A Ikea afirma muita vezes que é uma empresa familiar e para famílias, mas mesmo assim não estava a espera desta imagem: Patrick Anthony, director de marketing da IKEA Portugal, sueco de gema, olhos azuis e cabelo loiro, a fazer a cama de um dos hóspedes.
Sim, a fazer uma cama. Pôr a fronha, esticar os lençóis, meter as pontas destes debaixo da cama, colocar por fim o edredão e as almofadas. A teoria estava a aplicar-se na prática.
Porém, mesmo com o empenho da organização, a iniciativa não pareceu ter captado a credibilidade de todos. Um dos seguranças do evento, dava voz à sua opinião, explicando a um casal que nem tudo era bom nesta noite.
"Isto não é para a nossa mentalidade. Bom é para os alemães que saem à noite marido e mulher e depois voltam para casa separados como se nada fosse", descrevia. "Eu já trabalhei na Alemanha e já vi como é o Oktoberfest", acrescentou. Porém, enquanto hóspede do quarto n.º 1 e bisbilhotador oficial, não me deparei com nenhum cenário como o segurança descrevera.
Muitas pessoas que passeavam pelo parque cobiçavam as camas ou chegavam mesmo a deitarem-se nelas, nem que fosse para uma foto do Facebook. Os seguranças tinham de estar atentos para nada ser desviado.
Os dois cafés do jardim estavam apinhados. Estava a ser uma boa noite de negócio. com certeza, e não havia tempo para declarações. A cabeça já não conseguia acompanhar a velocidade das mãos.
Sentadas num banco, encontrei uma dupla de amigas que veio passar a noite ao "ar livre". Eram Maria, com 56 anos, e Isabel, com 58, mas à meia-noite a idade de uma delas ia-se alterar. Ambas nunca tinham acampado sequer.
"Que horas são? Por enquanto ainda tenho 58", disse em tom de brincadeira Isabel. "Foi uma coincidência vir passar aqui o aniversário. Mas também vai ser uma experiencia única", acrescentou a amiga Maria.
Depois da meia-noite, o jardim já pertencia em exclusivo aos seus hóspedes. Cada um apanhou a sua ceia e deslocou-se para o prometido quarto.
Houve três casais que ainda se juntaram a confraternizar perto do local onde era distribuída a ceia nocturna. No entanto, as conversas não passavam de um questionário informativo, num registo informal. Como vieram aqui parar? De onde são? Como souberam? Perguntas de curiosidade para conhecer os vizinhos com quem se vai partilhar o tecto. Pouco mais evoluíram.
Numa última volta ao espaço, antes de me encaminhar para os lençóis encontrei um senhor sozinho - que pediu para não ser incomodado -, deitado na sua cama e imerso nas suas leituras. Um cenário comum, não fosse ele estar no meio de um jardim e, em vez de uma luz para a mesinha de cabeceira, estar a usar o candeeiro do parque para iluminar o livro.
As idas à casa de banho eram iguais às de um parque de campismo. Em passo acelerado com manta às costas e em chinelos.
Por fim, era o momento de entrar no ninho de lençóis. Já deitado, tinha-se direito a um tecto de palmeiras, pinheiros, choupos ou até às envergonhadas estrelas.
Ouvia-se o correr da água dos dois lagos, o canto dos pássaros que não queriam dormir, mas uns barulhos menos exóticos também. Por vezes os carros davam uma presença mais humana à envolvência sonora do local.
A manhã seguinte
Acordar é uma experiencia renovadora e neste hotel é bastante diferente do normal. Eram 7h da manhã e já passavam pessoas a fazer jogging matinal, em frente às camas. Inclino-me na cama e vejo cinco gansos a andar em fila, com as patas a fazer tac, tac, tac e o mais desajeitado de todos no final. Um momento em que a vida real reproduzia as histórias literárias, ou vice-versa.