Amarelo. Um candeeiro de tecto grande, com linhas direitas, recto. Uma moldura a enquadrar a parede. E uma porca de porcelana — o primeiro objecto amarelo a ser escolhido, ditando a tendência. Tudo o resto é preto. Depois de subirmos as escadas de madeira para o andar da RM Guest House - The Experience encontramos um hall assim, de uma casa que quer os hóspedes como amigos convidados.
Rita e Romeu Martins queriam ter sempre a casa cheia. Ela, gestora de 37 anos, aficionada por moda. Ele, arquitecto, com 45, que sonhava viver num hotel. Esta é a concretização do sonho de ambos: uma guest house dedicada à alta-costura. Marido e mulher começaram a planear a abertura do espaço no início do ano passado. Daí à abertura foram seis meses. Um piscar de olhos.
Cada quarto é um caso. Há cinco suítes e duas master suítes, cada uma dedicada a uma diferente marca de luxo. No quarto com tons vermelhos e de um verde escuro, estamos em território da Gucci; como no quarto em tons de laranja nos vemos no universo Hermès. A Roberto Suite tem padrões de pele de animais como se os vestidos de Roberto Cavalli fossem a tela deste espaço. A Designer Shoes Master Suite é inspirada em sapatos de salto alto, a suíte No 5 é 100% Chanel e a Angels Master Suite tem dedicatória a Victoria Secret.
Tudo foi desenhado por Romeu, inspirado no armário de Rita. Foi de lá que saíram peças da Gucci, caixas da Louis Vuitton ou as malas de Birkin Hermès. Hoje, são parte da decoração.
Percorremos o corredor atapetado e o conforto é palpável. Sob o soalho de madeira do século XX, os passos são silenciosos e a casa parecer viver de uma calma alheia. Ao fundo, a sala de estar é um espaço para todos. Há sofás e almofadas da Chanel, uma cadeira suspensa e um manequim. Logo à entrada, um honesty bar, uma espécie de minibar onde pode consumir e pagar a conta no local — a honestidade dos clientes é o cobrador.
Rita e Romeu queriam ser diferentes em Setúbal. “Há vários hotéis, há pousadas. Mas uma guest house com identidade tão própria, não, somos os primeiros.” Nisto da identidade, põem as mãos no fogo: tudo nesta casa foi escolhido meticulosamente. Houve um dia em que deram por si deitados num colchão, no meio de uma loja. Perderam a conta ao número de colchões que experimentaram. “Tudo tinha que ser perfeito.” Hoje acreditam estar perto dessa perfeição: com toalhas de 500 gramas e 100% algodão, e lençóis produzidos pelos portugueses da Lameirinho. Há almofadas com três enchimentos diferentes, para todos os tipos de sono.
“Receber bem implica receber com as melhores coisas”, diz Romeu. “Como em casa”, completa Rita. Todos os quartos têm televisão, máquina de café, uma bebida de boas-vindas e água — não uma qualquer. Aqui, para além da qualidade, havia um factor extra: a estética. Só as garrafas da Acqua Armani completavam a moldura.
Dia de maré vaza
Não sabemos se é a serra que dá este efeito, mas Setúbal parece silenciosa — no bom sentido. Calma, mas com vida. Movimentada, sem agitação. Com noites quentes e iluminadas, sem que as luzes ofusquem qualquer tranquilidade.
É pelas enormes janelas do quarto que vemos a Avenida Luísa Todi, a principal da cidade azul, onde Setúbal se começa a chamar cidade. Com orgulho, este é um hotel urbano.
À saída, trocam-se os olhares com as bicicletas de serventia, gratuitas para hóspedes. Estão ali à entrada como quem diz: pega e vai. Ia-se bem por essa avenida plana que só acaba no mercado. Mas o tempo é para outras voltas.
Ao longo da avenida, os jardins insistem no verde mesmo que as nuvens encubram as cores mais vivas. A chuva que começa a teimar encaminha quem se atreveu a enfrentar a manhã fria para o Mercado do Livramento. A forte cor salmão do lado de fora dá espaço ao azul e branco do interior. Entramos em terras de mar. Na parede do fundo, estende-se um imenso painel de azulejos. São 5700 peças que retratam o trabalho na pesca e na agricultura. As bancas de peixe ao lado das da horta e dos doces. Ninguém neste mercado prega a plenos pulmões. As vozes são de calmaria, como um dia de maré vaza.
