Arte nova, história e arte contemporânea
Os 36 quartos partilham a mesma decoração minimalista — agradável ao olhar, sem descurar o conforto em prol do design. Das duas possíveis vistas, calhou-nos a do lado do Largo do Intendente — e ainda bem. A suíte da cúpula e os dois king rooms, na dobra do edifício, são a excepção à regra, com enormes janelas para largo e avenida. Voltando ao quarto 201, onde nos instalaram, é difícil imaginar que o primeiro instinto, ao passar o cartão no leitor, não seja caminhar directamente para as duas grandes varandas, abrir as portadas e fixar o olhar no largo cada vez mais cheio de vida. Há crianças em bicicletas e patins, esplanadas cheias ao máximo — mesmo pela noite fora — e namorados sentados na obra de arte urbana de Joana Vasconcelos, Kit Garden. Quando conseguimos finalmente largar o balcão hipnotizante e fechamos as portadas oscilo batentes, o barulho fica lá fora.
O contraste entre exterior e interior é bem visível — como sempre foi. Lá fora, a fachada de arte nova exige um olho atento — e teoricamente uma grua — para apontar todos os elementos decorativos: as varandas em ferro forjado, os azulejos originais e recuperados, inspirados em elementos na natureza, e dezenas de animais espalhados em detalhes de colunas e encaixados em pequenos espaços. À volta, o Largo do Intendente ganha cada vez mais vida e, mesmo à noite, as esplanadas enchem-se por completo.
Já o interior do hotel tem um estilo bem mais sóbrio, pautado pelas obras de arte moderna que enchem as paredes, escadarias e até o saguão. Foi neste último espaço, onde está foi instalado um elevador, que a ilustradora Vanessa Teodoro pintou um mural inspirado na história secular do edifício e do Largo do Intendente. As palavras “Boa Sorte” e “Lotaria” lembram um dos inquilinos que durante mais tempo lá esteve e, num dos lados, uma figura feminina junto a uma garrafa recorda os tempos boémios desta zona da cidade, durante o final do século XX. Uma desculpa para fazer como as crianças e carregar em todos os botões ao mesmo tempo.
“A nossa fachada está pejada de animais”, observa Marta. Assim, lançaram o seguinte desafio a Bordalo II: “Olhas para os animais que aqui estão e escolhes um para recriares”. Do outro lado ouviram imediatamente “Peixe não quero”. O besouro criado a partir de peças que estavam no edifício é a primeira coisa que se vê à entrada, atrás da recepção. A poucos metros, na parede junto ao bar, está ainda uma libelinha. Pelo hotel há ainda outras obras de arte, como o Homem Aranha suspenso de David Oliveira, nas escadas.
Os 36 quartos partilham a mesma decoração minimalista. A maior preocupação é evidentemente o conforto. O último andar, das águas-furtadas, é uma espécie de apartamento. Oferece uma área privada para grupos grandes, com uma sala de estar comum, mas os três quartos também podem ser utilizados individualmente. Na cúpula do edifício está a master suite The King of Dome. É um duplex, que, no cimo de umas escadas em caracol, esconde uma segunda pequena divisão, com um sofá-cama de casal e um gira-discos. Existe também aqui uma janela redonda, mas, como não foi possível instalar o mesmo sistema de portadas, encontraram uma solução com uma almofada à medida.