Esperava-nos uma das muitas sucatas que vai circular nas estradas de Myanmar (Birmânia) antes de morrer. No interior, bancos que eram pouco mais que tábuas com as costas verticais e cobertos de um tecido onde não se percebia a cor original, e para rematar uma chapa de metal estrategicamente colocada ao nível das canelas. Ia ser aqui onde ia passar as minhas próximas dez horas...
A pouco e pouco foram chegando os restantes passageiros, alguns iriam fazer a viagem quase toda comigo, como a jovem mãe e o filho que, tal como eu, passou a viagem com a cabeça metida do lado de fora da janela, outros apenas por uma ou duas paragens (afinal era dia de mercado em Kalaw).
E em mais de trezentos quilómetros e dez horas de carreira local houve muita gente em muitas paragens, em todas elas hordas de vendedores de comida cercavam-nos, em todas elas o “assistente” fazia a sua magia: berrar aos potenciais clientes e colocar o calço de madeira na roda que substitui o travão de mão.
Onze horas e meia depois de entrar no autocarro cheguei a Bagan, com hora e meia de atraso, que por lá afinal a pontualidade não é uma virtude.
No regresso, ao contar, perguntaram-me como suportei onze horas por estradas acidentadas num autocarro decrépito, eu respondi que tinha o iPod no bolso e nem sequer me lembrei de o tirar, havia demasiados estímulos para eu ouvir música.
__
Um dos textos vencedores do passatempo Fuga Divinal, promovido pela Fugas e pela editora Lua de Papel O leitor foi premiado com um exemplar do novo livro de Eric Weiner, "Uma Viagem pelo Mundo à Procura de Deus".