Caminha-se nos trilhos inventados pelos pescadores, junto às falésias batidas pelo mar bruto do Atlântico. Pelos carreiros que o gado percorre na serra, quando vai pastar. E por caminhos florestais. Passa-se por minas desactivadas e por fontes com fama de serem santas. Por cascatas e riachos. E por montes com casas brancas, reluzentes. Há ermidas isoladas e ruínas - casas inteiras, sala com lareira e quartos e cozinha, perdidas nos montes, esventradas por árvores e arbustros. E aldeias históricas. Aconselharam-nos um par de botas de caminhada, uma mochila com um piquenique, protector solar. E garantiram-nos que esta rota não é só para fanáticos do trekking. Com pernas pouco habituadas a andar a pé durante dias inteiros, arriscámos algumas etapas.
A Rota Vicentina começa em Santiago do Cacém e termina no Cabo de São Vicente. Ou não. Pode começar no Cabo de São Vicente e terminar em Santiago. Ou melhor: pode começar em qualquer ponto destes 356 km de percurso ao longo da costa sudoeste do país. Cada secção foi pensada para ser concluída num só dia. Nenhuma tem mais de 25 quilómetros.
Pode coleccionar-se aos bocadinhos - uma caminhada hoje, outra para o mês que vem. Ou a aventura pode durar semanas, se semanas seguidas houver livres para lhe dedicar. Uma rede de alojamentos garante que entre cada etapa se pode parar, um dia, dois dias (ou mais), e descansar - e andar a cavalo, de burro, mergulhar, fazer ioga, aprender surf, conforme o orçamento que se tenha para gastar. Caminhar, isso, é de borla. O carro, nestas férias, é suposto ficar estacionado.
O percurso acaba de ser lançado, a marcação dos caminhos não está concluída (falta a parte a sul de Odeceixe), mas já anda na boca do mundo. Jornais e revistas inglesas, holandesas e alemãs, sobretudo especializadas em actividades na natureza, colocam a Rota Vicentina na lista das rotas pedestres a explorar - falam de uma "costa secreta da Europa" (revista britânica Country Walking). Operadores turísticos europeus começam a vendê-la como destino para os amantes das caminhadas.
No top
A Fugas encontrou alguns deles pelo caminho, como Mike Smartt, 63 anos, um conceituado jornalista que em 1997 fundou o site da BBC News. É um homem de cabelo branco e, claramente, pernas em forma. "Há 20 anos que eu e a minha mulher fazemos uma caminhada por ano. Esta é a vigésima", conta num final de tarde, copo de sumo de laranja na mão, sentado num cadeirão com almofadas cor-de-céu-de-Verão, rodeado de sobreiros e oliveiras, numa das herdades associadas ao projecto Rota Vicentina.
Este ano, a agência de viagens com a qual o casal trabalha, em Inglaterra, propôs-lhes a costa alentejana. E cá estão eles. A Fugas encontra-os ao fim de uma semana a andar a pé, pelos caminhos já marcados da Rota Vicentina. Fizeram à volta de 100 quilómetros. Estão longe de parecerem cansados. "Houve um dia em que falhámos os marcos e nos perdemos", contam. Noutro dia tiveram que atravessar um rio "com água pelos tornozelos", diz orgulhosa a mulher de Mike. "E viram as cegonhas?" - diz-se que não há outro sítio no mundo onde as cegonhas façam ninho nas rochas junto ao mar.
Balanço final: "Esta caminhada está no top das três das melhores que já fizemos, em 20 anos." E enumeram as razões: pelas paisagens, pelo tipo de alojamento onde foram pernoitando, pela gastronomia - "Ahhh!, a comida!"
A Rota Vicentina é constituída pelo trilho dos pescadores, junto à costa (num total de 115 km), e pelo caminho histórico, no interior, passando por vilas e aldeias, por caminhos florestais e trilhos estreitinhos (241 km) com uma enorme variedade de flores, arbustos e árvores, aves e insectos.
Trilho dos Pescadores e trilho histórico (este último também pode ser percorrido de bicicleta) tocam-se em alguns pontos - pelo que é fácil passar de um para o outro, sempre a pé.
