Viveram felizes para sempre. Assim se chama o quarto onde ficamos e é entre muito amor que adormecemos; ao nosso lado quase todos os casais apaixonados das histórias. Está lá a Cinderela com o seu príncipe encantado e a fada madrinha, há ilustrações vintage da Bela e do Monstro, da Dama e do Vagabundo, do Popeye e da Olivia Palito, do Tarzan e da Jane, do Mickey e da Minnie. “Every love story is beautiful but ours is my favorite”, lê-se entre frases inspiradoras, desenhos, colagens, manchas coloridas de aguarelas e muitos corações esvoaçantes.
O painel ilustrado de Alexandra Prieto (responsável pela marca de sapatos Art on Shoes) ocupa quase toda a parede principal do quarto e sobressai entre a restante decoração, simples e despojada, composta de peças antigas e outras modernas mas minimalistas. São sete quartos e em cada um deles há uma parede ilustrada com o conto infantil que lhe dá nome. Nas cabanas de madeira (ligeiramente afastadas da casa principal e, por isso, as que gozam de maior privacidade) desenrolam-se as aventuras de Tom Sawyer e de Robin Hood; no antigo casão agrícola, os contos das Mil e Uma Noites e de Romeu e Julieta (um amor impossível que aqui se contraria com um quarto familiar com mezanino, onde cabe um casal e quatro crianças); e no edifício principal, os sonhos do Peter Pan e da Alice (no País das Maravilhas) e todas as histórias de amor dos finais felizes.
A Terra do Sempre, turismo rural e familiar inaugurado em Julho, é como um livro onde cabem todas as histórias e sonhos, onde regressamos à dupla simplicidade da infância e do viver no campo, onde há tempo para tudo. “Não é a Terra do Nunca, que já é mais do que conhecido, mas traz um bocadinho dessa história, dessa herança e depois tem muito a ver com a minha vida, com a minha avó, que é uma excelente contadora de histórias. Nunca me lembro dela sem um livro atrás”, conta Bárbara Alves da Costa. São da avó Corina, que também aqui vive, as letras desenhadas do logótipo, na escrita à mão de quem, aos 89 anos, diz que “já não sabe escrever, só ler”.
O nome Terra do Sempre nasceu “muito antes” de Bárbara, jornalista, e o marido Pedro, arquitecto, adquirirem a propriedade e de ali inaugurarem a unidade de turismo, cerca de seis anos depois, mas já surgia com todos esses sonhos dentro de um outro, porventura maior: mudar de vida. Queriam voltar a “ter tempo” e “mostrar um bocado aos miúdos que não é preciso tanta coisa e dar-lhes outro mundo, mais livre”. No ano passado, trocaram definitivamente a casa em Cascais pela herdade próxima de Grândola, trouxeram as mobílias de família, os três filhos, a avó e a empregada doméstica Luísa, que nunca imaginaram que também quisesse mudar-se para o monte.
É com eles que jantamos na cozinha, todos juntos sobre a antiga mesa de trabalho do avô de Pedro, entre a açorda de bacalhau, as conversas do quotidiano e os risos inquietos da pequena Alice, que quer que a avó termine a refeição para irem brincar às maquilhagens na casinha dos brinquedos. Um pequeno recanto na sala de jantar que Bárbara criou “só porque tem filhos e sabe a dificuldade que é os pais conseguirem jantar juntos”.
Ambiente familiar
Mais do que um hotel, é uma família que abre as portas de casa e partilha-a com outras por uma noite, um fim-de-semana ou uns dias de férias. “Queremos que sintam que estão em casa, numas férias porreiras, onde conhecem os donos e se quiserem até vão beber um copo connosco à cozinha.” Sem formalismos. “Os miúdos podem andar descalços na sala, podem trazer os brinquedos e mesmo que não saibam tocar podem ir para o piano. Quero que entrem, mexam, tragam cartas e brinquem com os meus filhos”, conta Bárbara.
É, portanto, “muito o espírito familiar”, define. E apesar de existirem quartos de casal, recantos enamorados e vários workshops desenhados para adultos (há, frequentemente, estadias “temáticas”, com ateliers de fotografia, gastronomia, entre outros; no Natal, por exemplo, Leonor Poeiras ensinou a criar arranjos ecológicos), muito é feito a pensar nas crianças e nas famílias com filhos. “Queremos fazer cinema ao livre no Verão para os miúdos, trazer contadores de histórias a partir da Primavera ao fim-de-semana, fazer marionetas”, enumera.
Aos domingos, a manhã é sempre de passeio à quinta da vizinha Gertrudes, a poucos minutos de distância. A simpatia de Gertrudes e o amor que tem pelos animais são contagiantes e, depois, há mais de 400 patos para alimentar a balde, galinhas, gansos, cerca de 30 pombos que esvoaçam livres, uma família de porcos pretos (e quando lá estivemos, mais de uma dezena de sôfregos bácoros), um casal de coelhos gigantes e várias ovelhas com os seus filhotes, que há que alimentar a biberão. A visita custa 5€ por criança, uma forma de contribuir para o sustento da quinta, que subsiste da venda de animais e hortaliças nos mercados locais.
Mais tarde, já de regresso à Terra do Sempre, reparamos num enorme coelho a saltitar pela estrada de terra batida ali perto e, mergulhados no espírito das histórias de infância, já imaginamos o Coelho Branco, depois de uma noite dormida no vizinho quarto Alice, a correr, sempre atrasado, para o País das Maravilhas (e a entrada da toca bem pode estar por ali escondida, algures entre os sobreiros e as oliveiras). A imaginação é o limite. Pelo menos, é esse o desejo de Bárbara. “Foi isso que nós construímos: um monte [alentejano] de histórias, onde eu quero mesmo que os miúdos acreditem que tudo é possível.” E por um dia também nós voltámos a ser miúdos. Um dos meninos perdidos da Terra do Sempre.
- Nome
- Terra do Sempre: Uma casa de histórias encantadas
- Local
- Grândola, Grândola, Terra do Sempre
- Telefone
- 934114619
- Website
- www.terradosempre.pt