André Miranda nunca tinha andado de barco antes de subir para o Creoula, o veleiro português com mais de 79 anos que participa na Tall Ships Races, uma competição de vela que procura dar oportunidade de formação a jovens de todo o mundo. Com 15 anos, André faz parte do grupo de instruendos que embarcou a bordo da meia centena de veleiros que até segunda-feira está atracada em Lisboa.
Com os seus 67,4 metros de comprimento, empurrados com a ajuda de quatro mastros, o Creoula integra uma frota de nove veleiros portugueses, dos 51 navios em competição nesta regata. Ao serviço da Marinha Portuguesa há quase três décadas, o Creoula é utilizado para o treino de marinheiros e para proporcionar experiências e contacto com a vida no mar a toda a população.
O branco do uniforme dos marinheiros distingue a tripulação dos aprendizes. A acompanhar os 40 militares da Marinha Portuguesa está um grupo de 35 instruendos, jovens com idades entre os 14 e os 18 anos. Mas a distinção termina aqui. Integrado nas tarefas requeridas a qualquer velejador profissional, o grupo presta apoio à tripulação oficial. “Não atrapalham nada, até nos ajudam bastante”, garante Carvalho de Oliveira, comandante do veleiro, depois de garantir que a recolha das velas está a ser bem executada e que a aproximação à costa reúne todas as condições de segurança.
“É claro que fazemos as nossas correcções, mas as tarefas que têm são iguais às de qualquer membro da tripulação. São verdadeiros marinheiros”, assegura o comandante. Têm de içar velas, marear o pano, fazer navegação, leme, vigia, aprender a dar nós e até descascar batatas e apoiar na limpeza diária do navio. A vida sobre o mar é exigente e o caminho já vai longo, mas ainda não está completo. A âncora levantou em Antuérpia, na Bélgica e de Lisboa seguirá para Cadiz e Corunha, em Espanha, cumprindo um total de 1955 milhas náuticas.
A comunicação é feita através de apitos e as velas descem ao som dos “ei-ó” que se ouvem nos filmes de piratas, com o apoio dos instruendos, sempre supervisionados pela tripulação.
Do Terreiro do Paço a Santa Apolónia, o horizonte é por estes dias cortado por velas altas. “Há quatro anos que não via Lisboa assim”, revela Tiago Pinto, um estudante de 20 anos, com os olhos postos na Praça do Comércio enquanto o navio se aproxima da cidade, depois de passar debaixo da Ponte 25 de Abril. É a sua quinta viagem, mas “a sensação de chegada é sempre diferente”. Tiago nunca tinha feito vela quando decidiu inscrever-se naAssociação Portuguesa de Treino de Vela (Aporvela), um dos grupos que organiza a participação nas regatas do Creoula. A paixão pela vela cresceu e todos os dias conta os meses para voltar a alto mar. “Muda a perspectiva que temos da vida. O navio não pára só porque alguém se sente mal”, exemplifica Joana Ribeiro, estudante de medicina com 23 anos e que sobe ao Creoulatambém pelo quinto ano. “Enquanto me deixarem virei sempre”, acrescenta. “O pior é o enjoo”, brinca António Braga, de 16 anos, “o resto vem por observação e instinto e é fácil entrar no ritmo da tripulação”.