A Fugas caminhou ao longo de duas etapas: do Cercal do Alentejo à aldeia de São Luís (cerca de 25 km de serra, zonas de pasto e muitos eucaliptos na recta final); de Porto Covo a Vila Nova de Milfontes (à volta de 20 km, entre escarpas e praias selvagens, com as cegonhas por companhia). Fez ainda um circuito complementar: seis quilómetros que desembocam no areal da Praia da Bordeira (um percurso indicado para quem caminha com crianças que permite ver a praia com os olhos da serra).
Pelo caminho, os caminhantes cruzam-se com pastores e pescadores, com as histórias sobre os nomes das rochas batidas pelo mar (Lombo do Asno, Coice de Porco, Pedra da Cegonha...) e ouvem contar como alguns dos percursos integrados na Rota Vicentina terão feito parte dos Caminhos de Santiago, percorridos ao longo de séculos por peregrinos.
O homem dos garrafões
A Casas Brancas é uma associação sem fins lucrativos que nasceu há dez anos e congrega cerca de 60 turismos rurais, restaurantes e outros empresários do sector turístico. Assume-se como tendo o objectivo de "impulsionar a qualidade no turismo da região". No último ano e meio centrou atenções no lançamento do projecto Rota Vicentina e, nas últimas semanas, tem promovido uma grande campanha de promoção, sobretudo para o estrangeiro, daquilo que acredita ser um "projecto de desenvolvimento e de sustentabilidade para esta região", nas palavras de Rudolf Muller, presidente da Casas Brancas. "Um caminho ambiental e cultural."
Em tempo de crise, Muller acredita que a Rota pode dar um impulso ao turismo. A ideia é trazer para a região mais turistas - turistas especiais, que respeitam a natureza e procuram paisagens preservadas. O mercado potencial é grande: o ecoturismo, que engloba as actividades de trekking, cresce, em todo o mundo, à média de 5% ao ano, segundo a Organização Mundial de Turismo.
Muller é um luso-suíço apaixonado por aves e plantas que vive há anos no Alentejo. Num país onde as caminhadas de longo curso ainda não fazem parte dos hábitos de férias da generalidade da população, há muito que procurava descobrir e anotar caminhos usados pela população local nas suas mais diversas actividades.
Em Novembro de 2010 chegava a notícia: a candidatura apresentada pela associação ao Inalentejo (um programa financiado pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional) para lançar a Rota Vicentina tinha sido aprovada.
Dias depois, uma pequena equipa de pessoas punha mãos à obra. Cartas, apresentações, ofícios, protocolos, reuniões. Era preciso falar com autarcas, entidades estatais, empresas, proprietários de terrenos. Pedir autorizações, percorrer os caminhos uma e outra vez para garantir que eram os mais indicados, que davam condições de passagem, que não apresentavam riscos (a ideia era usar percursos que já existiam, mas num ou noutro caso foi preciso melhorá-los - por exemplo, no atravessamento de ribeiros).
"Muitos terrenos junto à costa estão divididos em pequenas parcelas de 20 metros de largura por um quilómetro de comprimento, cada um com o seu proprietário, e por vezes a rota passava por propriedade privada", ilustra Marta Cabral, 36 anos, coordenadora do projecto Rota Vicentina. Chegar a alguns proprietários parecia, nalguns casos, tarefa impossível. Marta, umas vezes, Rudolf, noutros casos, batiam-lhes à porta. Às vezes não estavam. Viviam fora do país. Ninguém sabia bem onde... era preciso saber onde.
Tratados os formalismos, foi preciso colocar as placas direccionais (que vão indicado aos caminhantes quanto falta para chegar ao destino) e os marcos (centenas deles, de madeira, na maior parte dos casos, outras vezes simples riscas de tinta nas rochas - são esses sinais que nos informam se devemos ir em frente, virar à direita ou à esquerda). A Almargem, outra associação sem fins lucrativos, ficou responsável pelo traçado da parte algarvia (sendo esta associação que lidera o projecto da Via Algarviana, outra grande rota pedestre).
Feitas as contas, gastaram-se 540 mil euros neste projecto, entre dinheiro de programas comunitários, Turismo do Alentejo e de cinco autarquias. De fora ficam as muitas horas de trabalho voluntário dos associados.
