfume que se sente por todo o hotel. "Um cheiro e uma música que só existem aqui." Para que, a cada regresso, tenhamos a sensação, sem sabermos exactamente porquê, de que voltámos a casa.


O feitiço que prende

À noite jantamos no restaurante marroquino, com música ao vivo, e a cozinha do chef Rachid Agouray, que cruza sabiamente o tradicional e o contemporâneo. Num país ainda muito agarrado à gastronomia tradicional, Agouray, que chegou ao La Mamounia há 25 anos - "Era a minha esperança, o meu sonho, e consegui", conta -, arriscou inovar. Era muito novo quando aqui entrou, mas percebeu rapidamente que se queria chegar a chef era preciso ser "paciente, atento, e antecipar um pouco as coisas".

Depois de ter passado por todas as cozinhas do hotel (que tem também um restaurante italiano e um francês, para além do buffet dos pequenos-almoços, à beira da piscina) aterrou em Paris no início dos anos 1990, aperfeiçoando aí o seu estilo. E quando o Mamounia reabriu, ficou finalmente à frente do restaurante marroquino, onde esta noite experimentamos desde as tradicionais saladas marroquinas e um clássico cuscuz com sete legumes até uma pastilla (empada de massa folhada, que habitualmente se come com pombo) com lagosta.

Agouray fala da importância do equilíbrio, sobretudo no uso das especiarias, sempre presentes na cozinha marroquina. "As especiarias não vão com toda a cozinha, uma coisa tem que saber a cominhos, outra a alho, outra a gengibre. Não se pode pôr cominhos em tudo, ou o açafrão, ou a pimenta, se não sabe tudo ao mesmo." E esta é uma cozinha de sabores fortes, mas também de subtilezas.

Terminado o jantar, passeamos pelo jardim mergulhado no silêncio que um dia o rei ofereceu ao filho e cujas festas ficaram na memória de Marraquexe. Na alameda rodeada de oliveiras - há 400 com mais de 700 anos nos jardins do Mamounia, 800 laranjeiras, 500 palmeiras e 6000 roseiras brancas - de repente, o silêncio é interrompido por um cântico que se eleva, à vez, de diferentes pontos da cidade. É o chamamento para a oração muçulmana, que parece vir de todos os lados, numa mistura de vozes que sobe ao céu.

Quando termina, o jardim volta a silenciar-se, mas ao longe ouve-se, abafado, o batuque de tambores que vêm da praça Jemaa El Fnaa. Há festa na praça, como todas as noites - há encantadores de serpentes, aguadeiros, charlatões a vender poções mágicas, há restaurantes envoltos em fumo dos grelhadores, vendedores de caracóis e sumos de laranja. Há a vida toda lá fora. Mas nós, presos por um qualquer encantamento, como os louros filhos dos Finzi-Contini, ficamos no jardim do La Mamounia.


Riads das Mil e Uma Noites

Antes de voltar ao quarto, passamos pelo Bar Churchill, o bar americano do hotel criado nos anos 1970. Uma cantora, grande e de voz rouca, actua. As paredes vermelhas e fotos de cantores de jazz nada tâm a ver com o resto do Mamounia. Mas a música é perfeita: "Summertime and the livin" is easy/Fish are jumpin" and the cotton is high/Oh, your daddy"s rich and your ma is good-lookin"/So hush, little baby; don"t you cry." 

Este é sem dúvida o hotel histórico de Marraquexe, mas nos últimos anos a concorrência tem-se tornado cada vez mais forte com investimentos impressionantes nos palácios-hotel da cidade - chefs três estrelas Michelin, decorações orientalistas,villas privadas dentro dos hotéis entre jardins de sonho, lagos e até ilhas.

Mas quem não tiver dinheiro para este luxo pode sempre optar por um riad. Diz-se (neste caso, diz o Financial Times) que o número de riads na medina de Marraquexe é já o mesmo que o das Mil e Uma Noites. Fomos conhecer dois. 

O Riad 72 fica atrás de uma porta pesada, de madeira, numa ruela estreita, a dez minutos a pé da Jemaa el-Fnaa. Somos recebidos no pátio interior com uma taça de água de flor de rosas para lavarmos as mãos e um enorme copo de sumo de laranjas acabadas de espremer por Fatouma, a sorridente berbere que aqui se ocupa da cozinha.

As paredes do riad são altas e o pátio é fresco, protegido pelas folhas das bananeiras. Ouvem-se os pássaros lá em cima, mas de resto os ruídos da rua continuam distantes. A temperatura aqui é sempre alguns graus abaixo do que a do exterior - a ideia é precisamente a de que os muros altos criem essa protecção contra o calor. E lá fora está mesmo muito calor. 

Esta era, como todos os riads, uma antiga casa de uma família abastada de Marraquexe. Foi comprada há 15 anos por uma italiana, que o decorou num estilo que mistura o italiano com o marroquino. Ficamos na suite (há mais três quartos), imensa, a fazer lembrar o palácio do Alhambra, em Espanha, com uma cúpula redonda em cima da cama por onde se vê o céu (à noite é coberta para que o luar não nos perturbe o sono). 

