Fugas - dicas dos leitores

72 horas em Xangai

Por João V. Faria

A partir da Expo Mundial de Xangai, a lembrança de um passeio entre os sinais da modernidade e pujança económica desta grande cidade chinesa e os bairros onde ainda se guarda o passado.
Era Agosto, no Verão em que a China ascendia ao 2.º lugar da economia mundial. Nos canais chineses para estrangeiros sintonizados no quarto de hotel, a notícia era difundida como motivo de orgulho da milenar perseverança chinesa. Outro motivo de orgulho: a Exposição Mundial de Xangai que, nos écrans da Praça Tiannamen, era recordada aos visitantes e onde um contador electrónico registava ao minuto as mais de 44 milhões de entradas. Aliciante convite para uma distância de 1100 quilómetros. Esgotados os voos, a opção evidente era o comboio, o moderno e publicitado comboio de alta velocidade entre as duas grandes metrópoles. Perdidos na tradução de um inglês misturado com linguagem gestual, entrámos num comboio inter-regional para uma imersão civilizacional de 18 horas!...

O tráfego intenso de pessoas e de viaturas acolheu-nos na megacidade de 14 milhões de habitantes, com um crescimento económico superior ao já assinalável crescimento chinês, e com uma malha prodigiosa de arranha-céus. E nada melhor do que admirar toda essa paisagem da Pérola do Oriente, famosa torre de 457 metros que domina o bairro do Pudong e donde se avista o Bund, a linha marginal ao rio Huangpu, com edifícios dos anos 30 e 40 das antigas concessões europeias. 

Falando da pujança económica de Xangai, descendo da Pérola do Oriente, deparamo-nos com todo um manancial de edifícios e de centros comerciais luxuosos. Nos arranha-céus em construção, já há escritórios em funcionamento nos andares concluídos... nas galerias comerciais, as marcas ocidentais adornam-se com dourados e luzes de néon fortíssimas. Uma burguesia chinesa endinheirada e nada despretensiosa rompe pelas lojas espaçosas e consome as griffes. O milagre está aqui. É só ver e acreditar. E à noite esta cidade também nunca dorme: o trânsito, as multidões, as luzes de néon...

No dia seguinte, percorre-se uma grande parte da cidade, para a outra margem do rio, em direcção à exposição. Será esta a cidade para mostrar ao mundo o futuro sustentável das cidades? Ou será esta a cidade que o mundo escolheu para se mostrar aos chineses? Dos 73 milhões de visitantes, mais de 90% foram chineses que, ordeiramente, visitaram os pavilhões e as várias áreas. Filas intermináveis, horas de espera infindáveis, piqueniques de comida chinesa de todas as partes da China: Better world, better cities, com um turismo interno ascendente. 

Últimas 24 horas. Decidimos pela cidade velha. Os jardins Yu e Bazar, metidos entre a construção galopante, são ainda os vestígios de uma cidade antiga. A traça arquitectónica não o desmente e o comércio mais tradicional também não. Vamos até ao Bund, o bairro do apogeu económico anterior à II Guerra Mundial, o bairro do nosso imaginário dos filmes de Hollywood dos anos 40. Atrás de nós, o passado em belos edifícios, à nossa frente o futuro com as suas torres. É um passeio memorável, é um passeio pela memória do mundo e da China.

Para terminar, um jantar no bairro da concessão francesa que, no final da tarde, toma ares de cidade pequena, tranquila, acolhedora. E é um vestígio dessa época colonial o restaurante 1931, com o seu requinte, a sua decoração e o seu atendimento parados no tempo. Nem tempo temos para desfrutar plenamente: há um comboio de regresso para apanhar. Chove novamente, uma chuva que se evapora. O táxi leva-nos à nova estação de Xangai nos viadutos que, por cima das ruas, nos permitem ver os décimos andares das torres que ultrapassam as nuvens escuras. Nos écrans que se amontoam e pela multidão, viajamos para o futuro de Blade Runner. E no novo comboio (agora, sim) adormecemos no regresso a Pequim.
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