Marta conta tudo isto enquanto caminha na secção Cercal-São Luís. Sai-se do Cercal pelas dez da manhã. Aos poucos as casas brancas da vila ficam para trás; passa-se a Ermida da Fonte Santa, acena-se ao homem do capacete vermelho que leva um monte de garrafões cheios da água da fonte atados à grelha da sua motoreta e, em pouco tempo, está-se na serra. Pára-se para espreitar uma antiga mina de ferro, para ver as cabras a pastar num monte, para ouvir uma canção - numa roulotte que já foi transformada em casa, com a sua antena de televisão e vasos de flores, há uma mulher que canta e a cantiga ouve-se pelos campos.
Um copo de vinho no paraíso
À hora de almoço, o sol queima e faz-se um desvio - desce-se a Rocha de Água d'Alte. Uma cascata a meio da etapa que, por vezes, está seca, como hoje. Mas vale a pena na mesma descer porque lá em baixo um caminho estreito junto à ribeira está transformado em pista de aterragem e descolagem para dezenas de borboletas-monarcas (enormes, de asas cor de laranja com listas pretas).
Antes, contudo, é hora de piquenique e o "guia" de serviço - Balthasar Trueb, 50 anos, um descontraído luso-suíço (pai suíço e mãe portuguesa), de cabelos grisalhos, abre a mochila. Do seu kit piquenique faz parte uma garrafa de vinho branco fresco. O grupo de caminhantes, hoje constituído essencialmente por jornalistas e operadores turísticos estrangeiros, brinda à sombra de um velho castanheiro. Da próxima vez, do kit piquenique da Fugas fará parte não só o vinho mas também uma almofada insuflável para a sesta.
Balthasar tem sido um dos que se tem envolvido a fundo no projecto da Rota Vicentina - com Marta Cabral passou os últimos meses a promovê-lo em feiras de turismo noutros países. É o dono de um dos empreendimentos associados à Casas Brancas, situado a quatro quilómetros da praia dos Aivados, entre Porto Covo e Milfontes. A sua história é comum à de muitos dos que têm trabalho neste projecto. Conheciam o Alentejo das férias, mas viviam longe (tantas vezes fora do país) até que, um dia, quiseram mudar de vida. E rumaram a Sul.
A propriedade de Balthz, como todos o tratam, é constituída por montado, essencialmente, e foi comprada quando veio para Portugal produzir avestruzes. O negócio durou alguns anos, até que, com a gripe das aves, morreu. Seguiu-se um restaurante, no mesmo sítio - mas os clientes costumavam pedir-lhe se não podiam ficar para dormir. Em 2007, transformou o sítio e abriu um turismo rural. Chamou-lhe Três Marias, por causa do filme inspirado no livro de Isabel Allende. E por causa de duas coincidências: na história de Allende, a fazenda da família Trueba (apelido parecido ao de Balthasar) chama-se Três Marias; e parte do filme foi filmada na região.
"Olha um falcão peregrino!", grita um caminhante. Muitas conversas nestes dias de caminhada serão interrompidas com exclamações semelhantes. "E aquilo? Não é um falcão-peneireiro?"
A Casas Brancas diz-se apostada em envolver a comunidade no lançamento da Rota Vicentina - processo que ainda está a decorrer, como explica José Granja, 30 anos, um jovem formado em Gestão de Empresas que também mudou de vida há três anos, quando largou Lisboa para trabalhar na associação. O Instituto da Conservação da Natureza e da Biodiversidade, o Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina, os turismos do Alentejo e Algarve, a Polis Litoral Sudoeste e a Federação de Campismo e Montanhismo de Portugal são parceiros estratégicos.
Para além disso, tem havido reuniões com empresários locais, conta. E a associação quer no próximo ano ir às escolas falar da Rota - e de turismo de natureza, de desenvolvimento sustentável, de conservação do ambiente, porque está tudo ligado, sublinha José.
Há ainda que reforçar a capacidade de receber os caminhantes. Para já, há 34 turismos rurais (que fazem parte da Casas Brancas) que estão articulados - o que significa que quem quer fazer a Rota Vicentina pode seleccionar o percurso, contactar os alojamentos da rede que ficam próximo das etapas escolhidas e estes garantem que, no início de cada manhã de caminhada, as bagagens seguem de carro para o alojamento seguinte; ao final do dia, quando o viajante chega ao destino, lá estão as suas malas.
Mas existem outras opções, fora da associação - incluindo parques de campismo e pensões - que, aos poucos, poderão organizar-se de forma a garantir que a rota é passível de ser feita nos mesmo termos para quem os escolhe sem que o transporte das bagagens de uma etapa para outra sejam uma preocupação.