Centro da cidade, a sua maior aldeia
Há um único tuk tuk em Setúbal. O do senhor António. Já é assim desde o ano passado, quando decidiu fazer frente ao desemprego. Agora passeia os turistas que chegam à cidade do rio azul. O Sado é para onde todos se viram: os pescadores, as fábricas, os restaurantes, até o seu tuk tuk. António Nicolau apanha-nos junto à guest house. Uma mantinha para cada, mas o frio não entra — o seu tuk tuk é fechado e transparente.
Fazemos uma hora de viagem — por falta de tempo, não por falta de terra por onde andar — pelas ruas estreitas e encavalitadas do centro, até à longa estrada que percorre a baía de Setúbal.
Passamos pela nascente de água mineral da Bela Vista. António ainda era muito novo quando, entre o final da década de 1960, as fábricas de engarrafamento fecharam. Setúbal virou-se (ainda mais) para o mar. Foi atrás dele que vieram os pescadores que haviam de criar o Bairro das Fontainhas — muitos deles de origem algarvia. É um bairro colorido de ruas estreitas, onde se passa rente aos vasos e se toca nas janelas. António vai dizendo olá aos vizinhos e apita aos amigos. Afinal, o centro de uma cidade é a sua maior aldeia.
Das escarpas de São Nicolau vê-se Tróia, à frente de um horizonte que se desfaz. O miradouro é uma das jóias desta viagem. Num dia limpo, impossível perceber o que separa o mar do céu. O tempo tem destas coisas: olhando para o lado, vê-se a serra da Arrábida envolta em nevoeiro, mal se notando o Forte de São Filipe de Setúbal e a sua pousada. “Mesmo nestes dias, a serra é mágica”, diz António.
Seguimos viagem pela baía. Passamos pelo canal do Parque da Comenda que enche e vaza com a maré, pela praia da Figueirinha, dos Galapos e dos Galapinhos, até à praia dos Coelhos, ladeada pela serra. Chegamos, por fim, ao Portinho da Arrábida. Lá em baixo a água cristalina. Azul ou verde, vão lá as algas decidir. “É a serra que beija a praia”, António está seguro, mas à distância é o mar que entra serra dentro.
Guia prático
Como ir
A RM Guest House - The Experience fica no centro de Setúbal. Se vier de Lisboa, a viagem leva-lhe cerca de 45 minutos pela A2. Siga pela saída 5 para convergir com A12 em direcção a Setúbal. Já na cidade, segue pela Avenida Antero de Quental, Avenida Independência das Colónias e Avenida 22 de Dezembro para a Avenida Luísa Todi. Vindo do Porto, a viagem demora menos de 3h30. A opção mais rápida é apanhar a A1. A seguir à ponte Vasco da Gama, vá pela A12 e siga as indicações para Setúbal. O estacionamento exterior é gratuito. Pode apanhar o comboio em Lisboa (Roma-Areeiro ou Sete Rios, por exemplo) e sair na estação de Setúbal. Fica a 15 minutos a pé da guest house.
Onde comer
Museu do Choco
(onde é servido o pequeno-almoço)
Avenida Luísa Todi, 49
Tel.: 937 360 061
De Pedra e Sal
Rua Chico Ferrador, 93
Tel.: 265 415 267
Taberna do Largo
Largo do Dr. Francisco Soveral, 25
Tel.: 265 526 113
O que fazer
Querendo esta ser uma casa de experiências, há um cardápio à escolha. Pode sobrevoar Azeitão de helicóptero. Ao aterrar, espera-o uma prova de vinhos e queijos e um workshop sobre como ser enólogo por um dia. Pode passear de iate ou andar a cavalo na praia da Comporta. Há experiências programadas para observar golfinhos no Sado, fazer canoagem e passear a pé pela serra da Arrábida.
No pacote de experiências Outono/Inverno é ainda possível aprender a fazer pão em Palmela ou ter uma aula de culinária em Azeitão. As actividades variam ao longo do ano, acompanhando as estações.
Na cidade pode visitar o mercado e o seu painel de azulejos, o Museu do Trabalho, ainda com a tinta fresca da reabilitação recém-terminada, e o Convento de Jesus, em estilo gótico, com as suas semelhanças com o Mosteiro dos Jerónimos.
A Fugas esteve alojada a convite da RM Guest House - The Experience
- Nome
- RM Guest House - The Experience
- Local
- Setúbal, Setúbal, Avenida Luisa Todi, 59
- Telefone
- 265 400 119
- Website
- http://rmguesthouse.pt/