De manhã, uma luz ténue entra por três meias luas rendilhadas, iluminando ligeiramente o quarto. Descemos para o pátio e Fatouma já está a preparar o pequeno-almoço com especialidades marroquinas, crepes com manteiga e doces caseiros feitos por ela, que tenta explicar-nos as receitas berberes.

Saímos para mais um dia nas ruas de Marraquexe. Perdemos-nos pelos souks, entre montes de folhas de menta, especiarias de todas as cores, roupas, pulseiras, trabalhos em couro, em metal, um almoço de espetadas de diferentes carnes e molhos, muito calor, palácios e jardins frescos, e mais souks - e, ao cair do dia, a multidão a começar a chegar à Jemaa el-Fnaa, e nós a assistirmos enquanto bebemos um sumo de laranja no velhinho Café de France.

Suados e cansados, procuramos mais um oásis. Desta vez é o riad Dar Warda que nos abre as portas, também no fundo de uma ruela estreita e escura. E, mais uma vez, a sensação de que passamos de um mundo para outro muito diferente. Sombra, calma, um pequeno lago com pétalas de rosa, chá de menta e bolinhos. Os quartos são mais simples do que os do Riad 72, mas muito confortáveis e passamos o dia seguinte entre as várias sombras do Dar Warda - do terceiro piso vê-se a cidade e as montanhas vermelhas ao longe. No pátio do piso térreo, nem nos lembramos que há uma cidade lá fora. 

Os jardins de Marraquexe têm este efeito. Como no La Mamounia, o mundo deixa de existir. E no meio de duas mil portas não queremos encontrar a que nos leva à saída.

Como ir 
A TAP tem voos directos para Marraquexe quatro vezes por semana (às segundas, quintas, sextas e domingos). Ida e volta por 249€, já com taxas incluídas.

Quando ir 
Em qualquer altura do ano, mas o Verão é de evitar. Em Julho e Agosto as temperaturas atingem facilmente os 40 graus, o que torna quase impossível qualquer actividade de dia. De qualquer forma, a cidade anima sempre à noite, e tanto a Jemaa el-Fnaa como os souks mantêm-se em actividade pela noite dentro. 

Onde ficar
No La Mamounia, se se quiser a experiência de dormir no mais histórico dos hotéis da cidade. Recentemente renovado, com um luxuoso spa e três restaurantes (marroquino, francês e italiano), vários bares, piscina e um belíssimo jardim, é uma excelente opção para quem tiver um orçamento mais folgado. Os riads são uma alternativa aos hotéis, oferecendo um espaço mais familiar (geralmente têm quatro ou cinco quartos, apenas) e são uma solução mais económica. Duas sugestões: o Riad 72 (os três quartos têm preços que oscilam entre os 100 e os 200 euros, conforme a época baixa, média ou alta, e a suite tem preços entre os 200 e os 300 euros). O Dar Warda tem cinco quartos com preços entre os 90 euros e os 110 ; a suite custa 110 em época baixa e 130 na alta. Ambos os riads incluem pequeno-almoço e servem outras refeições se se pedir antecipadamente. Reservas através da Atmosphere Hotels (www.atmospherehotels.pt)

Onde comer
Para conhecer Marraquexe é indispensável comer nas bancas da Jemaa el-Fnaa. Há sumos de laranja natural e caracóis. E há os restaurantes onde se comem as espetadas de frango ou carne picada, peixe frito e várias outras especialidades marroquinas, entre as quais as cabeças de borrego, que estão dispostas à nossa frente e que os habitantes da cidade garantem ser a melhor de todas as iguarias. Se se optar por uma versão mais elitista da cozinha marroquina, o restaurante marroquino do La Mamounia é o local a ir. Entre o tradicional e o contemporâneo, descobrem-se novas formas de apresentar velhos clássicos. Nos souks também se encontram bons locais para comer a preços acessíveis, e pode-se optar entre os muito tradicionais, com a incontornável tanjia (carne cozinhada num pote de barro), especialidade de Marraquexe, e os mais modernos como o Le Bouganvillier, num pátio muito agradável no n.º 33 da Rue Mouassine, na medina, onde se bebem excelentes sumos naturais de frutas e se come uma pastilla (folhado coberto com açúcar em pó e canela) de frango.

Contactos

La Mamounia
Avenida Bab Jdid, Marraquexe, Marrocos 

Dar Warda
Sidi Bouamare, 266. Riad Lâarouss, Medina, Marraquexe, Marrocos 

Riad 72
Arset Awsel, 72. Bab Doukkala, Marraquexe, Marrocos


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A Fugas viajou a convite da TAP e ficou alojada a convite do La Mamounia, do Riad 72 e do riad Dar Warda (Atmosphere Hotels)

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