Ideias não faltam. A Casas Brancas também planeia vir a criar uma bolsa de voluntários que vão informando sobre o estado do percurso e dos marcos e pretende arranjar um patrocínio de uma grande marca que permita ter um orçamento para a manutenção. Um mapa detalhado do percurso à escala de 1:50.000 e um guia de campo deverão estar prontos nos próximos meses, mas no site da Rota Vicentina já se pode descarregar todo o percurso para GPS (sim, há quem saque do smartphone em plena serra para descobrir onde está).
Ao longo do caminho, ouviremos várias vezes enunciar o receio de que esta costa com tantos recantos secretos, com tantas praias que permanecem vazias mesmo no pico do Verão, seja invadida por turistas. Há uma mistura de sentimentos contraditórios: toda a gente quer que o turismo da região seja sustentável e se desenvolva. Mas ninguém quer perder o sossego. "Não fale muito desta praia lá no jornal, para ver se ela continua vazia!", foi uma frase que ouvimos com alguma frequência.
"Há lugares muitos especiais para quem aqui vive que as pessoas não os querem ver invadidos", reconhece Marta Cabral. Alguns desses lugares são segredos bem guardados que dão especial gozo se forem descobertos à medida que se caminha - o Pego das Pias, entre São Luís e Odemira, onde há muito os habitantes locais vão mergulhar; o canal de irrigação entre Odeceixe e Rogil ("sim, também há levadas no Alentejo", como diz alguém); as muitas praias vazias, com as suas grutas e acessos que parecem impossíveis vistos do alto da falésia... Cada etapa, diz Marta Cabral, tem um ponto alto, "uma pérola" - e há algum secretismo na forma como se fala dessas "pérolas", porque a ideia é que estas sejam descobertas pelos caminhantes e não um chamariz para domingueiros de jipe.
A verdade é que o lançamento oficial da rota foi em Maio e o vídeo promocional já foi visto mais de dez mil vezes. Todos os dias, há uma média de 20 subscrições da newsletter que vai dando conta das notícias da rota, diz Marta Cabral. Mas na prática é cedo para dizer quantos caminhantes se vão pôr a caminho, realmente.
Uma coisa foi confirmada pela Fugas: não é preciso ter grande aptidão física para percorrer etapas de 20 quilómetros por dia - enfim, dói no primeiro dia, uma pomada anti-inflamatória para os músculos das pernas pode ajudar quem passa boa parte do ano sentado a uma secretária, há que dizê-lo. Mas a paisagem ajuda a esquecer o cansaço.
Que mais é preciso? Pouco. Cite-se Marta, quando, à sombra do castanheiro, enumerava as regras da rota: "Ser simpático para as pessoas que encontrar; respeitar a propriedade privada, fechar cancelas e portões se os encontrar fechados, deixá-los abertos se estavam abertos; nada de lixo; não fazer campismo selvagem, por muito apetecíveis que sejam os lugares por onde vai passar." E vão ser, seguramente.
Guia prático
Onde dormir
Cerro da Fontinha
Casas com 150 anos à beira de um lago
Quem passa na estrada não imagina o que está depois deste aglomerado de eucaliptos que refresca a berma: um lago natural para nadar e andar de barco a remos e um conjunto de casa brancas listadas de azul. Quando chegou ao Cerro da Fontinha, em 1999, Miguel Godinho, o proprietário, encontrou-as degradadas e sem telhados - o que não é de estranhar, porque têm mais de 150 anos.
O ribatejano, que tinha estado durante 15 anos a viver no clima tristonho de Inglaterra, tinha escolhido começar de novo, com o sol quente do Alentejo. E fez questão de reconstruir ele próprio cada uma das casas usando os mesmos materiais com que tinham sido construídas originalmente: terra, madeira e pedra (vários pormenores fazem lembrar que a praia fica ali perto, a começar pelos seixos negros nas paredes onde se penduram as toalhas de banho). Reconstruía uma por ano - sala, cozinha, chão de tijoleira, casas de banho de pedra, janelas pequeninas com flores no beiral... Agora, diz a sorrir, está a gozar um pouco o resultado.
E o resultado são seis casas (quatro T2, um T1 e um estúdio), todas com cozinha, num local perfeito para famílias com crianças, perto das praias do Carvalhal (2km), da Amália e dos Machados e com um lago enorme, que atinge os três metros de profundidade - são as próprias plantas que se encarregam de manter a água com qualidade suficiente para que seja sempre possível mergulhar.
