Fugas - dicas dos leitores

Toronto, a miríade moderna

Por Maria João Castro

Erguida nas margens do lago Ontário, Toronto apresenta-se como uma das maiores, mais cosmopolitas, mais dinâmicas e apelativas cidades da América do Norte.

A UNESCO elegeu Toronto como uma das melhores cidades do mundo para se viver. E a mistura de culturas foi o motivo que levou as Nações Unidas a designarem Toronto como a cidade mais culturalmente diversificada do mundo. 

Toda a cidade vive e respira de maneira ordenada, limpa e segura. Num cruzamento, a bandeira do país ondula ao sabor da brisa matinal, mas o que sobressai de onde quer que se esteja é o cartão postal da cidade: a C.N. Tower (Canadian National Tower). 

Acordo a uma hora tardia e vergonhosa. Parto sozinha à descoberta de mais um pedaço desta qualidade de vida. No centro da cidade, meia dúzia de prédios altíssimos espelhados não deixam que a luz do sol beije o chão. Caminho sem destino. O desencontro dos meus pensamentos não deixa completar-se numa decisão qualquer. Olho à volta e testemunho o aforismo de Rimbaud de que é preciso ser-se absolutamente moderno. 

Os dias escorrem plenos de descobertas que têm o seu apogeu numa ida às cataratas de Niágara. Uma imponente muralha verde desmorona-se num barulho violento despejando cerca de três mil metros cúbicos de água por segundo; lá em baixo, barcos transportam turistas de impermeáveis azuis. Em frente, os EUA. Todos sorriem para a fotografia; eu prefiro tirar sons e deliciar-me, só, assim, ficar a ver, a contemplar uma grandeza, a força bruta da natureza. 

As nuvens cobertas de lentidão anunciam o Outono próximo e abafam a luz difusa, avisando-me do fim da estadia que se aproxima ao mesmo tempo que a estação começa a despir as árvores ou a pô-las rubras. 

Descolo de Toronto à noite. O avião levanta voo em direcção ao céu negro e depois mergulha nas nuvens. Uma chuva sem remorsos abate-se sobre tudo e sobre todos. 

Tudo parece agora meio enevoado e baço, quando recordo esta minha primeira travessia atlântica e no entanto há algumas imagens tão nítidas que sobressaem, límpidas e puras. A minha memória é uma paisagem contemplada de um avião sobre o Atlântico: uma cidade real, mas cada vez mais longe: voltarei um dia para redescobrir a cidade arrumadinha, que me atraiu desde o primeiro instante?

Olho pela janela do avião: lá fora a noite cerrada e a trovoada não me dão nenhuma resposta. Olho para o meu banco ao lado - vazio. Viajar sozinha não ajuda a encontrar respostas mas pelo menos ajuda a fazer perguntas que um dia, com certeza, terão uma resposta. Porque quando se amadurece ideias, sem pressas, sem a avidez de chegar a um lugar, a obra que resulta dessa ponderação é uma obra acabada. Irá ser assim, o regresso.

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