Fugas - dicas dos leitores

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No topo do Kilimanjaro

A suave luz da lua iluminava o suficiente para podermos caminhar sem as lanternas e cada um de nós foi-se fechando no seu próprio mundo. O único ruído que ouvia era da minha própria respiração, ora mais ou menos ofegante, consoante a grandeza dos passos. Conforme subíamos e a noite avançava, a temperatura caía cada vez mais fazendo com que nossas paragens, apesar do cansaço, fossem cada vez mais breves pelo insuportável do vento e do frio. As minhas mãos gelavam. Juntei-as ao corpo, como aliás já tinha feito às baterias da máquina fotográfica e á própria máquina. A água do meu camel bag também congelou. Houve um ponto, confesso, que nada parecia estar a colaborar e o objectivo parecia inalcançável. Contei com a inestimável ajuda do meu guia assistente Valerian, que continuamente me deu força provando a cada passo, que era possível continuar e chegar ao topo.

Após cinco horas de caminhada já tínhamos avançado muito, tendo ganho quase 1.000 metros verticais. O cansaço era bastante grande, mas o desejo de chegar ao cume em simultâneo com o nascer do sol mantinha-nos a força e a vontade de fazer caminho. Nos próximos minutos, o céu começou a tingir-se de tons de azul e cor-de-rosa. O dia estava finalmente a nascer. A temperatura subiu um pouco e a energia do sol transferiu-se para o grupo e todos pareciam agora mais animados e com uma vontade reforçada de chegar ao topo. Por entre a penumbra do dia, é agora possível vislumbrar o branco dos glaciares que agora surgem na nossa frente a contrastar fortemente com o escuro do céu. De um lado glaciares azuis com mais de 50 metros de altura, do outro a linha do horizonte, curva pela altitude, e um sol que nascia trazendo o tão almejado calor do dia.

Os últimos metros até ao Stela Point foram esgotantes. Aqui, surge a primeira marca de altitude do Kilimanjaro no marco que assinalava este ponto. O ângulo da nossa subida permite agora a vista sobre a grande cratera do que foi em tempo este enorme vulcão. Deste ponto até ao ponto mais alto, seriam mais 40 minutos de caminhada. Continuei. Tinham sido seis horas e meia de subida quase ininterrupta a uma altitude considerável. Mas ainda tínhamos mais uma etapa até o cume.

Após um pequeno descanso, largadas as mochilas, retirei a minha bandeira de Portugal e prossegui, agora por um trilho mais brando e de inclinação suave, mas onde cada passo continuava a ser uma enorme dificuldade. Durante toda a noite caminhei com o grupo mas agora fiz um esforço para adiantar-me um pouco e fazer o restante caminho sozinho.

Inexplicavelmente, senti uma forte necessidade de estar apenas comigo, de admirar a beleza desta paisagem em silêncio e sem partilha. A emoção do momento foi muito forte e as lágrimas correram-me soltas no rosto mesmo sem saber porquê. Talvez apenas pela emoção de concretizar este sonho e de ter superado todas as dificuldades da subida ao longo de todos estes dias. Afinal estava no topo de África. Senti este momento a ficar dentro de mim. Cada passo, cada cor, cada detalhe da paisagem. Agradeci à vida a oportunidade de viver esses momentos mágicos e a energia que tive para concretizar a subida.

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