O sítio ganhou fama. "Um dia comecei a receber telefonemas diários de Inglaterra. Ingleses que queriam reservar uma casa ou pedir informações", conta. "Pensei: ‘Mas que raio, por que é que agora me telefonam ingleses todos os dias?', perguntei a um deles. E disseram-me que tinha saído um artigo no The Guardian a falar do Cerro da Fontinha."
Nesta propriedade não se usam químicos. E mais de 70% da energia usada é solar. O sítio está referenciado num guia chamado Green Places to Stay (entre os dez melhores ecoturismo do mundo), diz Miguel, com o livrinho verde na mão.
Quanto a actividades, há anos que o proprietário presta apoio aos caminhantes, fornecendo dicas para percursos e organizando passeios de bicicleta. É ainda possível andar de barco e participar nas aulas onde se aprende a trabalhar o barro - especialmente para as crianças, que também têm à disposição escorrega e outras brincadeiras. Canas de pescas e bicicletas estão incluídas no preço dos alojamentos.
Cerro da Fontinha
Brejão
7630-575 São Teotónio
Tel.: 282 949 083/ 963 238 303
www.cerrodafontinha.com
Preços: Entre 55€ e 95€ por T0; entre 65€ e 105€ por T1; entre 85€ e 150€ por T2. Estadia mínima de sete noites em época alta.
Três Marias
Ambiente romântico no meio dos sobreiros
É um turismo rural numa planície de montado a perder de vista. Há um local onde à noite se acende a fogueira. Um alpendre onde se pode jantar se se reservar com antecedência. Há ainda uma avestruz a lembrar os tempo do antigo negócio - aqui funcionou durante muitos anos uma exploração de avestruzes. O ambiente é descontraído e romântico, predomina o branco nos quartos (alguns com mezanino) e todos os dias é servido um fantástico pequeno-almoço, com sumos, fruta, bolos e diversos tipos de pão, doce e queijos. Quem quiser pode encomendar uma massagem - e não estranhe se Anne Rasquin, uma massagista alemã que vive em Portugal há 22 anos, se oferecer para colocar a marquesa no meio do campo, à sombra de uma azinheira. Anne garante que tem massagens especialmente indicadas para quem termina um dia pela Rota Vicentina com as pernas a chiar. E vai a qualquer um dos alojamentos da rede Casas Brancas (963059956).
Três Marias
Ribeira da Azenha, Apt. 111
7645-909 Vila Nova de Milfontes
Tel.: 965 666 231
Preços: entre 70€ (quarto duplo simples, época baixa) e 130€ (suite com mezanino em Julho e Agosto) com pequeno-almoço
Herdade da Matinha
Um lugar de sonho
Até aos anos 1990, Alfredo Moreira da Silva viveu em Lisboa. Era artista plástico e vendia têxteis. Depois, a Zara chegou e ele faliu. Com a mulher, Mónica Belleza, guia turística, especialista em História de Arte, decidiu passar uma temporada na Austrália. Ficavam num pequeno paraíso com as catatuas a servir de banda sonora.
"Depois de uma temporada lá, regressámos a Lisboa, entrámos no apartamento e o meu filho [então com dois anos] fez o mesmo que costumava fazer na Austrália: foi a correr para a varanda. Mas em vez de se deparar com árvores e catatuas... tinha prédios. E começou a chorar... Foi nesse momento que decidi: ‘Não fico aqui.' Vou para a Austrália montar o projecto dos meus sonhos", conta Alfredo.
O projecto dos sonhos dele e da mulher era construir um turismo rural à sua imagem. E começaram a preparar tudo para fazê-lo no outro lado do mundo. Empacotaram mobílias, candeeiros, roupa, até encher o contentor que havia de os acompanhar. Antes de partirem, contudo, cruzaram-se por acaso com a Herdade da Matinha, um vale no Cercal do Alentejo. E apaixonaram-se pelo sítio.
As mobílias com destino à Austrália acabaram por ser desempacotadas no Cercal. Muitos eucaliptos foram cortados, mais de 45 mil árvores foram plantadas só nos primeiros anos. Nas cavalariças nasceram quartos. Num pavilhão azul-bebé, onde Alfredo pintou na parede a letra de uma canção de Caetano Veloso - "Céu azul que vem até onde os pés /Tocam na terra/E a terra inspira e exala seus azuis" - nasceram mais quartos.
Hoje, Alfredo e Mónica continuam a viver na propriedade. É aqui que ele tem o atelier. E é na cozinha fantástica, aberta para a sala de jantar, que cozinha (os hóspedes podem acompanhar os trabalhos e, se for combinado, até participar na confecção). Muito do que aqui se come (os jantares gourmet são marca da casa) é produzido na herdade onde há cavalos à solta e uma piscina junto a um laranjal.
Herdade da Matinha
7555-231 Cercal do Alentejo
Tel.: 939 095 685/ 932 944 285
www.herdadedamatinha.com
Preços: Entre 89€ a 169€ por quarto duplo, com pequeno-almoço incluído; entre 119€ a 279€ por suite, com pequeno-almoço incluído
Naturarte
A casa de Champanhe
Há o quarto da avó, o quarto da irmã, o quarto do tio... Ao todo são cinco quartos e duas casas na Herdade da Corte Pinheiro, a um quilómetro de São Luís, projectados pelo arquitecto Rui Graça, que gere este turismo rural (bem como o Naturarte Rio, um outro projecto de turismo rural, a poucos minutos de carro, que tem uma magnífica piscina infinita enquadrada pelo rio Mira). Nos 250 hectares de terreno, junto à serra do Cercal, há sobreiros e pomares, piscina, court de ténis, ioga e centro hípico (podem reservar-se aulas para os mais pequenos e organizam-se passeios mesmo para quem não é um pro).
Há menus especiais - Pamela, a mulher de Rui, é a chef de serviço. E os jantares podem ser servidos ao ar livre, junto à piscina. Mas uma das imagens mais fortes que fica deste elegante turismo rural é o picadeiro e a forma como os donos falam dos cavalos (várias crianças das redondezas vêm aqui ter aulas) que, diz Rui, podem ser uma lição de amor e de dedicação.
No dia em que a Fugas visita o espaço, há um potro recém-nascido que centra atenções, mas o cavalo mais importante do picadeiro chama-se Champanhe - um puro lusitano, cor de champanhe, claro está, por quem Pamela se apaixonou antes mesmo de ter conhecido Rui. Foi na feira da Golegã: ela bateu com os olhos no cavalo, fixaram-se longamente, não o comprou logo, mas acabou por contactar o dono dias depois, conta Rui. Quando este lhe passou os documentos do lusitano para a mão Pamela percebeu que Champanhe tinha nascido no mesmo dia que ela, exactamente. Hoje, Champanhe vive ao lado de casa dos donos. Faz parte da família - mas tem alguns ciúmes de Rui.
Naturarte
Estrada de Vila Nova de Milfontes, km 1
7630-440 S. Luís
Tel.: 913 619 939
www.naturarte.pt
Preços: Entre 105€ e 145€ por quarto duplo com pequeno-almoço incluído; entre 125€ e 180€ por T1 com pequeno-almoço incluído; de 175€ a 285€ por T2 com pequeno-almoço incluído
Um pacote para caminhantes
É possível comprar um "pacote" especialmente pensado para quem quer usufruir dos alojamentos da Casas Brancas e caminhar algumas etapas da Rota Vicentina. Um programa de duas noites na Herdade da Matinha (Cercal) e outras duas no Naturarte, (São Luís) fica por 300 euros por pessoa em quarto duplo, incluindo um jantar em cada alojamento e dois piqueniques para os dias de passeio. Os preços são válidos na época baixa e média (ou seja, não se aplicam na última quinzena de Julho nem no mês de Agosto). O transporte das bagagens entre alojamentos está assegurado. Informações sobre todos os alojamentos da rede em www.casasbrancas.pt
Andar de burro
Se parar em Aljezur, leve os miúdos a andar de burro. O projecto Burros & Artes tem como missão cuidar de burros que estão demasiado velhos para trabalhar nos campos, ou que estavam maltratados pelos donos. Sofia von Mentzingen, a mentora, organiza passeios especialmente para os mais novos, tanto na sua quinta, em Vale das Amoreiras, como nas ruas de Aljezur, mas também na serra ou junto à praia. Mais informações em www.burros-artes.blogspot.com
A Fugas viajou a convite do projecto Rota Vicentina